Nós do povo Kaiowá e Guarani de Mato Grosso do Sul, reunidos em mais de 300 lideranças de 23 aldeias, na nossa grande assembléia – ATY GUASU – na Terra Indígena Takuara, município de Juti, com a presença de nossos aliados e autoridades do Ministério Público Federal, Assembléia Legislativa e FUNAI, saudando a memória de nossos guerreiros que tombaram na luta pela demarcação de nossas terras, vimos apresentar nosso documento final com nossas reivindicações e as decisões de nosso povo.
Somos um povo pacífico. Porém essa realidade faz com que o nosso povo viva o maior índice de violência contra os povos indígenas do Brasil. Temos a pior situação de demarcação de terras indígenas do Brasil, menos de 1% do território do Estado de Mato Grosso do Sul, para a segunda maior população indígena do País, em comparação, vemos outros Estados da Federação, que produzem mais e cuja porção de terra indígena passa dos 10% do território. Temos sofrido todo tipo de intimidação e ameaças por fazendeiros e pistoleiros que não querem ver nossos direitos respeitados. E ainda assim nos negam o mínimo daquilo que nos foi tirado! Não vemos o Governo Federal fazer nada para solucionar nossa situação RAPIDAMENTE. O pior é assistir a impunidade, a falta de justiça, contra aqueles que há décadas provocam através de vários meios, um verdadeiro genocídio do nosso povo. Não vemos esses assassinos serem julgados e condenados, o que vemos é a criminalização e a prisão injusta de nossas lideranças que lutam e reivindicam nossos direitos. Estamos cansados de esperar uma solução definitiva do Governo Federal para que os procedimentos de identificação previstos no TAC firmado entre a FUNAI e o Ministério Público Federal, em 2008, sejam de uma vez por todas concretizados.
É a monocultura desenfreada da soja, da cana e do gado, que financiados por dinheiro público, tomam o espaço da agricultura familiar indígena e camponesa, levando milhares de indígenas, quilombolas e trabalhadores rurais sem-terra ao desespero, por não terem nenhuma perspectiva de vida digna para produzirem seus alimentos e garantirem a sobrevivência das futuras gerações. Além, disso destruindo o pouco que restou dos recursos naturais de nossa região.
Repudiamos a postura do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul que ao invés de buscar uma solução para a demarcação de nossas terras, conforme a orientação feita pelo Ministério Público Federal, vem empreendendo todos os esforços para que sejam cancelados os trabalhos de identificação de nossos tekohá, pregando mentiras que somente aumentam o racismo e a intolerância contra o nosso povo. Os nossos direitos estão garantidos e nunca nosso povo abandonará a luta pela demarcação de nossos tekohá! O Governo Estadual deve entender que tentar barrar aquilo que jamais desistiremos, somente criará mais conflitos! O povo indígena de Mato Grosso do Sul quer a paz e nunca a violência! Demarcar as terras de nosso povo não afetará a economia do estado e o que queremos é muito pouco perto de todo mal que estamos sofrendo e de tudo o que nos tiraram! Soluções existem para a demarcação, o que falta é a vontade política e o respeito às nossas reivindicações e direitos!
Nossa paciência acabou!
Nossa luta continua e exigimos
1 - A imediata conclusão dos procedimentos de identificação das 36 terras indígenas de nosso povo Kaiowá Guarani de Mato Grosso do Sul, conforme a previsão do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado entre a FUNAI e o Ministério Público Federal.
2 - Que o Governo Federal disponibilize, o mais rápido possível, os recursos necessários para garantir a conclusão das demarcações, priorizando as terras cujos procedimentos já foram iniciados antes da assinatura do TAC, como por exemplo, Yvy Katu, Ñande Rú Marangatú, Potrero Guassu, Sombrerito, Guyraroká, Takuara, etc, inclusive buscando, juntamente com o Governo do estado de Mato Grosso do Sul, a solução jurídica adequada para o pagamento de eventuais indenizações dos ocupantes não-indígenas de boa-fé, mas somente os que respeitam a Legislação Ambiental Brasileira quanto às áreas de mata que devem ser obrigatoriamente preservadas nas fazendas e os que respeitaram a preservação dos recursos hídricos da região.
3 - Reivindicamos que a Polícia Federal conclua, de uma vez por todas, o inquérito que apura o assassinato de Julite Lopes, de Kurussú Ambá, em Coronel Sapucaia, que desde 2007 não temos uma solução, e que, investigue a morte de Osvaldo Lopes Pereira, de 24 anos, assassinado por tiros no dia 29/05/2009 por lutar pela demarcação de sua terra, cujo assassinato está sendo fraudado como sendo um atropelamento nas margens da BR-289.
4 - Que o Ministério Público Federal denuncie os dois fazendeiros de Amambai que atentaram contra a vida de nossos parentes de Kurussú Ambá baleando 04 pessoas e botando a culpa em nossa liderança como sendo o responsável por atirar em seus próprios companheiros.
5 - Que se investiguem os abusos de autoridade e ameaças contra a comunidade de Passo Pirajú, em Dourados, que vem constantemente sofrendo com as prisões de suas lideranças e membros da aldeia, além dos constantes tiros e ameaças de fazendeiros contra uma comunidade que apenas luta pelo reconhecimento de sua terra e que trabalham para alimentar seu povo.
6 - Que seja solucionada, de uma vez por todas, a situação dos registros de identidade indígena, que há muito tempo é reivindicada pelo nosso povo que está sofrendo com os constantes constrangimentos e negação de direitos pela sociedade sul-matogrossesse. Vemos como avanço a possibilidade de inclusão nos documentos civis, o campo para preenchimento da etnia, aldeia de nascimento e o nome na língua materna. Que este compromisso seja cumprido e que a sociedade não indígena se eduque a respeitá-lo.
7 - Que seja atendida pela FUNAI, prioritariamente, a identificação do tekohá Laranjeira Ñande Rú, em Rio Brilhante, conforme a determinação dada pelo Tribunal Regional Federal da 3° Região no prazo de 03 meses, enviando os relatórios quinzenais para o Juiz de Dourados para evitar novamente a tentativa de despejo de nossa comunidade.
8 – Que seja solucionada a situação da saúde indígena pela FUNASA, pela falta de médicos, agentes de saúde, remédios para o atendimento das comunidades.
9 – Que o Estado e os municípios, principalmente Dourados e Paranhos respeitem os direitos dos povos indígenas à educação escolar indígena diferenciada, e promova as políticas necessárias para atender a legislação. Que seja garantida a segurança nas escolas indígenas cujas crianças e adolescentes vem sendo vitimados constantemente com a violência racial, pelas drogas, bebidas alcoólicas e formação de gangues. Reivindicamos o investimento financeiro através de bolsas de estudos aos acadêmicos indígenas em Universidades Públicas, tendo como critério que estes acadêmicos estejam envolvidos com a luta e conquistas de direitos dos povos indígenas. Também reivindicamos investimento financeiro na formação de professores e que os órgãos gestores de projetos elaborem estes, afim de não perderem os investimentos garantidos.
10 – Queremos a restauração e construção de mais escolas nas aldeias capazes de acolher os ensinos fundamentais e médios, e, para as outras, garantia de transporte escolar digno.
11- Fortalecimento da agricultura familiar, através de investimentos em equipamento manual e maquinário, bem como em capacitação técnica. E que os atuais técnicos cumpram com suas obrigações.
Viva Ñande Ru, Ñande Sy, Viva nossos Guerreiros e Guerreiras, Viva a luta indígena, Viva o Movimento Kaiowá Guarani.
DEMARCAÇÃO JÁ!
ATY GUASU - Terra Indígena Takuara, Juti - MS,
(Cimi, 06/06/2009)