A Assembleia Legislativa, por intermédio da Comissão de Turismo e Meio Ambiente, promoveu uma audiência pública para discutir a instalação de fosfateira em Anitápolis, município da Grande Florianópolis. O encontro foi realizado na tarde da última quinta-feira (16/07) no Auditório Antonieta de Barros. No encontro ficou decidida a criação de grupo de trabalho que articulará as próximas audiências, além da elaboração de um estudo técnico aprofundado sobre as consequências da instalação.
Também ficou definido o encaminhamento de duas moções ao governador solicitando estudos alternativos, como o uso de dejetos, e a estagnação das negociações para a implantação da empresa, já que foi oferecida isenção fiscal. As audiências públicas para debater a questão continuarão sendo realizadas. A próxima ocorrerá em Braço do Norte, um dos municípios afetados.
A audiência pública foi solicitada por entidades, prefeituras e câmaras de vereadores dos municípios que compõem a Serra Geral, com o intuito de esclarecer a sociedade, especialmente porque a estimativa é de que a área total abrangida pelo projeto vai superar 400 hectares de Mata Atlântica preservada. Um agravante é que o terreno a ser explorado tem às margens 180 famílias. Pelo menos uma delas está a cerca de 500 metros da área a ser minerada.
Na opinião do presidente da comissão, deputado Décio Góes (PT), a população local, não tem a mínima noção do tamanho e da complexidade do empreendimento. “O projeto é complexo e impactante. A imprensa não dá a visibilidade necessária, por isso precisamos promover audiências, para trocarmos informações e tentar minimizar os impactos de sua instalação”, declarou.
Representantes da Indústria de Fosfatados Catarinense (IFC), criada em parceria entre as multinacionais Yara Brasil Fertilizantes e Bunge Fertilizantes, não compareceram à reunião. Sua participação era fundamental para explicar o que a indústria pretende realizar na região e esclarecer os pontos mais controversos do projeto. Além dos empregos temporários, a indústria deve gerar 423 postos de trabalho direto com o início da operação. Serão produzidas a cada ano 500 mil toneladas de superfosfato simples, matéria-prima para a produção de 1,7 milhão de toneladas de fertilizantes. As obras estão orçadas em cerca de R$ 400 milhões.
Décio disse que eles foram convidados no dia 7 de julho, mas seus consultores ambientais já tinham compromissos agendados para a data da audiência. A empresa pediu para o debate ser adiado. Entretanto, os moradores do entorno do município não aceitaram a solicitação.
O prefeito de Anitápolis, Saulo Weiss (PMDB), foi à Brasília para a Marcha dos Prefeitos, e também não participou da audiência na Assembleia. Conforme moradores do município, o prefeito é favorável à instalação. A deputada Angela Albino (PCdoB) questionou a sua ausência e mencionou a disposição para a apresentação de uma proposta conciliatória. ”Apenas um lado aparece nos debates. Alguém que defende a indústria tem que aparecer, pois priorizam o lucro em detrimento da saúde pública e do meio ambiente”, acusou.
Já o deputado Professor Sérgio Grando (PPS) ressaltou a necessidade da criação de mecanismos, junto ao Ministério Público estadual e à Universidade Federal de Santa Catarina, que sejam transparentes e de acesso fácil à população para que entendam o que está acontecendo.
Fatma
A Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma) concedeu uma Licença Ambiental Prévia (LAP) ao projeto, com duração de 24 meses, baseada em pareceres técnicos e jurídicos. Conforme o presidente da fundação, Murilo Flores, a instalação da IFC interessa aos governos do Estado e federal, já que mais de 50% do fosfato utilizado no país são importados. “A emissão da licença pela Fatma transcende esses interesses e só foi concedida porque estava dentro das regras”, observou.
Ele leu um resumo do estudo técnico produzido pela Fatma, que tem 3 mil páginas, e acrescentou que a licença ambiental definitiva só será concedida se a fosfateira atender diversas exigências, entre elas, a contratação de mão-de-obra local e a implantação de 30 programas ambientais para compensar os impactos . “A LAP só foi concedida perante inúmeras exigências. A legislação é clara, mas na prática pode haver divergências. Temos que analisar a relação custo benefício em cada caso”, salientou.
Desenvolvimento sustentável
Os agricultores da Serra Geral, entre eles os de Anitápolis, priorizam a produção de alimentos sem o uso de agrotóxicos e a instalação da fosfateira prejudicaria a atividade rural. “Estou do lado dos pequenos agricultores e das pessoas que sempre viveram na região e precisam da preservação do meio ambiente”, defendeu o deputado Sargento Amauri Soares (PDT).
A importância de empreendimentos que gerem novos empregos na região é inegável, acredita o deputado Renato Hinnig (PMDB). Entretanto, estes estabelecimentos deverão preservar o meio ambiente para garantir a continuidade das práticas ali desenvolvidas. “Os esforços feitos pelas entidades em prol da agricultura sem agrotóxicos devem continuar”, aconselhou.
O deputado Lício Mauro da Silveira (PP) explicou que o fosfato é um insumo básico da agricultura, mas o impacto ambiental da indústria será decisivo nas culturas da região. “Tem que provar que aquele investimento vem ao encontro da sociedade, levando em conta a preservação do meio ambiente”, ressaltou. Lício levou um documento encaminhado ao seu gabinete que dizia que o governador Luiz Henrique da Silveira (PMDB) ofereceu isenção fiscal para que a empresa se instalasse em Anitápolis. O documento ainda informa que o governador mantém contato com a empresa para que a instalação avance mais rápido. “O governador precisa se manifestar”, cobrou.
A falta de esclarecimento também foi citada pelo deputado Joares Ponticelli (PP). Ele defende que, enquanto não houver informações suficientes, o projeto não avance. “A empresa tem que se colocar diante da sociedade para dar garantias de que o empreendimento será bom e não danoso para a região.”
O presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Santa Catarina (Fetaesc), José Dresch, relatou que 180 mil famílias catarinenses ainda têm condições de viver bem da agricultura. ”A instalação da fábrica poderá desempregar um número bem maior de agricultores na região, que não serão absorvidos por ela. Temos que ressaltar que a nossa agricultura é diferenciada”, alertou.
Os pontos que preocupam os moradores da região foram explicados pelo prefeito de Rancho Queimado, Mério Cesar Goedert (PMDB), membro do Fórum de Desenvolvimento Sustentável dos Pequenos Municípios das Encostas da Serra Geral. De acordo com seu relato, a IFC pretende explorar, inicialmente, uma jazida de fosfato através do processo de mineração a céu aberto. O projeto prevê, por exemplo, a construção de um complexo industrial para a fabricação de ácido sulfúrico que será usado na extração de fosfato.
Outro motivo de preocupação são as barragens de rejeito – dois lagos cheios de lama, seguros por muralhas de terra com 56 metros de altura, para conter rejeito de mineração. A instalação dessas barragens ficará a mais ou menos 800 metros do nível do mar, o que aumenta o risco de rompimento e vazamento em consequência de uma forte chuva. “Todo o trabalho de 10 anos de planejamento dos pequenos municípios das encostas da Serra Geral para o desenvolvimento territorial sustentável estaria comprometido com este tipo de empreendimento. Minerar numa bacia hidrográfica é uma total irresponsabilidade, ainda mais nos dias de hoje, quando a qualidade e a quantidade de água são fontes de preocupação mundial”, frisou.
(Por Denise Arruda Bortolon, Ascom Alesc, 17/07/2009)