A CPI da Petrobras foi instalada nesta terça (14/07) com uma demonstração de força do governo, que, por 8 votos a 3, elegeu o senador João Pedro (PT-AM) presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, indicou como relator o seu líder no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) e ainda impediu que a oposição aproveitasse a ocasião para fazer discurso e acusações de irregularidades na estatal. A instalação foi possível graças a um acordo entre a oposição e o governo: o Palácio do Planalto cedeu ao deixar de obstruir a criação da CPI, o que fazia há quase dois meses, e a oposição, ao concordar em votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Sem a votação, o Congresso não pode sair de férias (recesso).
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu o sinal verde para a instalação a seus líderes no Senado, Ideli Salvatti (PT-SC) e Romero Jucá, na noite de véspera. Na mesma ocasião reafirmou apoiou à manutenção no cargo do presidente do Senado, José Sarney, alvo de uma série de acusações, inclusive de desvio de recursos de patrocínio da Petrobras destinados à fundação que leva seu nome.
Até a noite de segunda-feira, o governo trabalhava com a hipótese de instalar a CPI e deixar para agosto a eleição do presidente e a escolha do relator. Mas decidiu resolver tudo ontem para deixar PSDB e DEM sem discurso durante o recesso, quando escasseiam notícias políticas e a oposição aproveita para ocupar o noticiário.
Venceu, portanto, a tese do senador Romero Jucá. O líder da maior bancada (PMDB), Renan Calheiros, defendia que as escolhas ficassem para agosto. Governo e Petrobras não têm dúvidas de que o PMDB decidiu usar o peso de maior bancada do Senado - será o fiel da balança nas votações da CPI - para proteger o mandato do senador José Sarney, inclusive de investidas do próprio PT - nem toda a bancada petista concorda com a proteção que Lula deu ao ex-presidente da República. É amigo de Lula e aliado de Renan o senador que presidirá a CPI. Sua primeira medida não deixou dúvidas sobre como pretende conduzir a comissão: marcou o início dos trabalhos para o dia 6 de agosto e , em seguida, encerrou a sessão, sem dar margem de manobra para os discursos da oposição.
Dos onze titulares, apenas três são do PSDB e DEM. Com maioria na CPI, o governo vai controlar quem será convocado para prestar depoimentos e planeja barrar qualquer tentativa da oposição de chamar a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. "Só vai passar o que for decidido pela maioria", comentou ontem o senador João Pedro, pouco depois de sua nomeação. A CPI tem prazo de seis meses, prorrogáveis por mais seis meses. As investigações devem terminar somente em 2010 e o calendário da CPI deve coincidir com o início do ano eleitoral.
A princípio, a oposição fixará as investigações em contratos de patrocínio e convênios com ONGs e prefeituras, na diretoria de Comunicação da Petrobras, dirigida por Wilson Santarosa; nos supostos superfaturamentos na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e na atuação da Agência Nacional do Petróleo em Angra dos Reis. O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) apresentou 28 requerimentos, solicitando informações e pedindo depoimentos de diretores da Petrobras.
PSDB e DEM descartam a convocação do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), apesar de o pemedebista ser alvo de denúncias de mau uso de recursos da Petrobras pela Fundação Sarney, da qual é presidente vitalício. "Seria dar um tiro no pé começar a CPI politizando-a", comentou o líder do DEM, Agripino Maia (RN). A oposição deverá esperar alguns meses para tentar convocar a ministra Dilma Rousseff, presidente do Conselho Administrativo da Petrobras. "Vamos estudar primeiro as informações que estamos levantando sobre a estatal", disse o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).
O presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli, entretanto, está entre os primeiros da lista que a oposição quer convocar. O senador Antonio Carlos Magalhães Jr. já protocolou um requerimento pedindo a convocação de Gabrielli para explicar "artifícios contábeis" da estatal. Gabrielli ligou ontem para Jucá colocando a Petrobras à disposição da CPI - mas não é intenção do senador convocá-lo. Em carta a empregados da Petrobras, Gabrielli informa sobre o contato com o comando da CPI e delineia sua linha de defesa: "Como todos sabemos este é um momento delicado para a Companhia. Talvez, a sua maior crise. Mas a Petrobras é maior que a crise"
O governo, entretanto, planeja isolar ainda mais a oposição na comissão. A indicação de João Pedro foi definida em reunião de líderes governistas com o presidente Lula, para que o petista ajude a controlar as investigações. PMDB conta com o apoio do PT para barrar denúncias contra Sarney e a investigação do pemedebista pela CPI.
João Pedro mostrou-se fiel ao governo quando foi titular na CPI do Apagão Aéreo e apresentou relatório paralelo para impedir o indiciamento de ex-dirigentes da Infraero. A manobra, amparada pelo PMDB, derrubou o texto do relator da CPI, Demóstenes Torres (DEM-GO). O senador petista também revelou-se aliado de Renan Calheiros, quando o pemedebista presidia o Senado e foi alvo de denúncias. Ele foi o relator de representação contra o pemedebista, que o acusava de ter usado prestígio político para favorecer a cervejaria Schincariol na quitação de débitos junto ao governo, e recomendou o arquivamento do processo.
O presidente da CPI ocupa a cadeira no Senado como suplente do ministro Alfredo Nascimento (Transportes). Foi o presidente Lula que ajudou João Pedro a aliar-se a Nascimento. Lula e o senador petista se conhecem desde os anos 80. Vice-presidente da CPI, Marcelo Crivella (PRB-RJ), indicado pelo bloco liderado pelo PT, lutou, assim como João Pedro, pela absolvição de Renan na primeira acusação investigada no Senado, mas voltou-se contra o pemedebista na segunda. O recesso do Congresso é visto como um armistício para que governo e oposição reajustem suas estratégias a fim de evitar guerra de extermínio a partir do segundo semestre.
(Por Raymundo Costa e Cristiane Agostine, Valor Econômico, 15/07/2009)