Desde criança Silvênio Gnoatto, de 63 anos, frequenta o Rio Uruguai. Dele, tirou seu sustento e o da família. Mesmo sem o vigor da juventude, gosta de ir ao rio. Neste ano ficou somente três domingos em casa. – Dá uns trocos e eu gosto – diz, exibindo dois corimbatãs de cerca de quatro quilos cada. A Foz do Chapecó Energia, concessionária da hidrelétrica Foz do Chapecó, fará até o final de junho um levantamento das famílias que dependem da pesca no trecho onde haverá redução da vazão do Rio Uruguai. – A partir disso, vamos estudar uma forma de compensação – informa o diretor superintendente da concessionária, Ênio Schneider. Gnoatto lembra da época que havia muito mais variedade no rio.
– Tem ainda alguma coisa por causa do laboratório – referindo-se à Estação de Piscicultura de São Carlos, vinculada à Unochapecó.
O que ele mais queria era poder continuar com sua atividade. A meta, agora, é receber uma indenização para comprar um terreno na região de Mondaí ou Itapiranga, para continuar pescando sem entrar em conflito com os pescadores locais. Uma das espécies que vêm ficando cada vez mais escassas no Rio Uruguai é o dourado. O peixe, que já foi um dos principais naquelas águas, hoje é também um troféu para os pescadores.
Em virtude das barragens que interrompem o curso do rio, os dourados não consegue mais migrar em determinados trechos durante o período da piracema. O pescador Selvino Matos lamenta a dificuldade crescente de encontrar o peixe símbolo do Rio Uruguai, e afirma que sobrevive graças a sua aposentadoria:
– Desde o dia 16 de abril que não pesco um dourado.
Prefeitos acreditam em um acordo
Juares Pitt, 53 anos, não é pescador, mas também sente os efeitos do desvio das águas. Durante muitas décadas, a única maneira de atravessar o Rio Uruguai entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina foi a balsa. Ainda hoje, ela é o meio mais utilizado em localidades que ficam longe de pontes.
É o caso de moradores de São Carlos e Alpestre (RS), que estão a 60 quilômetros das pontes de Chapecó e Palmitos. De olho no bom negócio, a família Pitt comprou a barca e o direito de fazer as viagens. A partir do desvio, entretanto, e da conclusão da hidrelétrica, que prevê uma ligação asfáltica entre os dois estados, suas duas barcas e três rebocadores ficarão sem utilidade.
– Não sei o que vou fazer – diz.
Os prefeitos de Águas de Chapecó, Adilson Zeni, e de São Carlos, Élio Godoy (ambos do PMDB), acreditam que a empresa responsável pela hidrelétrica vai atender os afetados. Godoy disse que em audiência pública realizada há poucos dias em São Carlos, com a presença de representantes do Ibama, Ministério das Minas e Energia e da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca, a Foz do Chapecó Energia comprometeu-se em cadastrar e atender os moradores.
Segundo ele, o município receberá um parque aquático estimado em R$ 5 milhões, no Balneário de Pratas, onde o rio ficará mais estreito. Godoy disse que a decisão pelo parque foi definida pela comunidade, em duas audiências públicas. Citou que o município também recebeu uma ciclovia, às margens da SC-283.
– A empresa está atendendo nossos pedidos – conclui Godoy.
Adilson Zeni confirma que há moradores afetados pela obra. Ele também acredita em acordo devido às compensações as quais os empreendedores são obrigados por lei. Ele afirma que o município busca investimentos para desenvolver o turismo da região, além de projetos com o objetivo de gerar emprego e renda. Ele adianta que a concessão de cartas de crédito ou reassentamentos são apenas para os atingidos de áreas alagadas. O empreendedor destaca que ainda é cedo para avaliar o impacto da redução da vazão do rio:
– É possível que ocorra um aumento do volume de pescado.
Schneider cita que um monitoramento realizado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) apontou uma redução no volume de peixes entre 2001 e 2007, com posterior aumento. Por isso, considera que até o momento a obra não pode ser responsabilizada por oscilações na presença de peixes. Ele garante que o consórcio vai compensar pessoas comprovadamente impactadas, e confirma a construção do parque aquático em São Carlos.
(Por Darci Debona, Diário Catarinense, 24/05/2009)