A elevação do nível de alerta da nova gripe H1N1 pela OMS tem mais interesse para epidemiologistas e autoridades sanitárias do que para a população. A decisão do órgão se justifica do ponto de vista técnico, mas dificilmente poderia ser mais caprichosa: ela se dá porque casos de transmissão sustentada da doença agora ocorrem em países de duas -e não mais uma- das seis áreas do globo em que a OMS decidiu instalar escritórios regionais.
Trata-se, portanto, de uma mudança na distribuição geográfica dos surtos documentados. Nada diz a respeito da gravidade da doença (morbimortalidade) ou do padrão de contaminação (prevalência), as variáveis que com razão mais preocupam as pessoas.
E, sob essa perspectiva, os números da H1N1 continuam relativamente modestos. Em seu último boletim, ontem, a OMS contabilizava 28.774 casos -dos quais cerca de 2% se complicaram- e 144 mortes. Uma taxa de letalidade de 0,5%. A título de comparação, estima-se que a gripe sazonal (comum) infecte anualmente de 10% a 20% da população mundial. Estamos, portanto, falando de um contingente de 700 milhões a 1,4 bilhão de indivíduos. Desses, de 3 milhões a 5 milhões desenvolvem uma forma severa da doença, que acaba provocando de 250 mil a 500 mil mortes anuais -uma letalidade de 0,035% a 0,07%. Daí, num cálculo grosseiro, se depreende que, nos anos em que não é muito severa, a gripe sazonal mate num único dia 685 pessoas, quase cinco vezes mais do que as vítimas da H1N1 desde que ganhou as manchetes dos jornais, no final de abril.
Tais considerações não significam que a chamada gripe suína não virá a ser um problema. Trata-se, afinal, de uma nova cepa do vírus influenza A subtipo H1N1. E variantes desconhecidas de um vírus com o potencial infectante e mutacional do da gripe devem sempre ser motivo de atenção. A letalidade de 0,5%, por exemplo, pode significar a morte de 7 milhões de pessoas se a H1N1 conseguir contaminar 20% da população. Não são, contudo, surtos de pânico e hipocondria que se afiguram como defesas confiáveis contra a ameaça. Cabe às autoridades sanitárias monitorar com cuidado a evolução da doença e, em caso de alterações no perfil epidemiológico, adotar as medidas adequadas.
(Por Hélio Schwartsman, Folha de S. Paulo, 12/06/2009)