Governo estuda vender ao mercado externo o que o país não consumir. Sérgio Rezende, ministro da Ciência e Tecnologia, diz que outra opção é usar produção extra para a formação de estoques estratégicos
O contrato assinado nesta quinta (23/07) na primeira parceria com a iniciativa privada para a exploração de urânio no país prevê a produção de excedentes "exportáveis" de combustível nuclear a partir de 2012. A usina de Itataia, no município de Santa Quitéria (CE), explorada numa associação das Indústrias Nucleares do Brasil (estatal federal) com o grupo privado Galvani, vai quadruplicar a atual produção de urânio já na primeira fase do empreendimento.
Considerando a conclusão de Angra 3 em 2014, o país passará a consumir na próxima década, considerando as três usinas, cerca de 600 toneladas por ano de concentrado de urânio. As futuras quatro usinas previstas no programa nuclear para os próximos 20 anos consumirão 150 toneladas cada uma, segundo previsão das INB. Com a exploração da jazida cearense, já a partir de 2012, a produção de urânio deverá chegar a 1.600 toneladas por ano. E, cinco anos depois, a expectativa é que a produção alcance 2.000 toneladas por ano. Atualmente, a produção anual brasileira é de 400 toneladas.
Apesar da previsão de excedentes daqui a três anos, o debate no governo sobre a exportação de urânio enriquecido ainda está em aberto. "Ainda não há decisão sobre se poderemos exportar ou não, mas haverá produção de excedentes", disse Alfredo Tranjan Filho, presidente da estatal responsável pela cadeia produtiva do urânio.
"É uma decisão que precisa ser tomada nos próximos três anos", disse o ministro Sérgio Rezende (Ciência e Tecnologia) sobre a possibilidade de exportação dos excedentes. Ele defende que a produção extra seja usada também para a formação de estoques estratégicos no Brasil. Segundo o ministro, o comitê de desenvolvimento do programa nuclear ainda não discutiu o que fazer com o urânio produzido em Santa Quitéria porque, quando se reuniu pela última vez, ainda era recente o anúncio do resultado da licitação ganha pelo grupo Galvani. O resultado foi contestado pelas empresas Vale e Bunge, que também disputaram o negócio.
O presidente da Aben (Associação Brasileira de Energia Nuclear), Guilherme Camargo, defende a exportação. "Não faz o menor sentido produzir pelo menos mil toneladas de excedentes de concentrado de urânio por ano para estocarmos. A saída óbvia é exportar. A conta é muito simples." Falta consenso também sobre a necessidade de mudanças legais para o país exportar combustível nuclear. Para Rezende, é necessária uma emenda à Constituição. O presidente da Aben diz que basta um decreto.
Na jazida de Itataia, o urânio está associado ao fosfato, matéria-prima na produção de fertilizantes agrícolas. O negócio permitirá reduzir as importações do produto, que representam metade do consumo nacional. O contrato tem prazo de 25 anos.
(Por Marta Salomon, Folha de S. Paulo, 24/07/2009)