Um grupo de empresas brasileiras pretende influenciar a posição do governo brasileiro nas negociações sobre mudanças climáticas, em especial na conferência de Copenhague, em dezembro. Elas querem que o Brasil assuma metas para a redução de emissão de gases de efeito estufa. O grupo, formalizado nesta quarta (29/07) em encontro na capital paulista, estudará propostas a serem levadas pelo país à conferência, assim como contribuições das próprias empresas para a redução das emissões. Um documento será entregue em setembro à Presidência da República com o resultado das discussões.
O grupo é formado pelas companhias Suzano Papel e Celulose, Light, Rhodia, Shell, Arcelor Mittal, Klabin, Ambev, AES e Brenco , e pelas entidades União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa) e Conselho Superior do Agronegócio (Cosag-Fiesp).
As empresas querem desconstruir o argumento de que assumir compromissos internacionais com metas é prejudicial à economia do país. O grupo aguarda mais adesões, segundo Walfredo Schindler, diretor da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS), coordenadora do projeto. "Estamos atentos ao tempo para não corrermos o risco de encontrar o governo com as suas posições já firmadas", diz ele.
As empresas consideram que o Brasil tem mantido posição conservadora nas negociações sobre mudanças climáticas. Segundo Eduardo Viola, professor da Universidade de Brasília (UNB), o mundo passou por grande transformação ao colocar o clima como tema central e o Brasil não pode ficar preso à cobrança das responsabilidades históricas dos países ricos. "Hoje, a União Europeia lidera o debate, propondo reduzir 20% das emissões até 2020. Os EUA mudaram sua posição e indicam a possibilidade de reduzir em 3% as emissões no mesmo período. A China apresenta um plano consistente de transição para um modelo mais limpo. O Brasil precisa assumir suas responsabilidades", diz o professor, responsável pelo estudo sobre as estratégias do Brasil nas negociações internacionais.
O engenheiro Roberto Schaeffer, da Coppe/UFRJ, que elabora o estudo sobre o uso da energia, diz que a indústria brasileira tem grande potencial para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, mas que são necessários incentivos públicos para viabilizar as mudanças. "É possível reduzir em 40% as emissões da indústria até 2030, mas a maior parte das ações dá menos retorno que investimentos nas atividades-fim das empresas." Ele defende que é preciso estreitar a distância entre o retorno dos investimentos para tornar a busca de eficiência energética e a substituição de combustíveis, por exemplo, mais atrativas.
"Ninguém sabe ainda os custos de assumir compromissos de redução de emissões, mas é preciso achar um equilíbrio entre esse custo e a atividade das empresas. Dizer hoje que não vamos nos comprometer com as mudanças climáticas é irreal", diz Britaldo Soares, presidente do grupo AES. "O assunto deixou de ser apenas de ONGs e cientistas para ser tratado por países e empresas. Precisamos assumir metas obrigatórias, pois a responsabilidade também é nossa", diz Marcos Sawaya Jank, presidente da Unica.
O presidente da Suzano, Antônio Maciel Neto, também chamou atenção para a necessidade de envolvimento do empresariado. "É muito importante que o setor empresarial aprofunde essa discussão e tenha proposições objetivas para abraçar." Ele defende mais incentivos às florestas plantadas, atividade realizada pela papeleira.
Diferente da realidade mundial, em que 80% das emissões de gases de efeito estufa são resultantes da geração e do uso de energia, no Brasil o maior responsável pelas emissões é o desmatamento (60%), seguido pela pecuária, com 25%, e por último a energia, com 15%. Dessa forma, a preservação das florestas brasileiras é um dos principais focos do grupo.
Segundo Paulo Moutinho, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e responsável pelo estudo sobre os desafios para a redução do desmatamento da Amazônia, é preciso uma visão integrada. "O desmatamento está ligado ao uso da terra, ou seja, às demais atividades, agropecuária e industrial", diz. Para o pesquisador, o Brasil tem um papel fundamental na defesa da preservação florestal e é preciso pensar incentivos que valorizem a mata conservada. "Manter florestas também tem de significar ganho, vantagem competitiva. É preciso reconhecer os esforços de quem preserva com o pagamento de compensações", diz. Segundo Moutinho, só a fiscalização e uma boa legislação não são suficientes para barrar o desmatamento. "Fiscalizar tem os seus limites e a legislação pode ser alterada."
A pecuária também tem uma contribuição importante para dar, segundo o professor da Esalq-USP, Carlos Cerri. Segundo ele, é preciso aumentar o número de gado criado por hectare para conseguir atender à necessidade de aumento da produção sem expansão da área utilizada. "O foco tem de ser o aumento da produtividade. Hoje criamos menos de um animal por hectare e para melhorar essa relação é preciso investir em fertilização da pastagem e em criação por confinamento", diz.
(Por Samantha Maia, Valor Econômico, 30/07/2009)