A redução das emissões mundiais de CO2 não poupará as populações mais pobres das cidades do Sul de sofrer as consequências da mudança climática, prevê David Satterthwaite, sociólogo inglês e urbanista do Instituto Internacional para o Ambiente e o Desenvolvimento. O pesquisador acaba de publicar, pelo Banco Mundial, um estudo sobre os “Aspectos sociais da mudança climática nas zonas urbanas dos países pobres”.
A urbanização nas cidades pobres
Urbanização
As cidades dos países em desenvolvimento absorvem 70 milhões de novos habitantes por ano. A população urbana desses países deverá dobrar até 2050. Na metade do século, 5,3 bilhões de seres humanos viverão em cidades, 80% dos quais em países pobres.
Desenvolvimento
Um bilhão de seres humanos vivem em favelas insalubres. Eles poderão chegar a dois bilhões em 2030, segundo a ONU. A população urbana que vive em casebres é de 99% na Etiópia e no Chade, e de 92% no Nepal. No momento em que os debates entre países ricos e emergentes se intensificam, alguns meses antes da Cúpula de Copenhague, que deve dar, em dezembro, sequência ao Protocolo de Kyoto, Satterthwaite pede ajuda às cidades dos países pobres para se adaptarem aos efeitos da mudança climática.
O que não está bem na luta contra a mudança climática nas cidades dos países em desenvolvimento?
Os países ricos e as Agências Internacionais enfatizam a atenuação do aquecimento global pela redução das emissões de gás de efeito estufa. Mas isso na maioria das cidades dos países pobres é ao mesmo tempo injusto e ineficaz. Injusto, porque a população urbana mais exposta aos riscos climáticos pouco contribuiu para o aquecimento. Ineficaz, porque nessas cidades não há grande coisa a reduzir! Suas emissões de gás de efeito estufa já são baixas. Ao se querer limitá-las, corre-se o risco de frear o desenvolvimento desses países. A verdadeira urgência para os países pobres é o de se adaptarem aos efeitos da mudança climática, não de lutar contra as suas causas. Ora, algumas cidades desses países preferem fixar estratégias de redução das emissões de CO2 que lhe dão uma imagem internacional positiva e um tíquete de entrada no clube das cidades do Norte.
Em que consiste esta adaptação?
É preciso estudar quais populações vivem nas zonas de risco, o que falta em termos de infra-estruturas de proteção, quem não tem os meios para evitar ou limitar o impacto da mudança climática. As populações mais pobres se instalam em terrenos mais expostos, como as zonas inundáveis, ou nas encostas instáveis, porque são os únicos lugares ao seu alcance. E elas hesitam em deixá-los, mesmo que temporariamente, por medo de não poderem voltar, uma vez que são ocupações ilegais. Acrescenta-se a isso a precariedade das construções, a ausência de redes de água potável, de saneamento e de eletricidade, de coleta do lixo, tantos fatores de vulnerabilidade agravados pela mudança climática. As políticas de adaptação devem responder a tudo isso. Seu custo é enormemente subestimado: como adaptar as infra-estruturas que não existem!
A agenda climática e a do desenvolvimento seriam então as mesmas?
Sim. A adaptação à mudança climática ainda é vista pelas Agências Internacionais como um problema ambiental. Ora, o déficit de adaptação não é outra coisa senão um déficit de desenvolvimento. Se as políticas ligadas ao clima não estiverem ativamente voltadas para os mais pobres, elas terão graves consequências sociais. Há inúmeros exemplos de projetos ambientais que só servem aos interesses dos mais ricos ou que compreendem medidas “anti-pobres”. Vemos assim favelas erradicadas e comunidades vulneráveis pura e simplesmente expulsas sob o pretexto de que ocupam terrenos de risco. Na realidade, são ações movidas por razões políticas. Em Bombaim (Índia) ou em Mombaça (Quênia), por exemplo, muitas zonas onde estão instalados os pobres são certamente inundáveis, mas também são muito cobiçadas por luxuosas operações imobiliárias ou turísticas.
Quem tem os meios para implantar essas políticas?
Não é apenas um problema de falta de dinheiro. Nos países em desenvolvimento, as administrações não estão capacitadas para administrar esses riscos. Ora, o desenvolvimento dessas competências levará muito tempo. Por outro lado, pouquíssimos desses governos se apóiam sobre as populações mais vulneráveis, os atores locais. É o que, portanto, anda melhor.
Na Índia, Tailândia, Maláui, Quênia, Filipinas e em outros países, associações de moradores de favelas ou de sem-teto, na maioria das vezes animadas por mulheres, financiam e produzem os equipamentos, os serviços urbanos e as moradias com uma eficácia e um retorno sobre investimentos bem melhores do que aqueles obtidos pelos governos ou pelas ONGs. Sua ação direciona o desenvolvimento num sentido que responde aos desafios da mudança climática. As Organizações Internacionais devem aprender a trabalhar com essas associações, normalmente excluídas de todas as negociações.
(Por Grégoire Allix, com tradução do Cepat, Le Monde / IHUnisinos / Envolverde, 21/07/2009)