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regularização fundiária grilagem de terra desmatamento da amazônia
2009-07-10

A procuradora-geral da República, Deborah Duprat, propôs ao Supremo Tribunal Federal (STF) ação direta de inconstitucionalidade (ADI), com pedido de liminar, contra artigos da Lei nº 11.952/2009, que resultou da conversão da Medida Provisória nº 458/2009. A norma dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas de União, no âmbito da Amazônia Legal. De acordo com a procuradora-geral, devem ser considerados inconstitucionais o artigo 4º, parágrafo 2; o artigo 13; e o artigo 15, parágrafos 1º, 4º e 5º.

Deborah Duprat explica que a regularização fundiária de terras federais na Amazônia visa a atingir dois objetivos: promover a inclusão social e a justiça agrária, dando amparo a posseiros de boa-fé, que retiram da terra o seu sustento; e aperfeiçoar o controle e a fiscalização do desmatamento na Amazônia, ao permitir uma melhor definição dos responsáveis pelas lesões ao meio ambiente nas áreas regularizadas.

Ela destaca, contudo, que em diversos pontos a Lei nº 11.952/09 se afastou desses objetivos. Para a procuradora-geral, a norma institui privilégios injustificáveis em favor de grileiros que, no passado, se apropriaram ilicitamente de vastas extensões de terra pública. Segundo ela, essas grilagens frequentemente envolveram emprego extremo de violência, uso de trabalho escravo e degradação, em grande escala, do meio ambiente.

“O legislador, em alguns pontos, deixou de proteger adequadamente este magnífico patrimônio nacional, que é a Floresta Amazônica brasileira (art. 225, § 4º, CF), bem como os direitos de minorias étnicas como os povos indígenas, os quilombolas e as populações tradicionais que habitam na região”, acrescenta Deborah Duprat.

Direito à terra
Para a procuradora-geral, o artigo 4º, parágrafo 2º, é inconstitucional porque viola o direito à terra dos quilombolas e das populações tradicionais. Na ação, Deborah Duprat explica que o dispositivo em questão, como foi aprovado, sugere que terras tradicionalmente ocupadas por comunidades quilombolas e tradicionais possam ser regularizadas em favor de terceiros, diferentemente do que ocorre com as terras indígenas. De acordo com a procuradora-geral, “tal interpretação afronta a Constituição, em especial o seu artigo 216, pelo qual está suficientemente claro que o exercício de direitos culturais não é uma prerrogativa de povos indígenas”.

Vistoria prévia
O artigo 13 da Lei nº 11.952/2009 também deve ser considerado inconstitucional por facultar a vistoria prévia nas áreas de até quatro módulos fiscais. De acordo com a procuradora-geral, a ausência de vistoria prévia é “extremamente problemática”. Segundo ela, “constitui um verdadeiro convite à fraude, ao permitir que títulos de propriedade ou concessões de direito real de uso sejam a pessoas que não ocupam diretamente as áreas reivindicadas de forma mansa e pacífica desde 2004, ou que nela não exerçam qualquer cultura”.

A procuradora-geral acrescenta que a falta de vistoria impedirá ao Poder Público de verificar se há no local conflitos fundiários, em especial envolvendo terras ocupadas por indígenas, quilombolas e populações tradicionais, com risco de que estes venham a perder suas terras tradicionais. Segundo ela, a medida adotada “expõe a grave e desnecessário risco uma série de bens jurídicos constitucionalmente tutelados, como o patrimônio público e os direitos de grupos étnicos e culturais.”

Proteção ao meio ambiente amazônico
Para a procuradora-geral, o artigo 15, parágrafo 1º deve ser interpretado conforme a Constituição. Segundo ela, “o legislador falhou gravemente no seu dever de proteção em relação ao meio ambiente, premiando aqueles que lesaram a Floresta Amazônica no passado, ao não lhes impor, como condição para fruição da benesse legal, sequer a recuperação da degradação a que deram causa. Falhou o legislador, também, ao deixar injustificadamente de sancionar outras hipóteses de desmatamento irregular, tal como se dá, a título meramente exemplificativo, com o desmatamento sem autorização competente, sem plano de manejo ou sem estudo de impacto ambiental”.

De acordo com Deborah Duprat, “o Supremo deve declarar que o aproveitamento racional e adequado, aludido no preceito em questão, envolve também o dever de não provocar qualquer tipo de desmatamento irregular na área regularizada, bem como o de também recuperar as lesões ambientais causadas pelo ocupante ou por seus antecessores antes da regularização fundiária”. Ela ainda explica que essas providências são imposições da Constituição, diante do dever do Estado de defender o meio ambiente, cujo descumprimento ensejaria a invalidade de todo o artigo 15 da Lei nº 11.952/09.

Violação da igualdade
A procuradora-geral ainda questiona os parágrafos 4º e 5º, do artigo 15 da lei em questão, por violação da igualdade e desvio de poder legislativo. Ela explica que os dispositivos determinam que para as áreas regularizadas de até quatro módulos fiscais, o prazo de inalienabilidade fixado pelo legislador é de dez anos, enquanto as áreas que tenham entre quatro e quinze módulos fiscais, o prazo é de três anos. Para Deborah Duprat não há qualquer justificativa legítima, calcada em interesse público para a diferenciação. “Pelo contrário, tem-se uma flagrante discriminação, que beneficia os que menos precisam, e ainda favorece a especulação imobiliária na Amazônia, às custas do patrimônio público”, destaca a procuradora-geral.

Medida cautelar
Na ação, a procuradora-geral pede a concessão de medida cautelar já que o perigo na demora (periculum in mora) decorre do caráter irreparável ou de difícil reparação dos efeitos que as normas questionadas tendem a gerar. Segundo ela, “as normas atingem o meio ambiente, e as lesões ambientais são, com grande frequência, de caráter irreparável. Diante do princípio geral da prevenção, e tendo em vista que está em jogo nada menos do que a integridade da Floresta Amazônica, a necessidade da medida cautelar se torna irrefutável”.

Leia aqui a íntegra da ação.

(Ascom Procuradoria Geral da República, 09/07/2009)


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