Pelas ruas de Minaçu, a professora Lúcia Marques, 42, é conhecida como "a louca". Ela tenta, desde o ano passado, provar na Justiça que a morte do pai, ex-trabalhador da Sama, foi provocada pelo amianto e criar uma associação de apoio às vítimas do mineral. Casos como o de Lúcia são exceção na cidade, onde a maioria diz desconhecer quem tenha adoecido por causa do trabalho na mina. "Tudo o que se fala contra o amianto é mentira. Até hoje não se prova que houve sequer uma pessoa doente aqui. Isso é tudo fantasia", diz o prefeito Cícero Romão (PSDB). O risco à saúde dos trabalhadores -se inalado, o amianto pode provocar fibrose pulmonar e câncer- é o principal argumento de quem apoia a proibição do minério. A Sama afirma que depois de 1980 não houve nenhum caso de trabalhadores doentes na cidade. Nessa época, foram adotados equipamentos de segurança e instalados filtros nas usinas da mineradora, que acabaram com a "nuvem de amianto" que invadia as casas. Hoje, a empresa reitera que a manipulação do amianto é totalmente segura. Apesar das declarações da mineradora, não há dados oficiais sobre a saúde de quem trabalha com o amianto. Um grupo de 17 empresas do setor, entre elas a Sama, conseguiu uma liminar para não cumprir uma portaria que exigia que informações sobre os trabalhadores fossem enviadas ao Ministério da Saúde. O argumento é que a portaria inibe a atividade e "constitui privilégio à indústria de fibras alternativas", que não foi obrigada a fazer o mesmo.
Laudos divergentes
A Sama diz monitorar a saúde de cerca de 11 mil funcionários e ex-trabalhadores anualmente. Entre todos, ela reconhece aproximadamente cem doentes. O número é considerado subestimado pela Abrea (Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto) e por trabalhadores que discordam dos laudos da Sama. É o caso de Ilton Cascalho, 56, e sua mulher, Joana Cascalho, 50. Na década de 1970 eles trabalharam na Sama por 10 e 12 anos, respectivamente. Os dois têm nódulos no pulmão e questionam a avaliação da empresa, que não relaciona a alteração à exposição ao amianto, como um segundo médico diagnosticou. A Sama, por sua vez, contesta a aptidão do profissional para avaliar o caso. Para o sindicato dos mineradores, muitos ex-trabalhadores querem estar doentes para receber, por meio de acordo extrajudicial, o plano de saúde e a indenização que são pagos quando diagnosticadas doenças relacionadas ao amianto. O instrumento prevê indenizações entre R$ 11 mil e R$ 34 mil. Já existem 3.500 desses acordos, assinados antes do diagnóstico. A Sama não divulga quantas dessas pessoas estão de fato doentes.
(Por ACC e EHC, Folha de Sao Paulo, 12/07/2009)