Foi realizada na quinta-feira (25/06), na Assembléia Legislativa do RS, uma audiência pública para debater o Código Florestal Brasileiro, lei sancionada em 1965, e apontar possíveis mudanças e readaptações. A audiência contou com a participação do ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, que apresentou as propostas para o aperfeiçoamento da lei. O evento lotou o auditório Dante Barone, e foi necessária a exibição em telão no Plenarinho para que todos os presentes pudessem acompanhar a discussão.
Minc afirmou que o Brasil “precisa produzir mais e preservar mais”. Ele iniciou falando das conquistas do governo. Em 2009, as licenças ambientais aumentaram em 60%, enquanto o desmatamento da Amazônia diminuiu também em 60%. Foram implementadas ações como o corte do crédito de desmatadores, a parceria com ONGs ambientalistas, o aumento da oferta de madeira legalizada e o monitoramento do desmatamento da produção de soja em área de preservação.
O ministro considera que, atualmente, os problemas principais a serem resolvidos são relativos ao crescimento da pecuária. Minc cita a criação do Arco Verde, projeto que traz alternativas para o crescimento através de baixo impacto ambiental e para sustento das famílias – como, por exemplo, a substituição de atividades pecuárias pela piscicultura. As próximas metas do governo, segundo ele, são o investimento em fontes de energia renováveis e a recuperação de áreas degradadas pela exploração humana.
As propostas para o Código Florestal foram elaboradas pelo governo juntamente com entidades como a CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), a FETRAF (Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar) e o MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), esclareceu Minc. Abaixo, os principais pontos mencionados pelo ministro:
1- Ele afirmou que é essencial aliar a questão ecológica à agricultura – sobretudo a agricultura familiar. Defendeu que deve haver um tratamento diferenciado para proprietários de áreas de até quatro módulos e que utilizam mão-de-obra familiar, por exemplo.
2- Cita a legalização de culturas instaladas em encostas que possuem entre 25 e 45 graus de inclinação, especialmente a fruticultura. Em locais com mais de 45 graus, incentiva-se a manutenção de culturas de lenhosas perenes já existentes, pois ajudam a segurar a erosão e o assoreamento.
3- Pagamento aos pequenos agricultores que prestam serviços ambientais e possibilitam a ampliação das reservas. O ministro exemplifica com as ações que implementou quando era secretário do Meio Ambiente no estado do Rio de Janeiro, onde os agricultores que fizeram trabalho de reflorestamento das matas ciliares e APPs (Áreas de Preservação Permanentes) receberam cheques como recompensa.
4- Incentivar atividades que possibilitem rendimento, como a fruticultura, ao mesmo tempo em que as reservas são recuperadas.
5- Averbação 100% gratuita para o agricultor familiar, que pode receber auxílio do poder público e assistência técnica também gratuitos.
Entre os pontos considerados polêmicos pelo ministro, está a questão do prazo de três anos para o manejo nas reservas legais pelos agricultores familiares. Minc encerra, ovacionado pelo público, enfatizando a importância da educação e da conscientização ambiental no Brasil.
O assunto mais debatido pelos integrantes da mesa foi a questão da agricultura familiar. Entre os parlamentares, Edson Brum (PMDB), presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária e Cooperativismo defende que o agricultor é parceiro do meio ambiente, mesmo que visto como vilão, e cita o plantio direto na palha como exemplo da consciência do povo gaúcho. Também afirma que há uma melhoria da qualidade da água que vem da cidade para a região rural.
Na defesa dos pequenos produtores, adota a idéia de que esses agricultores não têm como arcar com a perda de produção e, consequentemente, de renda, que a área de reserva legal acarreta. Heitor Schuch, da Comissão de Economia, manifestou idéias parecidas: “Os agricultores são os maiores ambientalistas do estado e do país, pois, se terminar a terra, eles morrem também”. Sobre a questão do prejuízo econômico às famílias, justifica que a agricultura familiar cumpre o decreto porque não pode, e não porque não quer.
O presidente da FAMURGS (Federação dos Municípios do RS), Marcus Vinícius Vieira Almeida, defendeu a autonomia do estado e dos municípios para legislar sobre seus próprios ecossistemas e se mostrou favorável às áreas de reserva legal. Também salientou que os produtores devem ser considerados agentes de preservação e, por isso, aqueles que não prejudicam a natureza devem ser compensados, não podem ficar a mercê dos incentivos do governo.
O presidente da FECOAGRO, Rui Polidoro Pinto, também defendeu o debate regionalizado e a não penalização dos agricultores e cooperativas se tiverem de abrir mão de seus meios de produção. Elton Weber, presidente da FETAG (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul) afirmou que “a legislação deve ser rediscutida, pois não deve expulsar as pessoas do campo e fazer com que recebam cesta básica porque não podem produzir”.
Já o vice-presidente da FARSUL (Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul), Gedeão Silveira Pereira posicionou-se de forma contrária às reservas legais, apresentando o argumento de que elas varrerão cerca de 790 mil empregos em todo o país, pois o agronegócio representa um enorme faturamento para o Brasil. “É necessária uma maior discussão para, depois, não chorar a falta de alimentos na gôndola do supermercado”.
Houve polêmica durante a fala da ambientalista Conceição Carrion, presidente da APEDEMA (Assembléia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente). O tempo de sua fala já havia sido dividido com o tempo de Felipe Amaral, também da APEDEMA (dois minutos e meio para cada um). Com as constantes vaias de parte da platéia, reivindicou um aumento do tempo.
Ela começou defendendo que o Código Florestal permaneça sob a supervisão da legislação federal, uma vez que “é perigoso que esteja sob as vontades do governo do estado e das elites locais, que já permitiram grandes empreendimentos e licitações de barragens”, além de outras obras de grande impacto ambiental. Posiciona-se completamente a favor das reservas legais devido à sua importância para a manutenção da biodiversidade e o seu uso sustentável.
Carrion acrescenta que é necessário o cumprimento da legislação ambiental pelos agricultores, frente à ameaça de “transformarmos em monoculturas os ecossistemas do Brasil, que estão entre os mais diversificados do mundo”. Ela cita o caso da monocultura de eucalipto no sul do estado, que causa um processo de esgotamento dos recursos naturais e diz que é vendido um falso discurso de que a reserva legal causaria a perda de milhões de dólares para causar pânico nos produtores, pois o agronegócio e a exportação serão prejudicados, não a demanda de alimentos pela população. Ela termina sua fala com a frase “Mesmo com a última semente sobre a terra, vão querer transformá-la em moeda”.
Já o secretário de Meio Ambiente do RS, Berfran Rosado, falou pouco e disse menos ainda. De início, destacou a importância da produção rural no estado e a conseqüente geração de empregos e renda que a agricultura proporciona. No início de seu posicionamento, porém, ele foi interrompido pelo presidente da Assembléia, Ivar Pavan (PT). O deputado pediu a alguns presentes mais exaltados que respeitassem a fala do secretário e os demais espectadores, devido a uma faixa que ostentavam e que prejudicava a visão de boa parte do público. A faixa estampava os dizeres “Vende-se um bioma: Falar com Berfran”.
Sobre o Código Florestal, defendeu uma modificação que o tornasse “mais democrático”. Rosado explica que o Código precisa levar em conta as peculiaridades de cada região do país para ser válido e socialmente aceito. Foi um pouco mais longe em sua fala quando sugeriu a criação de uma nova Medida Provisória que discuta os impasses da lei, dê garantias aos produtores e possibilite o manejo da Reserva Legal além do Código Florestal – e que essa MP seja encaminhada para votação imediatamente.
O secretário também enfatizou que é fundamental o apoio aos pequenos produtores, além de destacar o pioneirismo no Rio Grande do Sul a respeito das discussões já promovidas a respeito da conservação dos recursos naturais. Ele lembra que os Códigos Ambiental e Florestal foram aprovados por unanimidade na Assembléia Legislativa do RS.
(Por Débora Gallas, Jornal JA, 29/06/2009)