Os fatores de risco para o câncer ganham especial relevância no Brasil neste momento, em que a ministra Dilma Roussef e o vice-presidente José Alencar enfrentam esta doença que, em 2008 resultou em, pelo menos, 546.009 internações hospitalares custeadas pelo Sistema Único de Saúde. Além disso, entre 2002 e 2006, as neoplasias figuraram entre as cinco principais causas dos óbitos ocorridos no país, sendo a maior causa de morte das mulheres falecidas com idades entre 30 e 49 anos, e a segunda causa de óbito das pessoas com mais de 50 anos de idade. Naquele mesmo período, as maiores proporções dos óbitos por neoplasias foram registradas no RS, SC, PR, SP e DF.
No meio científico, tem sido crescente o número de estudos evidenciando que a contaminação ambiental por produtos químicos perigosos tem resultado no desencadeamento de doenças graves, como o câncer.
Substâncias artificiais quimicamente muito diferentes têm atividades carcinogênicas, incluindo agrotóxicos de uso ainda permitido no Brasil, como os inseticidas endossulfan e paration metílico, os herbicidas atrazina e linurom, e o fungicida vinclozolina. Além disso, produtos que fazem parte da composição de filtros solares, plásticos, cosméticos, detergentes e de outros materiais amplamente utilizados atualmente são cancerígenos e desregulam o sistema hormonal de mamíferos e de outros animais, tendo potencial para causarem malformações congênitas, infertilidade, feminização de machos, alterações no comportamento, diabetes, entre outros problemas. Destaca-se que as repercussões destas descobertas resultaram, em alguns locais, na implantação de restrições legais ao uso de materiais ainda amplamente empregados no mundo inteiro. Por exemplo, na cidade de Chicago e no estado americano de Minnesota, foi proibida a comercialização de mamadeiras plásticas feitas de policarbonato, que liberam nos alimentos infantis o bisfenol A, uma substância cancerígena que atua, também, como desregulador hormonal. No Brasil, por outro lado, a maioria das mamadeiras comercializadas atualmente contém este material.
Cientistas brasileiros também têm divulgado dados relevantes à saúde pública, obtidos em análises ambientais. Por exemplo, neste ano, pesquisadores do Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares da USP descreveram que substâncias cancerígenas e capazes de desregular o sistema hormonal das crianças estavam presentes em brinquedos importados da Ásia e que, em alguns daqueles brinquedos havia, inclusive, materiais radioativos.
No início deste ano, um estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Química da USP foi premiado pela União Internacional de Toxicologia, por ter evidenciado que o chumbo que contaminou o organismo dos adolescentes investigados era diretamente responsável pelo seu comportamento violento e antissocial.
Em 2006, pesquisadores da Unicamp divulgaram que, em análises realizadas com águas potáveis destinadas ao abastecimento público da região de Campinas (SP), foram encontradas substâncias com atividades hormonais e carcinogênicas em concentrações muito superiores àquelas necessárias ao desencadeamento de efeitos biológicos.
Na atmosfera de muitas cidades brasileiras também tem sido aferida a presença de substâncias tóxicas e cancerígenas acima dos limites legalmente permitidos, resultando em graves agravos à saúde da população exposta. Por exemplo, pesquisadores revelaram que, somente na cidade de São Paulo, morrem mais de 3.000 pessoas ao ano devido à exposição aos poluentes provenientes da queima incompleta de combustíveis veiculares. Em Piracicaba e Araraquara/SP, por outro lado, o adoecimento e morte de centenas de pessoas foram associados à poluição atmosférica causada pela queima da cana-de-açúcar, que antecede a colheita manual.
Diante das evidências apresentadas, espera-se que as autoridades brasileiras empreendam esforços para que os riscos ambientais para o câncer e outras doenças sejam conhecidos e minimizados. Certamente, tudo o que for investido na prevenção de tais doenças resultará em grandes benefícios para o país, tanto em termos materiais, quanto em outros imensuráveis parâmetros.
(Por Sônia Corina Hess*, O Eco, 22/06/2009)
* Engenheira Química e pós-doutora em Química, professora e pesquisadora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, assessora do Ministério Público do Trabalho e dos ministérios públicos Federal e Estadual de Mato Grosso do Sul em processos envolvendo questões ambientais com repercussões na saúde pública.