A epidemia de gripe A constitui, sem dúvidas, um fator de alarme social que põe em movimento um amplo leque de situações. De diferentes enfoques sanitários até incerteza nas medidas destinadas a mitigar sua expansão e proteger a vida das pessoas afetadas, mas fundamentalmente o que define o curso dos acontecimentos é principal e prioritariamente o papel do Estado em sua condição de garantidor do direito à saúde dos habitantes.
A perspectiva quase exclusivamente midiática da comunicação conflui com o interesse coletivo da comunidade por se informar com veracidade e gerar reflexões e atitudes que contribuam com a construção de uma racionalidade ativa e protagônica das e dos cidadãos em suas respectivas esferas de atuação.
Ao se propor a responsabilidade do Estado, é inevitável considerar os compromissos do Estado argentino com relação às obrigações internacionais contraídas em virtude dos tratados de Direitos Humanos. Particularmente, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, incorporado à Constituição Nacional, que estabelece em seu artigo 12, incisos b) A melhoria em todos os seus aspectos da higiene do trabalho e do meio ambiente; c) A prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, profissionais e de grande índole e a luta contra elas; d) A criação de condições que aproximem de todos a assistência médica e serviços médicos em caso de doença.
Precisamente, a estratégia sanitária frente à epidemia de gripe A está precisando não apenas de esforços de boa vontade e com explícito reconhecimento aos trabalhadores da saúde, mas também da urgente incorporação, em sua planificação, execução e avaliação, do enfoque de direitos humanos, sustentando consequentemente os princípios de universalidade, integralidade, interdependência e exigibilidade dos direitos juridicamente consagrados.
Quando se programa por fora do enfoque de direitos, correm-se altos riscos de gerar invisibilidades sociais, arbitrariedades assistenciais e preventivas e inclusive mecanismos variados de discriminação.
Das políticas públicas baseadas no enfoque de direitos, é inadmissível que se promovam medidas preventivas básicas que não sejam acompanhadas de garantias concretas de acesso aos recursos ou serviço de setores sociais de maior vulnerabilidade econômica. A pobreza ou exclusão social, em qualquer de suas modalidades, não pode representar um agravante diante da epidemia, e corresponde ao Estado e à política oferecer as garantias individuais familiares e comunitárias para o exercício pleno de seu direito à saúde.
Dessa mesma perspectiva, não se pode aceitar que as responsabilidades dos Estados se diluam em iniciativas fragmentadas, contraditórias e inclusive em modalidades de transferência de responsabilidades ao plano quase exclusivamente individual ou com informações ou medidas suscetíveis de sofrer interferências de diversos tipos e natureza.
Afirmamos a necessidade de incluir na estratégia nacional frente à epidemia uma programação baseada na promoção e proteção dos direitos humanos, assegurando a informação veraz e precisa, a participação das organizações sociais, religiosas, os âmbitos profissionais, acadêmicos e sindicais, como também a rigorosa prestação de contas de todas e cada uma das ações.
(Por Norberto Liwski*, Claudio Capuano** e Adolfo Pérez Esquivel***, com tradução de Moisés Sbardelotto, Página/12 / IHUnisinos, 14/07/2009)
* Presidente do Comitê para a Defesa da Saúde, Ética e Direitos Humanos
** Professor de Direitos Humanos da Faculdade de Medicina da Universidade de Buenos Aires,
*** Prêmio Nobel da Paz