Aplicada aos sons emitidos pelos animais da floresta, a bioacústica – área multidisciplinar que combina biologia e acústica – tem se tornado uma ferramenta poderosa para a identificação de novas espécies de aves na Amazônia. Com base no novo paradigma de identificação dessas aves, pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) estimam que o número de espécies na região seja pelo menos o dobro do que se imaginava. De acordo com Mario Cohn-Haft, pesquisador da área de Coleções Zoológicas do instituto, depois de mais de dois séculos de coletas de aves e análises morfológicas para catalogação, espécies que se assemelham ou que são quase idênticas visualmente podem ser completamente distintas geneticamente.
“Hoje, existem cerca de 1,3 mil espécies de aves na bacia amazônica, estimativa feita com base em observações, coletas e catalogação, sendo 1,2 mil na Amazônia brasileira, o que representa dois terços da avifauna no país. Mas estudos aprofundados de espécies semelhantes com cantos diferentes mostram que uma mesma espécie, em média, pode dar origem a outras três, com base em análises dos cantos do animais confirmadas posteriormente em estudos moleculares”, disse.
Segundo Cohn-Haft, sem que seja necessário descobrir novas espécies, com base nas amostras existentes nas diferentes coleções biológicas do país, calcula-se que existam pelo menos 3 mil espécies de aves na Floresta Amazônica. “Essa pode ser a real biodiversidade da região”, afirmou o cientista que apresentou a conferência ‘Os sons da floresta’ nesta terça-feira, na 61ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Manaus.
“Isso significa que essas espécies devem ter sido coletadas e passaram despercebidas pelos pesquisadores. O som das aves é a ferramenta que mais nos alerta para a diversidade oculta das aves na Amazônia. Estudos realizados a partir das diferenças vocais dos animais e de análises moleculares indicam que uma espécie que anteriormente era considerada única pode se subdividir em até oito geneticamente distintas “, disse. “Por isso, cada vez mais estamos tendo confiança para, como uma primeira estimativa, usar a diferenciação do som das aves para estimar a população de uma determinada região. Isso com muito mais precisão do que quando contávamos apenas com as diferenças de aparência entre eles”, afirmou.
Além de explicar as características do espaço sonoro da floresta, que se divide em fatores como tipo e densidade da vegetação, período do dia e luminosidade, o que determina o ‘nicho acústico das aves’, Cohn-Haft lembrou das variações de custo entre diferenciar as espécies por meio do canto ou das análises genéticas.
“Na Amazônia estamos observando que, em geral, quando existem diferenças nas vozes das aves também há diferenças genéticas entre elas e isso está virando um padrão no meio científico. Sabemos que é muito mais barato utilizar os sons da floresta como referência para essa diferenciação, ainda que este seja um primeiro passo, do que sequenciar o DNA de cada espécie”, comparou.
Cohn-Haft, no final de sua apresentação, divulgou a coleção de CDs Vozes da Amazônia, que em seu primeiro volume, lançado em 2008, conta com cantos de 340 espécies de aves da Amazônia. Segundo ele, o resultado das vendas é revertido para estudos dos cantos e projetos de conservação das aves da Amazônia.
(ANDA, com informações do Correio do Brasil, 15/07/2009)