As aquisições de terras em países pobres, última tendência entre corporações, fundos de investimento e países importadores de alimentos, supõem para os mais pobres enfrentar o possível desalojamento de suas terras e ao acesso às mesmas e aos seus recursos, como a água. É isso que se depreende de um estudo encarregado pela FAO (Organização para a Agricultura e a Alimentação) e o PNUD (Programa para o Desenvolvimento), ambos ligados à ONU, apresentado na segunda-feira (25/05).
O documento pontualiza que as aquisições (de modo geral feitas na África mediante contratos de aluguel de meio século ou um século inteiro pelo que nada se paga) podem constituir um benefício ao supor investimentos estrangeiros. Também pode acarrear atração tecnológica, incremento da produtividade agrária e criação de emprego e de infra-estrutura. Mas, assim como estão sendo levados a cabo, com precárias consultas à população local, falta de transparência e sem garantir nos contratos os compromissos de investimento, emprego ou desenvolvimento de infra-estruturas, supõe colocar em risco o modo de vida de milhares de pequenos agricultores ou pastores, cuja existência depende da terra.
O estudo, realizado pelo Instituto Internacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento (IIED), enfatiza a necessidade primeira dos governos africanos de garantir os títulos de propriedade da população local, para protegê-la, evitar que seja desapropriada arbitrariamente e, assim mesmo, possibilitar que obtenha benefícios maiores dos hipotéticos investidores.
Os autores do relatório analisaram os contratos de diversos países africanos com corporações, fundos de investimento e países importadores de alimentos como os do Golfo Pérsico, do Sudeste Asiático e da China. À vista destes documentos alertam para o fato de que existe entre os investidores a crença de que a África (e a América Latina) tem terra em abundância disponível, erma ou abandonada, “mas é preciso ir com cuidado com estes termos”. Opinam que são usados para equipará-las a terras não produtivas, quando talvez sejam usadas intermitentemente (são deixadas de barbecho) por pequenos agricultores ou por pastores ou por caçadores-coletores. Esta situação já teria se dado na Tanzânia, Etiópia ou Moçambique, onde terras que estavam sendo usadas teriam sido alugadas como “abandonadas”.
Se o abastecimento de terras para empresas investidoras estrangeiras poderia ter benefícios, algo que os autores enfatizam, esses não estão tão claros quando se revisa os acordos assinados com os governos africanos (foram estudados investimentos na Etiópia, Gana, Quênia, Madagascar, Moçambique, Sudão, Tanzânia e Zâmbia), onde se constata a falta de transparência e a impossibilidade do público de ter acesso aos contratos.
A terra em si ou se dá de graça ou tem um cargo nominal (entre 5 e 10 euros o hectare em Mali). Os governos esperam benefícios como infra-estruturas ou criação de empregos. Mas os contratos – “de modo geral curtos e simples” – carecem de explicações sobre riscos ou benefícios, sobre o tipo de negócio a realizado na terra (se será uma plantação típica, se haverá um negócio conjunto com a população local) ou sobre a contratação. Os autores do estudo reclamam a necessidade de consultas transparentes à população (apontam que em alguns casos estas consultas se limitam aos anciãos dos povoados, aos oficiais e à elite do governo municipal). Questões como a segurança alimentar no próprio país também são, em muitas ocasiões, passadas por alto.
(Por Lali Cambra, com tradução do Cepat, El País / IHUnisinos, 26/05/2009)