O translúcido rio Piraí, que margeia o pequeno município de Rio Claro, na serra carioca, segue caudaloso até chegar ao Sistema Guandu, a principal fonte de abastecimento de água da região metropolitana do Rio de Janeiro. Piraí contribui com quase 20% da água levada ao sistema e por isso o Comitê da Bacia do Guandu - uma figura criada pela Lei Nacional de Recursos Hídricos, formada por representantes de governo, sociedade civil e usuários - é contemplado com R$ 3 milhões por ano pela cobrança do uso de água.
Ao contrário de Extrema, onde o orçamento municipal paga o produtor de água, é deste comitê que sai o pagamento por serviços ambientais instituído em Rio Claro, em 2008. O programa "Produtores de Água e Floresta" do município recebe, nesta primeira etapa, R$ 40 mil. O restante da verba vai para projetos de saneamento, mais que bem-vindos em um município que tem hoje somente 50% de coleta e zero de tratamento de esgoto.
No primeiro ano do projeto-piloto, 18 propriedades receberam a verba, totalizando pouco mais de R$ 17 mil pagos. Segundo o governo, há outros 28 produtores cadastrados. O potencial de abrangência do projeto, no entanto, é alto: apenas nesta microbacia existem 120 propriedades rurais aptas a participar, em uma área de 5 mil hectares. Na bacia inteira, que abrange mais 14 municípios, o escopo aumenta para mil proprietários em 300 mil hectares de terras. "Todas as propriedades são georreferenciadas [mapeadas por satélite], o que ajudou a dar credibilidade ao projeto junto ao comitê", afirma Fernando Veiga, coordenador de Serviços Ambientais da The Nature Conservancy (TNC), parceira da Prefeitura no projeto.
Com uma economia baseada na pecuária leiteira de baixa tecnificação, Rio Claro vê no pagamento por serviços ambientais uma alternativa interessante. O município, afinal, parece não ter muito para onde correr. "Pensar em trazer a indústria para cá, nem pensar. Estamos afastados do principal eixo viário do Estado e nossa topografia não ajuda porque é muito montanhosa. A saída de Rio Claro é essa, ser produtor de água e pecuária", resume o prefeito Raul Machado.
Com contratos de quatro anos, os produtores rurais recebem parcelas semestrais que, segundo o governo, equivale ao que eles ganhariam caso optassem por arrendar a terra. "Nunca pagamos menos do que eles ganhariam de outra forma", afirma o biólogo Gilberto Pereira, diretor técnico do Instituto Terra de Preservação Ambiental, outro parceiro de peso da Prefeitura. A Emater/RJ fez os cálculos: R$ 100 por hectare/ano para o arrendamento e R$ 200 por hectare/ano para a venda de leite.
Benedito Leite, 66 anos, e a esposa, Terezinha Leite, de 62, membros da única comunidade quilombola de Rio Claro, receberam R$ 2 mil no início do ano para que o governo cercasse suas nascentes para impedir a entrada do gado. O boi, eles aprenderam, pisoteia os cursos d'água até que se transformem em brejos e sequem. "A gente não tinha na cabeça a necessidade de proteger a água", dizem. A poucos quilômetros dali, Braz de Oliveira vê o retorno do projeto com o aumento da água. Uma de suas nascentes foi cercada e o gado, agora, só olha de fora. Um verdadeiro oásis no meio do pasto.
(Por Bettina Barros, Valor Econômico, 25/06/2009)