O Ministério Público Estadual (MPE) pediu abertura de inquérito policial para apurar se houve homicídio culposo ou qualificado no caso do rompimento da barragem Algodões 1, em Cocal da Estação, Piauí. O promotor Maurício Gomes de Souza não quis apontar quem seriam os responsabilizados, mas revelou que todos os envolvidos no processo serão indiciados.
"Tratava-se de uma tragédia anunciada, por isso, cabe o inquérito por homicídio", diz Marco Túlio Caminha, procurador da República. "Deixamos isso a critério do promotor Maurício Gomes, mas estamos compartilhando informações." Segundo ele, o promotor tinha aberto uma ação cautelar, baseado no alerta da presidente da Empresa de Gestão de Recursos do Piauí (Emgerpi), Lucile Moura, de que a barragem se romperia em 20 horas. "O objetivo da ação era afastar as famílias do local até cessar o perigo", explica Caminha. "Mas depois de removidas, as famílias retornaram." As pessoas foram retiradas no dia 13 de maio, 14 dias antes da tragédia.
O promotor Maurício Gomes afirma que existia uma ação civil pública que ordenava o Estado, o município e a Emgerpi a retirar, mesmo à força, as famílias do local. Muitas delas, no entanto, recusaram-se a sair. Não queriam deixar os pertences para trás ou duvidavam do risco do rompimento da barragem.
"A promotoria não poderia invadir a casa de ninguém e retirar as famílias à força sem ordem judicial. A juíza Maria do Perpertuo Socorro Ivani de Vasconcelos expediu o mandado para que retirassem as famílias", explicou o promotor. "Elas deveriam estar em abrigo, num local seguro e com alimentação, como dizia a determinação judicial." O delegado regional Eduardo Ferreira, designado para o inquérito, informou que já iniciou os procedimentos. Laudos técnicos e de exame dos corpos estão sendo concluídos.
Vítimas
Num abrigo com mais 60 pessoas, em Cocal, Francisca Maria Percina disse, aos prantos, que ficou somente com a roupa do corpo e que sua casa foi levada pelas águas. "Eu perdi tudo. Não sabemos nem onde estão nossos parentes", lamentou.
Maria do Carmo dos Santos ficou sem casa e família. A água levou as duas filhas - Raissa , de 1 ano, e Taissa, de 9 anos - e o marido. "Minha filha (Raíssa) foi carregada dos meus braços pela água, quando tentava me segurar numa árvore para não morrer afogada." A roupa que Taíssa estava usando foi encontrada e levada para Maria do Carmo reconhecer e depois encaminhada ao delegado Eduardo Ferreira.
A trabalhadora rural Maria de Fátima Pereira, de 32 anos, também perdeu duas filhas no acidente. A mais nova, de 10 anos, já foi localizada, e a outra, de 16, continua desaparecida. Ela responsabiliza o governo pela tragédia, pois autorizou o retorno das famílias ao local. Maria de Fátima havia retornado para casa após passar 18 dias num abrigo.
(Por Luciano Coelho, O Estado de S. Paulo, 02/06/2009)