"No mais tardar entre segunda ou terça feira". Essa é a promessa do diretor geral do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), Antônio Carlos Hummel, para que seja lançado o novo edital de concessão de áreas na Floresta Nacional (Flona) Saracá-Taquera, no Pará. A primeira versão foi impugnada após ação movida pela União das Entidades Florestais do Estado do Pará (Uniflor).
A Uniflor se colocou contra o edital da forma como ele foi apresentado pelo SFB porque não concordava com os preços previstos para os produtos madeireiros produzidos em Saracá-Taquera. "Eles não estavam de acordo com a realidade financeira da região. Havia uma discrepância muito grande com relação aos editais das concessões no Acre, para de Saracá-Taquera. A questão de preços estava muito dispersa. Para as empresas sérias, que querem investir em concessão, com os preços praticados nesse edital seria impossível de participar", disse Alexandre de melo Araujo, secretário executivo da entidade de classe representante do setor madeireiro.
Hummel tentou minimizar a questão: "Não houve problema. Em todo edital as pessoas interessadas tem direito de solicitar esclarecimentos sobre determinados itens ou mesmo sua impugnação. E isso foi feito. Estamos avaliando e daremos uma resposta em curto prazo da semana que vem. Estamos fazendo uma avaliação técnica das justificativas deles para daí dizermos se é correta ou não".
Na primeira concessão florestal da história do país, na Flona Jamari (RO), a maçaranduba possuía valor mínimo de R$ 30 pelo metro cúbico, enquanto para Saracá-Taquera, o menor preço da mesma espécie é de R$ 120. De acordo com o Serviço Florestal Brasileiro, os preços fixados em edital são pesquisados na própria região e que não é possível prever nivelamento de preços para concessões em pontos diferentes do país.
A concessão das florestas paraenses prevê a destinação de 140 mil hectares da floresta. Essa área será dividida em três, com tamanhos diferentes - Manejo - 91,6 mil, 30 mil e 18,7 hectares -, na qual serão permitidas atividades de exploração de produtos florestais, mineração e turismo, para uso sustentável por até 40 anos. A concessão é amparada pela Lei de Gestão de Florestas Públicas, para promover o uso sustentável dos recursos florestais.
A estimativa é que a concessão florestal da Flona Saracá-Taquera deverá render cerca de R$ 7 milhões ao ano, além de criar cerca de 2.500 empregos diretos e indiretos. Desse valor, até R$ 2,1 milhões serão destinados ao SFB; outros R$ 2 milhões irão para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio); R$ 1 milhão para o estado do Pará e R$ 341 mil para os municípios de Oriximiná, Faro e Terra Santa, que possuem áreas dentro da Flona. Mais duas áreas serão destinadas para o manejo florestal, sendo que uma será na área de influência da BR-163.
Privatização?
O diretor do Serviço Florestal nega que a política de concessão de florestas seja um modelo de privatização das matas amazônicas. "Com certeza não. Não pode usar a palavra privatização. A terra é publica. O processo é justamente o inverso. Não há alienação de florestas nem nada disso". Também discorda da ideia de que esse tipo de processo é uma forma do governo se isentar de uma responsabilidade que seria sua, no caso, a gestão correta e dentro da legalidade das florestas, ao transferi-la para investidores privados. Em sua visão o governo "se utiliza de outros procedimentos gerenciais para tomar conta daquela área".
Alexandre acredita que a concessão de florestas públicas é o melhor caminho para se chegar a uma produção sustentável na Amazônia: "Desde que feito com transparência, que o edital seja discutido com o setor florestal madeireiro antes de sua publicação, para que possamos por nossas observações com relação a preço, questões de responsabilidade social, justamente para que possamos trazer para as concessões empresas legais e comprometidas com o desenvolvimento sustentável da região".
Histórico
A Floresta Nacional (Flona) Saracá-Taquera surgiu por meio do Decreto nº 98.704, de 27 de dezembro de 1989. Trata-se uma unidade de uso sustentável que prevê o desenvolvimento de projetos e pesquisas com uso sustentável dos recursos da floresta. De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a biomassa presente na região é das mais altas já encontradas, além de possuir altos índices de diversidade de fauna e flora.
A unidade é adjacente à Reserva Biológica (Rebio) do Rio Trombetas, e, juntas compõem as Unidades de Conservação (UCs) federais do Rio Trombetas, sendo responsáveis pela proteção/preservação de cerca de 800.000 ha do Bioma amazônico. Desde o ano de 2002 a gestão destas unidades foi unificada.
Há na Flona constante produção de bauxita, realizada pela Mineração Rio do Norte S.A. (MRN), que explora o minério desde 1976, portanto, anterior à criação da UC. Conforme consta no decreto de criação e plano de manejo da unidade, as atividades da MRN não sofreram descontinuidade, sendo respeitados os tramites regulares de licenciamento realizados pelo próprio Ibama.
Uma forte característica da região é a presença de comunidades remanescentes de quilombos, que se distribuem ao longo do rio Trombetas e estão presentes tanto na Flona como na Rebio e seus entornos. Cerca de 150 mil hectares do local são destinados a Manejo Florestal Sustentável empresarial. O Plano de Manejo contempla ainda a utilização dos castanhais da Flona pelos quilombolas lá residentes.
Mais problemas
Em carta publicada no dia 18 de julho, a Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Município de Oriximiná (ARQMO) se posicionou contra a concessão de Saracá-Taquera por entender que a Flona foi criada em cima de terras tradicionalmente ocupadas por comunidades quilombolas.
"O processo para titulação dessas terras está aberto no Incra desde 2004, mas até hoje nem a primeira etapa de identificação do nosso território foi concluída. O plano de manejo da Flona não delimita quais são as terras ocupadas pelas 12 comunidades quilombolas que lá existem. Não é possível abrir a concessão da Flona sem que antes sejam delimitadas as nossas terras de forma a garantir que elas não estejam incluídas na área aberta para concessão", diz o comunicado da entidade.
Os quilombolas alegaram ainda que não foi realizado um estudo para avaliar qual será o impacto da exploração da Flona para as comunidades quilombolas que lá moram e que não foram oficialmente informados e consultados sobre a concessão florestal. Isso iria de encontro à Convenção 169 da OIT garante o direito à consulta prévia sempre que se pretenda tomar medidas administrativas capazes de afetar os quilombolas, com o objetivo de se chegar a um acordo ou consentimento.
Hummel conta que todos esses problemas já foram resolvidos: "Houve várias reuniões, envolvendo o Ministério Público e o Incra e chegou-se a um acordo no qual foram retiradas todas as áreas demandadas por eles [quilombolas] naquela região.Certamente as reivindicações deles foram atendidas".
(Por Filippo Cecilio, Amazonia.org.br, 05/08/2009)