Ultimamente, tanta notícia ruim transborda do Congresso Nacional que quando aparece uma boa, ninguém presta a menor atenção. É o caso do relatório de autoria do deputado Fernando Ferro (PT-PE) sobre o projeto de lei 630, de 2003, que trata dos incentivos ao desenvolvimento de fontes de energias renováveis. Ele saiu na quarta-feira e, para o país, passou em brancas nuvens. Poucos o viram e menos gente ainda o leu, o que é uma pena porque ele tem vários pontos positivos para a implementação de um parque gerador com base em energias renováveis no país.
Ferro apresentou o relatório com um substitutivo que consolida outros 18 projetos de lei sobre o mesmo assunto que também tramitam na Câmara do Deputados. O texto traz pontos que não apenas incentivarão o desenvolvimento de energias renováveis, como também inéditos em relação à legislação vigente e ao Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas). Alguns saíram da proposta do deputado Edson Duarte (PV-BA), escrita com a colaboração do Greenpeace e que versa sobre a comercialização de energias renováveis, a conexão delas à rede e o estabelecimento de contratos de longo prazo entre os geradores e as distribuidoras de energia.
Também acabaram contemplados no texto final de Ferro os projetos do deputado Paulo Teixeira (PT-SP) – que propõe a criação de programas para a geração de energia renovável em sistemas isolados – e do deputado Guilherme Campos (DEM-SP) – que institui a renúncia fiscal para a importação de equipamentos para a geração a partir de fontes renováveis. Os principais pontos do relatório referem-se ao direito de distribuir energia gerada por turbinas de vento, biomassa ou placas solares à rede ou em comunidades isoladas. O texto garante aos geradores o direito de vender sua energia às concessionárias por meio de contratos de longo prazo, o que dá um mínimo de segurança aos investimentos em usinas de geração renovável.
O substitutivo de Ferro prevê a realização de leilões anuais de pelo menos 600 MW médios das fontes eólica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas. Estes leilões podem dar uma visão de longo prazo ao mercado, o que não é mau, mas para criar confiança entre os investidores, é necessário que seu preço de referência assegure a viabilização econômica de usinas geração renovável e que a quantidade de energia negociada tenha um volume capaz de estimular o mercado. A questão do acerto do preço pago pela energia e do montante negociado nos leilões são pontos importantíssimos para o sucesso da lei e que serão sugeridos pelo Greenpeace ao deputado na forma de emendas. O período para sugestões começa após o recesso parlamentar, no dia 3 de agosto.
A redução de impostos sobre equipamentos e lucros de empresas que operam com tecnologias renováveis é igualmente fundamental para a consolidação desse tipo de geração. Sem o incentivo do Estado, as fontes renováveis dificilmente conseguirão ganhar escala suficiente para virar um mercado independente. É assim que os investimentos em geração alternativa vêm sendo feitos nos Estados Unidos, Europa, China e Índia. O texto de Ferro propõe também a redução de 20% na tarifa de eletricidade de quem usa coletores solares para o aquecimento de água, encorajando a população a também fazer parte desse mercado de energias limpas.
Mas além disso, o incentivo ao uso de painéis solares em residência embute de quebra um estímulo à eficiência energética, porque dá a população mais uma razão, financeira, para abandonar o uso do chuveiro elétrico, de longe os maiores responsáveis pelo consumo residencial de eletricidade no país. Ferro também propõe a criação de um fundo para a pesquisa e desenvolvimento de energias renováveis. Fundos como este são importantes para a capacitação tecnológica e técnica do país, sem as quais seria impossível o desenvolvimento interno de pesquisas e equipamentos.
Na avaliação do Greenpeace, o texto de Ferro é um avanço em relação à atual legislação sobre energias renováveis, que tem reconhecidamente enorme potencial no Brasil. Sua proposta também restringe a participação de termelétricas fósseis nos leilões de energia. Pelo que quer Ferro, a energia gerada por essas usinas só poderá ser comercializada caso haja comprovadamente a ameaça de um apagão. O substitutivo apresentado pelo deputado pernambucano ainda pode melhorar, principalmente se, após o período de apresentação de emendas, nele forem incluídas cláusulas que garantam que o preço e o volume de energia renovável ofertados nos leilões de grande porte sejam suficientes para o desenvolvimento desse novo mercado de geração.
(Greenpeace, 16/07/2009)