“Os acidentes com barragens no Brasil têm se agravado nos últimos anos. Um breve histórico entre 2001 e 2004 acusam tragédias como o acidente da mineração Rio Verde em 2001 e ocorrências de pequeno porte em 2002. Em 2003, destaca-se o acidente com a barragem de rejeitos industriais de Cataguazes, que, além de diversos impactos ambientais, causou o desabastecimento de aproximadamente 600 mil habitantes por quase um mês. Já em 2004, os eventos metereológicos adversos, combinados com a falta de manutenção de infraestrutura hídrica, resultaram na ruptura de 200 barragens de diversos tamanhos e tipos, causando diversas mortes e os mais variados danos materiais, ambientais e sociais. Em 2004 merece destaque o caso da Barragem de Camará.” Márcio Araújo de Lacerda.
Segundo Peck (1984), provavelmente 9 entre 10 rupturas recentes ocorrem não por deficiências do “ estado da arte”, mas por causa de negligências que poderiam ter sido evitadas, ou por falta de comunicação entre pessoal envolvido no projeto e na construção ou por causa de interpretações excessivamente otimistas das condições geológicas. Esse quadro de desmazelo tem sido a tônica na política nacional. Para tentar encontrar uma forma sustentável do ponto de vista ambiental, legal, econômico, social e institucional existem propostas, como o PL 1181/2003 , já citado em artigo publicado neste Portal, que vem tentando estabelecer uma Política Nacional Para Segurança de Barragens.
Segundo Viotti ( 1999), a integração dos esforços individuais deve ser contínua ao longo de toda a evolução de um projeto, ao invés de se colar/juntar produtos finais individuais. Isto significa que o projeto deve começar com uma perspectiva geral e em seguida focalizar as partes individuais e não ao contrário. Estabelecer parâmetros e um roteiro básico para orientar os procedimentos de segurança a serem adotados em novas barragens e manter as já construídas num estado de segurança compatível com a envergadura da obra, são condições fundamentais aos que respondem pela vida útil desses empreendimentos.
Uma revisão dos modos e causas de falhas em barragens nos remete a formação da equipe de vistoria selecionada. Para compreender e identificar o potencial de falha ou de fragilidade numa barragem, os membros da equipe, deverão ser geólogos, engenheiros civis e mecânicos com amplo conhecimento das falhas e rupturas neste tipo de estrutura, com base em estudos de anterioridades, eventos mal sucedidos e os bem sucedidos, durante a vida útil da barragem. Há causas primárias de falhas e condições adversas que devem ser levadas em consideração. Os anais do Comitê Brasileiro de Grandes Barragens – CBGB, contêm inúmeros casos associados à erosão do talude, liquefação, deslizamentos, obstruções, revestimentos fraturados, evidência de sobrecarga da capacidade disponível, comportas e guinchos defeituosos, reação agregado-álcalis, lixiviação, alta sub-pressão deslocamentos e deflexões diferentes, instabilidade do talude, vazamento excessivo, permeabilidade, recalques diferenciais, afundamentos, entre outros.
A avaliação de uma estrutura consta de revisão, análise de todos os dados disponíveis relativos ao projeto, construção e operação da barragem e elementos associados. Estar familiarizado com a barragem e seu histórico de operação e manutenção, de forma a facilitar a vistoria e concluir sobre seu desempenho no futuro deveria ser considerado prioritário como um capítulo do Manual de Segurança de Barragens. Enquanto não se formar a consciência de um cadastro com acompanhamento diário das condições de operação observadas por equipes habilitadas em intervalos constantes, e os que acontecem em edição extraordinária, minimizariam os impactos irreparáveis que temos presenciado nesses últimos tempos no país. Quantos acontecimentos semelhantes terão de acontecer no Brasil para que se tenha consciência do problema e exercer a cidadania com responsabilidade ?
As medidas tomadas após o rompimento da barragem são apenas mitigadoras e constatam o pouco caso que se faz do funcionamento de um empreendimento de vulto que merece permanente vigilância dos órgãos de governo. Sabe-se visualmente e por consulta aos projetos quando uma estrutura não mais cumpre as funções requeridas, quer pelas leituras dos instrumentos, ensaios em material da barragem, fissuras visíveis, pela vida útil que uma barragem apresenta, entre outros. Deveria ser instituído não só nos meios técnicos, e, em outras esferas, também, o que podemos e devemos aprender com os erros cometidos no passado.
As eventuais obras de reparo ou manutenção recomendadas nas inspeções, nem sempre são levadas em consideração num intervalo de tempo para que sejam tomadas medidas com a máxima brevidade possível. Daí as elevadas estatísticas de insucessos na operação de barragens no Brasil. No intuito de disseminar o que existe em domínio público, como elemento balizador de futuros empreendimentos, deixo as seguintes referências webliográficas:
http://www.ageco.org.br/site/images/stories/docspdf/seguran%C3%A7a_de_barragens.pdf
http://www.dominiopublico.gov.br.download/texto/min000008.pdf
Ela é de janeiro de 2005 e não dispõe de informações dos recentes acidentes em Minas Gerais e na Paraíba, que nos serviram de alerta.
Episódios como os de Orós (em 1960), Nilo Peçanha (em 1968), Euclides da Cunha e Armando Salles de Oliveira (em 1977), Armando Ribeiro Gonçalves (em 1984) devem fazer parte de nossa cultura técnica de barragens. Esperamos que equipes técnicas de governo sejam ligadas “ on line “ para a transferência de dados cadastrais e histórico de cada empreendimento, permitindo uma permanente vigilância das condições de operação dessas estruturas, num país possuidor de vastos recursos hidráulicos.
(Por Carol Salsa*, EcoDebate, 01/06/2009)
* É colaboradora e articulista do EcoDebate, engenheira civil, pós-graduada em Mecânica dos Solos pela COPPE/UFRJ, Gestão Ambiental e Ecologia pela UFMG, Educação Ambiental pela FUBRA, Analista Ambiental concursada da FEAM ; Perita Ambiental da Promotoria da Comarca de Santa Luzia / Minas Gerais