A origem do petróleo e do gás natural está em organismos vivos que morreram, foram comprimidos e aquecidos sob pesadas camadas de sedimentos na crosta terrestre. A ciência tem especulado durante anos se alguns desses hidrocarbonetos também poderiam ter sido criados, sem a presença de matéria orgânica, em camadas mais profundas do planeta.
Um novo estudo internacional revelou, pela primeira vez, que o gás etano (C2H6) e outros hidrocarbonetos mais pesados podem ter sido sintetizados nas condições de temperatura e pressão do manto superior – a camada localizada entre a crosta e manto que envolve o núcleo da Terra. A pesquisa, realizada por cientistas do Laboratório Geofísico do Instituto Carnegie, nos Estados Unidos, com participação de cientistas da Rússia e da Suécia, foi publicada neste domingo (26/07) na edição on-line da revista Nature Geoscience.
Enquanto o metano (CH4) é o principal componente do gás natural, o etano é usado como matéria-prima petroquímica. Ambos são considerados hidrocarbonetos saturados, por possuírem apenas ligações simples entre os átomos de carbono e serem saturados com hidrogênio.
Utilizando uma câmara de bigorna de diamante (DAC, na sigla em inglês) e uma fonte de calor a laser, os cientistas submeteram o metano a pressões superiores a 20 mil vezes a pressão atmosférica natural ao nível do mar, com temperaturas variando de 700 C° a mais de 1.200 C°. Em tais condições, que reproduzem aquelas encontradas no interior da Terra entre 65 e 150 quilômetros de profundidade, o metano reagiu, formando etano, propano, butano, hidrogênio molecular e grafite. Os cientistas, em seguida, submeteram o etano às mesmas condições e o resultado foi a formação de metano.
De acordo com os cientistas, as transformações obtidas sugerem que hidrocarbonetos pesados poderiam existir em camadas profundas da Terra. A reversibilidade implica que a síntese de hidrocarbonetos saturados é termodinamicamente controlada e não requer matéria orgânica.
"Ficamos intrigados por experiências anteriores e previsões teóricas", disse um dos autores do estudo, Alexander Goncharov, do Instituto Carnegie. "Experimentos feitos há alguns anos submeteram o metano a altas pressões e temperaturas, revelando a formação de hidrocarbonetos mais pesados. No entanto, as moléculas não puderam ser identificadas. Nós superamos esse problema melhorando nossa técnica de aquecimento a laser, que nos permitiu aquecer um volume maior de maneira mais uniforme. Com isso, descobrimos que o metano pode ser produzido a partir de etano”, declarou Goncharov.
De acordo com os autores, a hipótese de que os hidrocarbonetos gerados no manto migram para a crosta da Terra e contribuem com a formação de reservatórios de petróleo e gás foi levantada na Rússia e na Ucrânia há muitos anos.
“Será preciso investigar, a partir de agora, a síntese e estabilidade dos compostos estudados nessa pesquisa, assim como a de hidrocarbonetos mais pesados, em toda a gama de condições dentro do manto da Terra. Além disso, será preciso estabelecer em que medida esse ‘carbono reduzido’ sobrevive à migração para a crosta sem ser oxidado, por exemplo, formando CO2”, disse Goncharov.
O artigo de Alexander Goncharov e outros pode ser lido por assinantes da Nature Geoscience em www.nature.com/ngeo.
(Agência Fapesp, 27/07/2009)