O governo admitiu que ainda existem "divergências" nas novas regras para a exploração e produção de petróleo na camada pré-sal, mas definiu a Petrobras como única operadora dos futuros blocos licitados e dona de uma participação acionária mínima em todos eles. A informação foi dada pelo ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, depois de três horas de reunião em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu três anteprojetos de lei com o novo marco regulatório, mais de um ano depois de iniciadas as discussões técnicas. "Houve muitas divergências, ele (Lula) levantou muitas questões", relatou Lobão.
Lula pretende agora ouvir lideranças empresariais, trabalhistas e políticas antes de encaminhar as propostas de novas regras ao Congresso. O ministro ponderou que elas poderão sofrer ajustes e ainda não são projetos fechados. O primeiro texto muda a Lei do Petróleo, de 1997, e estabelece o sistema de partilha para os novos campos do pré-sal. O segundo cria a Nova Empresa de Petróleo (NEP), como tem sido provisoriamente chamada a estatal que administrará as reservas petrolíferas. O terceiro institui um fundo social, com os recursos da comercialização do óleo, que terá "papel de fundo soberano" e investirá "no Brasil e no exterior".
"Não são projetos acabados", afirmou Lobão, em rápida entrevista depois da reunião, que teve a presença de outros três ministros, do presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, e de todos os assessores que trabalharam diretamente no assunto ao longo dos últimos meses. Lobão negou a informação, veiculada nesta quarta (05/08), de que a União pretende ficar com 80% do petróleo explorado no pré-sal.
O fatiamento do novo marco regulatório em três projetos permitirá que as regras avancem em ritmos diferentes no Congresso. A oposição, que defende o atual regime de concessões, introduzido no governo Fernando Henrique Cardoso, tende a dificultar a tramitação da proposta do sistema de partilha, mas resiste menos à nova estatal.
Antes tida como uma perdedora das discussões do pré-sal, a Petrobras sai fortalecida com as novas regras. O temor inicial do governo era afastar o investimento privado e que a empresa ganhasse dimensões gigantescas com o desenvolvimento do pré-sal, assumindo uma condição de espécie de "Estado paralelo", como a venezuelana PDVSA ou a russa Gazprom. Há menos de um mês, depois de apresentado o primeiro rascunho do marco regulatório ao presidente, Lula foi convencido a mudar radicalmente o rumo das discussões e reforçar o papel da empresa. O principal artífice do movimento foi o diretor de exploração e produção da Petrobras, Guilherme Estrela.
Despertando curiosidade por reconhecer "divergências" no governo, o ministro deu apenas algumas pistas, mas fugiu dos detalhes. Ele comentou que ainda não há definição, por exemplo, sobre a necessidade de especificar, no projeto instituindo o fundo, os destinos dos investimentos em áreas sociais. "Foi uma parte que demandou muita discussão e ainda não se deliberou sobre isso", afirmou.
A nova estatal "será uma empresa pública, com características de empresa privada, regida pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas)", segundo o ministro. Mas não houve definição sobre a capitalização da Petrobras, com aumento da participação acionária da União, hoje em 32% do capital total.
A ideia em gestação é que, sem recursos do Tesouro, esse aumento da participação seja feito em troca da cessão de áreas vizinhas aos blocos do pré-sal que a Petrobras já explora, no regime de concessão. Também não houve decisão sobre um ponto polêmico e de interesse direto dos governadores: se os recursos provenientes do pré-sal serão divididos, em parte, com Estados e municípios produtores ou com alguma atividade relacionada à exploração. "Esses são detalhes que foram discutidos e não foram deliberados", disse Lobão, sem entrar em detalhes.
A intenção do governo era que toda a arrecadação ficasse com a União, diferentemente do sistema atual, em que royalties e participações especiais são compartilhados com Estados e municípios. Mas o lobby político, principalmente do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), ainda pode mudar o plano original.
Entre os detalhes discutidos na reunião de ontem, mas sobre os quais o ministro não fez nenhum anúncio, estão a participação acionária da nova estatal nos futuros blocos do pré-sal e a forma como a Petrobras será dispensada de licitação para, além de operar, ser majoritária no controle dos novos blocos.
(Por Daniel Rittner e Danilo Fariello, Valor Econômico, 06/08/2009)