Na quarta-feira (24/06), em audiência com o ministro da Justiça Tarso Genro, representantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) solicitaram um delegado especial para realizar as investigações em Ilhéus, além de um Procurador da Republicado designado para o caso. Cinco indígenas tupinambás denunciaram terem sido vítimas de tortura por parte de agentes da Polícia Federal de Ilhéus (BA).
No dia 2 de junho último, quatro homens e uma mulher dos Tupinambá (Ailza Silva Barbosa, 49 anos, Osmario de Oliveira Barbosa, 46 anos, Alzenar Oliveira da Silva, 23 anos, Carmerindo Batista da Silva, 50 anos e José Otavio de Freitas Filho, 30 anos ) foram presos por agentes da Polícia Federal (PF) de Ilhéus, sul da Bahia, e denunciaram terem sido vítima de tortura. Segundo relatos dos próprios indígenas, os policiais aplicaram choque elétrico nas costas e em órgãos genitais e usaram spray de pimenta. Nesta quarta-feira (24), em audiência com o ministro da Justiça Tarso Genro, representantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) solicitaram um delegado especial para realizar as investigações em Ilhéus, além de um Procurador da Republica designado para o caso.
Segundo Cláudio Luiz Beirão, advogado e assessor jurídico do Cimi, os Tupinambá estavam sendo forçados a confessar o assassinato de um homem, cujo corpo foi encontrado numa represa da Fazenda Santa Rosa, em Buerarema, município próximo de Ilhéus. Os índios só foram soltos à noite. A história remonta ao dia 25 de maio último, quando a tribo conquistou a retomada de parte de suas terras tradicionais invadida pela fazenda Santa Rosa. Na ocasião, os indígenas encontraram um corpo em estado decomposição e informaram a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a PF. Horas depois da denúncia, agentes da PF entraram na área e levaram 15 indígenas presos. Após depoimentos, todos foram liberados, exceto Jurandir de Jesus, irmão do cacique Rosivaldo (Babau). Depois de soltos, os índios procuraram a Funai e o MPF, prestaram depoimentos e fizeram exames de corpo de delito, que confirmaram as agressões.
Jurandir é acusado de peculato, por utilizar o carro de uma empresa que presta serviços para a Funasa para carregar alimentos. O Ministério Público Federal (MPF) e a Funai impetraram Habeas Corpus no Tribunal Regional Federal da 1ª Região contra o decreto de prisão preventiva, pois o simples fato de Jurandir levar alimentos aos seus companheiros não ofende a ordem pública, nem se caracteriza como fomento a um possível crime de esbulho. O objetivo da prática de tortura contra os cinco Tupinambá seria fazer com que eles confessassem a participação no homicídio que aconteceu na área.
Em outubro do ano passado, a comunidade da Serra do Padeiro foi atacada pela Policia Federal de Ilhéus, o que inclusive motivou uma campanha da Anistia Internacional. Em abril deste ano, a Funai publicou no Diário Oficial da União o Relatório de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença com o total de 47.376 hectares dentro dos municípios de Buerarema, Una e Ilhéus. A partir da delimitação, intensificaram-se as ações discriminatórias na região de Ilhéus, no sul da Bahia. “O povo Tupinambá vem sofrendo, inclusive, ameaça de vereadores num intenso processo discriminatório por parte da imprensa da região. O empresário e pecuarista Marcelo Mendonça, Presidente do Grupo da Ação Comunitária, em sessão especial na Câmara de Vereadores de Ilhéus declarou que seus pares se armariam para impedir a demarcação”, relata Beirão.
“Há uma campanha mentirosa por parte dessas pessoas, segundo a qual a demarcação da terra Tupinambá atingirá as sedes dos municípios onde ela se localiza. Nas ações, a Polícia Federal é acompanhada pelos fazendeiros das áreas retomadas. Na ação da PF em 2008, ninguém foi responsabilizado pelo excesso e pelas ilegalidades dos atos, criando um clima de impunidade em relação aos abusos de autoridade”, completa o advogado do Cimi. Além das investigações em Ilhéus, o caso agora é acompanhado pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara e do Senado. O Cimi divulgou a seguinte nota sobre o caso
Nota Pública sobre caso de tortura a indígenas tupinambá
Desde o dia 3 de junho o Cimi, a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), a FUNAI, o Ministério Público Federal, a Coordenação de combate à tortura da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República vêm acompanhando os desdobramentos dos fatos relacionados à agressão a 5 indígenas do Povos Tupinambá, ocorrida no dia 2 de junho.
Após tomar-se conhecimento dos graves fatos, os indígenas agredidos foram levados à Brasília, ocasião em que puderam esclarecer à Direção da FUNAI e à CNPI/MJ, bem como ao Ministério Público Federal o que efetivamente havia ocorrido.
Os 5 Tupinambá foram examinados, no dia 06 de junho, por peritos do Instituto Médico Legal de Brasília e ouvidos pela Procuradora da República Luciana Loureiro, que em seguida encaminhou a documentação para o Ministério Público Federal em Ilhéus adotar as providências legais cabíveis em vista da apuração e a responsabilização pelas agressões constatadas. O laudo decorrente desses exames comprova que os indígenas sofreram lesões graves ao serem atingidos com choques elétricos nas regiões lombar e genital.
No dia 19 de junho de 2009, a Folha de São Paulo noticiou o caso de tortura, praticado por agentes da Polícia Federal, nos cinco indígenas Tupinambá que tradicionalmente ocupam suas terras localizadas nos municípios de Buerarema, Una e Ilhéus, no sul do estado da Bahia.
Este não é um caso isolado. Em outubro de 2008, essa mesma comunidade Tupinambá foi violentamente atacada pela Polícia Federal, o que causou indignação na sociedade nacional e motivou, inclusive, uma campanha da Anistia Internacional. Infelizmente não há notícia de que qualquer agente da PF tenha sido responsabilizado pelos excessos e pelas ilegalidades dos atos cometidos naquela ocasião. Em decorrência disso, criou-se um clima de impunidade, o que resultou neste crime hediondo agora divulgado.
As ações discriminatórias e as ameaças aos indígenas recrudesceram, naquela região, a partir da publicação, no Diário Oficial da União (DOU), do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença, no dia 25 de maio.
As autoridades constituídas, especialmente o Ministro da Justiça precisa adotar todas as providências legais necessárias para que esse caso não seja mais um daqueles em que a impunidade se torna a marca mais visível e duradoura. O Cimi concorda e apóia as sugestões apresentadas pela Coordenação do Programa de Combate à Tortura da SEDH/PR, bem como as providências adotadas pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e pela Coordenação da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão dos Direitos e Interesses dos Povos Indígenas, ambos órgãos da Procuradoria Geral da República, no sentido de que seja designado um Delegado Especial para conduzir a apuração dos fatos delituosos.
É preciso um maior controle das ações da Polícia Federal e o Ministério da Justiça tem o dever e a obrigação legal de combater com rigor o avanço das agressões ao povo Tupinambá.
O Conselho Indígena Missionário (Cimi) mostra-se profundamente indignado e condena com veemência o fato ocorrido, manifesta solidariedade aos indígenas torturados e apoio à luta de todo o povo Tupinambá pela garantia do direito à sua terra tradicional.
(Por Clarissa Pont, Agencia Carta Maior, 25/06/2009)