Funcionário da Varig quando a empresa esbanjava vigor pelos ares do país, ex-empresário do setor naval e atuando hoje com automação industrial, o engenheiro sem diploma universitário Oskar Coester criou o aeromóvel na década de 1970 e conseguiu implementar um trecho de testes na capital gaúcha em 1983. Foi o máximo que a empreitada avançou no país até hoje, deslizando em pouco mais de um quilômetro acima do trânsito da Avenida Loureiro da Silva. No exterior, o veículo é usado há vinte anos. Mas com as obras previstas para a Copa de 2014, o projeto ganhará seu primeiro trecho comercial em solo brasileiro.
Cada vagão do aeromóvel pode transportar 140 passageiros de forma automatizada, segura, silenciosa e limpa. O veículo não tem piloto ou motores, é movido a ar, impulsionado por grandes ventiladores instalados nas extremidades dos condutores. A obra prevista para interligar o Aeroporto Internacional Salgado Filho à estação mais próxima do trem metropolitano terá menos de novecentos metros e custo inicial estimado em R$ 30 milhões. O dinheiro público será aplicado pela Trensurb, ligada ao Ministério das Cidades. A obra vai durar um ano e seu contrato deve ser assinado nos próximos meses.
O investimento pode soar alto para se implementar uma via com menos de um quilômetro, mas é de um quarto do valor de tecnologias em uso, diz o superintendente de Desenvolvimento e Expansão da Trensurb, Humberto Kasper. “Sistemas para transporte de pessoas entre aeroportos e pontos comerciais custam no exterior entre 50 e cem milhões de dólares por quilômetro”, disse.
O modelo nacional terá capacidade para levar até treze mil passageiros por dia e percorrer o trecho em cerca de um minuto, ligando os terminais do aeroporto ao metro convencional, que circula entre as cidades de Porto Alegre e de São Leopoldo. “Quando o modelo do aeromóvel for viabilizado (economicamente), poderá suprir necessidades internas do país no transporte automatizado de pessoas e, no futuro, até sistemas de transportes de massa. Melhorar o acesso aos aeroportos é uma necessidade que surgiu com a crise do setor aéreo”, comentou Kasper.
A Trensurb e outras instituições já pensam em novas aplicações para o aeromóvel. A Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo, planeja transportar alunos entre seu campus e a estação do metrô, bem como a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), que pode lançar este ano outro trecho experimental na capital gaúcha. A empresa também avalia, junto com o Grêmio, construir uma interligação de um quilômetro e meio entre o novo estádio de futebol do clube e um terminal do trem metropolitano.
A PUC é um dos centros de pesquisa que vem atuando para melhorar o desempenho do aeromóvel, ao lado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e da Trensurb, com apoio da Financiadora de Estudos e Projetos, do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Conforme seu criador, o aeromóvel resolve um dos principais problemas do transporte urbano nacional, a relação entre peso morto e carga útil. Enquanto a maioria dos carros no país pesa uma tonelada e carrega uma pessoa, o veículo movido a ar muda essa relação para 40 quilos para cada passageiro. Com menos peso, há economia de energia, mais segurança e maior eficiência no transporte público.
O conjunto de vagões em teste desde 1983 no trecho com pouco mais de um quilômetro próximo ao centro de Porto Alegre carrega até trezentos passageiros, mesma capacidade de um vagão do metrô em uso pela Trensurb. “Mas esses pesam cerca de 50 toneladas, enquanto o aeromóvel pesa dez”, disse Oskar Coester. Ele também conta que medições comprovaram que o gasto de energia do aeromóvel é metade do consumido por um ônibus convencional e 8,5 vezes inferior ao de um automóvel para carregar uma pessoa por um quilômetro.
Enquanto por aqui se desperdiça tamanha eficiência, em Jacarta, capital da Indonésia, um aeromóvel opera desde 1989 dentro do Parque Tamn Mini, onde já transportou cerca de 20 milhões de passageiros no trajeto de 3.200 metros.
Desde os primeiros testes com o aeromóvel, nos anos 1970, o tempo passou e o Brasil não soube aproveitar o invento. Na contramão, provocou a saturação do trânsito urbano com baixos investimentos em transporte público e incentivos à compra de mais e mais automóveis. Agora, com a Copa, o país tem nova chance para apostar em uma tecnologia nativa, barata e menos poluente. Seria um gol de placa.
(Por Aldem Bourscheit, O Eco, 17/06/2009)