A ação do Ministério Público Federal do Pará recomendando a clientes da Bertin que interrompessem a aquisição de produtos da empresa sob a ameaça de serem co-responsabilizados por supostos danos ambientais à Amazônia, atribuídos a ela, não só arranhou a imagem da companhia como fez com que perdesse uma receita estimada em R$ 46 milhões.
Além disso, num primeiro momento, vários clientes da Bertin suspenderam as compras de todas as unidades do grupo no país e não apenas do Pará. Isso ocorreu, argumenta a companhia, porque a recomendação enviada pelo MP do Pará aos clientes da Bertin e de outras sete empresas não limita a origem dos produtos a serem embargados. "Todos os produtos e subprodutos, de origem bovina, adquiridos das empresas supracitadas caracterizam-se como oriundos de ilícitos ambientais (...)", diz trecho do documento.
"Ficamos surpresos com a recomendação. Nossa imagem nunca foi tão arranhada em relação aos clientes", disse Fernando Bertin, diretor-presidente da Bertin S.A.. Umas das primeiras medidas da empresa foi paralisar o abate de bovinos nas quatro unidades que tem no Estado e cancelar a compra de 14 entre as 21 fazendas embargadas pelo Ministério Público Federal, na mesma ação, sob o argumento de desmatamento ilegal da floresta amazônica. Agora, o abate de bovinos foi parcialmente retomado nas unidades do Pará (Marabá, Redenção, Santana do Araguaia e Tucumã). Elas têm capacidade de abate de 3.500 cabeças por dia, e estão operando com 2.500 cabeças.
A Bertin também tentou acalmar seus clientes, nacionais e internacionais, com uma carta explicando sua política de sustentabilidade em relação à compra do gado bovino, "que prevê a verificação diária das áreas embargadas pelo Ibama" e afirmando que os animais abatidos no Pará não são oriundos de tais áreas. Um efeito da recomendação do MP foi o embargo de grandes varejistas às compras das empresas acusadas. Segundo Fernando Bertin, depois disso a empresa passou a atender as grandes varejistas a partir de outras unidades que tem no país e as do Pará ficaram de fora.
Bertin afirmou que 30 mil bovinos deixaram de ser abatidos nas unidades paraenses por conta da ação. Conforme cálculo de equivalente desossa da Scot Consultoria, sem abater esses animais, a empresa deixou de gerar uma receita de cerca de R$ 46 milhões. O cálculo é o seguinte: a arroba após a desossa que gera carne, couro e outros subprodutos estava na casa dos R$ 90 na primeira semana de junho no Pará, de acordo com a Scot. Como a Bertin deixou de abater 30 mil animais devido à ação, multiplica-se esse número por 17 arrobas, o peso médio de abate, e depois multiplica-se pelo valor da arroba.
Fernando Bertin tem confiança de que as perdas registradas agora por conta do episódio poderão ser recuperadas no resultado final da empresa este ano. "As vendas estão crescendo no mercado, lácteos vão bem [a Bertin controla a Vigor], a demanda está melhorando", disse. Para o empresário, a Bertin acabou na berlinda na ação porque fornece produtos para grandes indústrias mundiais, como Unilever, Kraft, Conagra (carnes) e Adidas (couro) e isso geraria grande repercussão, como de fato ocorreu.
Outro revés para a Bertin em meio ao imbróglio foi a suspensão da parceria com a IFC, braço financeiro do Banco Mundial. O diretor-presidente admitiu que havia restrições da IFC ao investimento da empresa no Pará, e disse que a crise mundial precipitou o fim da parceria. Parte do financiamento (US$ 60 milhões) saiu, mas uma parcela de US$ 30 milhões não chegou a ser liberada. Com isso, os planos de uma fábrica de produtos industrializados em Campo Grande (MS) e de um abatedouro na Bahia foram adiados.
(Por Alda do Amaral Rocha, Valor Econômico, 25/05/2009)