Este ensaio, embora não tão profundo como o Brasil, ou nada profundo, me foi inspirado por três pessoas importantes ao Geófagos, Ítalo, Manuel e Sibele. Foi a partir de seus comentários em alguns textos meus que fiquei "ruminando" estas coisas.
Nas minhas últimas andanças, ou peregrinações, tive a oportunidade de ver alguns lugares que eu ainda não conhecia desse Brasilão Imenso e rever outros por onde passei faz tempo. Mas a impressão é sempre a mesma: o Brasil é muito mal utilizado e muito mal administrado. Todo mundo sabe disso, né? Mas, enfim... Como o texto ficaria muito grande, resolvi fazer um comentário rápido contendo minha impressão sobre cada ambiente por onde passei (nada científico ou estatístico), são apenas impressões, que podem sim virar textos mais elaborados depois.
Na região do Médio Araguaia, nas redondezas de Conceição do Araguaia, no Pará, onde fui faz um tempo, o problema relacionava-se, previsivelmente, ao mal uso das pastagens, correndo o risco de se tornarem áreas degradas, à semelhança do Médio Rio Doce (deste falarei mais adiante). Lembro-me que certa vez um produtor rural, cliente da Emater MG no município onde eu trabalhava, discutia comigo estas questões da degradação das pastagens e das dificuldades que ele enfrentava. Num dado momento da conversa ele disse que sua solução era, talvez, ir embora para "o norte" (Tocantins, Pará, etc.), como muitos estavam fazendo. Foi quando eu disse a ele, em tom de seminarista para não ofendê-lo, que se muitos de nós fôssemos para o norte, mas não mudássemos nossos hábitos com o uso das terras, nós iríamos transferir os problemas de um lugar para o outro. Ele concordou comigo (e continuou meu amigo e cliente da Emater).
No Planalto Central, observei áreas de veredas com acesso direto do gado, bem como extensas plantações chegando à borda das áreas alagadas. O Código Florestal proíbe isso. Mas, infelizmente, no Brasil há uma distância muito grande entre o que prevê a legislação e o que se encontra na prática. Considero o agronegócio importante, pois precisamos usar, com racionalidade, os recursos naturais de que dispomos. E eis aí a Extensão Rural fazendo falta! Em cultivos extensivos, de milhares de hectares, deve-se prescindir de explorar estas áreas de reservas, que estão previstas em lei (embora não sejam fiscalizadas). Diferentemente da Zona da Mata Mineira, a seguir.
No Domínio dos Mares de Morros, principalmente na Zona da Mata Mineira, se a legislação e o código florestal forem aplicados à risca, nós vamos expulsar os pequenos e médios produtores de suas terras. Entre outros "problemas ambientais", suas áreas cultiváveis estão praticamente restritas aos terraços que em grande parte, naquela área e conforme a lei, deveriam estar preservados com a vegetação nativa que margeia as coleções de água. Portanto, na Zona da Mata a coisa é um pouco mais complicada. Nós não podemos simplesmente, pela letra fria da lei, tirar essa gente de suas terras (ou as terras dessa gente, o que é mais comum, infelizmente). É preciso conciliar a manutenção dessa população em suas propriedades, mas de forma digna, observando critérios sócio-econômicos, ambientais e critérios técnicos de manejo e conservação do solo e da água. O que é perfeitamente possível. Eis aí a Extensão Rural fazendo falta de novo!
No Médio Rio Doce, a pecuária extensiva, entre outras atividades, pelo uso constante do fogo como técnica de manejo de pastagens e outros métodos inadequados de uso e manejo do solo, promoveram os altos índices de degradação que encontramos por lá. Em geral são Argissolos Eutróficos muito degradados. Em determinados locais os índices de degradação, considerados alto e muito alto, ultrapassam 80% destas áreas. Estes dados são de minha dissertação de mestrado (disponível em pdf na página da Biblioteca da UFV).
O problema, embora possível de ser solucionado com tecnologias relativamente simples, é grave, e dada sua extensão, demanda um maior volume de recursos financeiros. Boas opções, neste caso, são a recuperação das pastagens nas áreas baixas e o cultivo de espécies florestais nas áreas mais declivosas. Aqui, mais que nos outros ambientes considerados, é preciso utilizar, de forma mais intensiva e em conjunto, as práticas mecânicas e vegetativas de controle da erosão hídrica e recuperação de áreas degradadas.
Na transição da Mata Atlântica para a Caatinga, entre Minas Gerais e Bahia, no Médio Jequitinhonha, encontra-se uma razoável diversificação de uso dos solos, com culturas anuais, culturas perenes e pastagens. Embora se trate de uma área aparentemente um pouco menos degradada do que o Médio Rio Doce (por menor precipitação e tipo de solo?), as práticas inadequadas de uso e manejo do solo são uma constante. Mas neste caso a adequação dessas práticas aos critérios técnicos e a recuperação de suas áreas degradadas, aparentemente, demandam menor tempo e menor volume de capital do que no Médio Rio Doce.
Na região da Caatinga, trata-se do óbvio, é preciso incentivar o uso de alternativas adaptadas às condições edafoclimáticas (solo e clima) da região. Para esta área, bem como para a Zona da Mata, Médio Rio Doce e Jequitinhonha (e outros específicos), imagino um programa para pequenos, médios e grandes produtores rurais, que contemple cursos de qualificação e requalificação profissional, em administração rural e atividades diversas. Com assistência técnica presente, recursos de crédito faciliatado e incentivos fiscais. Mas tal programa deve vislumbrar um momento em que os produtores não sejam mais altamente dependentes destes incentivos. É o paradigma do extensionista: o ótimo de desempenho de suas funções é o momento em que seus clientes não precisem mais dele.
Mas esta é apenas uma proposta de um (ex-) extensionista agropecuário. Passível de críticas e sugestões.
(Por Elton Valente, Geófagos, 03/07/2009)