Veto do presidente ao artigo 7º, adiantado pela Folha, descontentou os ruralistas, mas foi considerado insuficiente por ecologistas. Para ambientalista, país vai pagar ainda "preço alto" por manter pontos polêmicos; Federação da Agricultura de MT diz que presidente errou
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou nesta quinta (25/06) o artigo 7º da medida provisória 458 que trata da regularização fundiária da Amazônia, conforme revelou a Folha. O artigo permitia a transferência de terras para empresas e regularizava as propriedades que são exploradas por prepostos. O veto é uma vitória de ruralistas, mas com uma concessão aos ambientalistas, que a chamavam de "MP da Grilagem". Para o governo, é a MP da regularização fundiária da Amazônia. Ontem tanto de ambientalistas como de representantes do setor agrícola e pecuário criticaram a sanção parcial.
O artigo 7º não fazia parte da medida provisória enviada pelo governo. Foi colocado quando a medida foi discutida na Câmara. Também foi vetada uma parte do artigo 8º, mas por fazer referência à compra de terras por empresas e à exploração por prepostos. "Com a ampliação [feita pelo Congresso], não é possível prever os impactos para o desenvolvimento do processo de regularização fundiária, uma vez que não há dados que permitam aferir a quantidade e os limites das áreas ocupadas que se enquadram nessa situação", diz mensagem de Lula que será encaminhada ao Senado.
O objetivo da MP é regularizar 67,4 milhões de hectares de terras públicas ocupadas ilegalmente na Amazônia, área equivalente às áreas somadas da Alemanha e da Itália. Ela prevê a doação de terras com até cem hectares (que representam 55% da área), uma cobrança simbólica para as propriedades com até 400 hectares e a venda com valor de mercado daquelas que têm até 1.500 hectares para os proprietários que já estavam lá até 2004. Essas terras poderão ser pagas em 20 anos.
O governo resolveu doar ou vender por um valor simbólico terras públicas na Amazônia por entender que a regularização tornará mais fácil fiscalizar e punir eventuais desmatadores, e evitará grilagem e acirramento de conflitos agrários. A MP exige que os proprietários cumpram a legislação, preservando 80% de suas terras. Pouco antes de vetar parte da MP, Lula disse que, como o projeto é de autoria do governo, se sentia no direito de impedir modificações feitas pelo Congresso. O prazo para sanção do texto acabava ontem.
Para Adalberto Veríssimo, pesquisador sênior da ONG Imazon (Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia), a decisão de manter a maior parte dos pontos polêmicos foi um "erro" pelo qual o país "pagará um preço alto no futuro", com o aumento das ocupações irregulares e dos desmates na Amazônia. "Esta regularização vem sinalizar claramente que o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável não são prioridade, mas acessórios."
O presidente da Famato (Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso), Rui Prado, disse lamentar o veto à possibilidade de que pessoas jurídicas fossem beneficiadas. "O presidente vetou errado. Se existe a possibilidade de regularização, não faz diferença se quem tem a posse da áreas é pessoa física ou jurídica", disse. Segundo o governo, o projeto de regularização foi elaborado com base em dados que apontam que a maior parte das ocupações de áreas públicas na Amazônia se deu por pequenos e médios agricultores. Por isso, não haveria motivo para estender a doação ou venda de terras a empresas privadas.
Os donos das terras poderão revendê-las três anos após a concessão dos títulos, no caso de imóveis médios e grandes. Os pequenos poderão ser vendidos após dez anos. Houve pressão de ambientalistas e da ex-ministra Marina Silva para que o governo vetasse outras partes da MP, que reduzia o período permitindo a venda das terras depois da regularização. Marina disse que a MP representa um retrocesso na política ambiental, pois favorece a especulação fundiária.
Para o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, a medida "é boa no fundamental". Ele destacou que pessoas que desmatarem as terras recebidas perderão a propriedade. O texto volta ao Congresso, que pode derrubar as restrições de Lula, mas é necessária a maioria absoluta dos votos de deputados e senadores.
(Folha de S. Paulo, 26/06/2009)