Um programa lançado há quatro anos em uma das mais ameaçadas regiões da Amazônia vem conseguindo viabilizar uma improvável coalizão ambientalista, da qual participam fazendeiros, índios, assentados da reforma agrária e ONGs. O projeto Y Ikatu-Xingu, da ONG ISA (Instituto Socioambiental), contabiliza 39 propriedades rurais, 6 projetos de assentamento e 6 etnias do Parque Indígena do Xingu que, em conjunto, participam da recuperação de cerca de mil hectares de áreas degradadas.
O programa propõe mudanças nas atuais formas de uso e ocupação do solo em uma faixa de 17,7 milhões de hectares que abriga as nascentes dos principais formadores do rio Xingu. Na área, que equivale a 70% do Estado de São Paulo, há cidades, fazendas de gado, plantações de soja, assentamentos rurais e 18 etnias indígenas -14 delas, no Parque do Xingu. Estudo do ISA revelou que, até 2005, cerca de 270 mil hectares de vegetação ciliar -áreas de mata à margem dos cursos d'água- haviam sido desmatados. "Chegamos à conclusão de que, para assegurar o futuro daquelas populações, seria preciso agir onde estão as nascentes", diz Rodrigo Junqueira, coordenador do Y Ikatu-Xingu.
O programa, cujo nome significa "água boa, água limpa do Xingu" no idioma dos camaiurás, tem 780 hectares em reflorestamento em fazendas e 322 hectares em processo de restauração em assentamentos. Considerando-se o desmate das áreas de preservação permanente, a parte atendida pelo projeto representa 0,004% do necessário. Junqueira, porém, diz que o objetivo é estabelecer um modelo que dê resultados mais palpáveis a longo prazo.
Um dos pioneiros da colonização que há 35 anos deu origem a Canarana (MT), o gaúcho Arlindo Cancian, 53, disse que a derrubada era à época "quase obrigação". Filiado ao programa desde 2008, ele declarou que teve receio da aproximação com uma ONG. "Mas percebi que há ONGs do bem."
(Por Rodrigo Vargas, Folha de S. Paulo, 05/06/2009)