O Brasil ganhou um alento da genética para tentar controlar a malária, doença que atinge mais de 450 mil pessoas todos os anos no país, principalmente, nos Estados da região Norte. Dados semifinais do genoma do mosquito Anopheles darlingi, transmissor do protozoário causador da doença no Brasil, foram divulgados nesta quarta (15/07), em Manaus, durante a 61ª Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para a Ciência).
"Em mais um mês, a primeira versão do genoma estará pronta", diz Ana Tereza Vasconcelos, coordenadora do projeto, executado pelo LNCC (Laboratório Nacional de Computação Científica), instituição sediada em Petrópolis (RJ). De acordo com a cientista, um exame preliminar dos dados das sequências genéticas do mosquito brasileiro da malária mostra caminhos interessantes de pesquisa.
Interruptor
"Uma das proteínas fundamentais para o sistema de transmissão da doença por parte dos mosquitos [e que os cientistas estão tentando desligar] existe também no darlingi". Depois de conhecer o rascunho das sequências genéticas de um dos mosquitos da malária, os cientistas vão precisar de ferramentas mais potentes para preencher algumas das páginas vazias que não conseguiram ser decifradas na leitura inicial dos genes. O trabalho adicional deve levar anos.
Chegar ao código genético do mosquito brasileiro da malária não teve nada de trivial. "Genoma de mosquito nunca mais", diz Vasconcelos, em tom de brincadeira. A dificuldade técnica consistiu em identificar as diversas inversões e formas que os genes do mosquito têm. "Um especialista chegou a me dizer que o genoma do Anopheles gambiae [o inseto que transmite a malária na África teve seu código genético decifrado em 2002] era o segundo pior, em termos de confusão para localizar os genes, que ele tinha visto", afirma. O primeiro era o dos afídeos (pulgões).
Segundo indicam os estudos do LNCC, o genoma do A. darlingi é igualmente confuso.
A comparação entre os dois genomas, por enquanto, mostra que eles têm mais de 70% de semelhança.
Buiuçuzinho
A busca pela amostra perfeita também deu trabalho. Os pesquisadores queriam mosquitos que transmitissem a malária mas que estivessem em uma área sem influência antrópica, o que sempre pode causar alteração nos genes. E eles acharam mais de 800 mosquitos "puros" em Santa Luzia do Buiuçuzinho, às margens do lago de Coari. A localidade do interior do Amazonas está a cerca de 480 quilômetros de barco de Manaus.
No caso do esforço brasileiro para tentar decifrar o genoma do A. darlingi, os cientistas do LNCC contaram com um reforço fundamental, em operação desde janeiro: um sequenciador de DNA de última geração, um dos dois únicos do país. O equipamento, que custou R$ 2,1 milhões, é um "fusca comparado a uma carroça", compara Vasconcelos.
(Por Eduardo Geraque, Folha de S. Paulo, 16/07/2009)