O Ministério Público do Paraná e a Universidade Federal promoveram um seminário com o intuito de angariar mais apoio para a proposta do novo estatuto do índio que a Funai, o Ministério Público, as Ongs neoliberais e algumas lideranças indígenas do CNPI vêm promovendo, inclusive neste recente Acampamento Terra Nova que aconteceu na semana dos dias 5 a 9 de maio último.
Por uma ironia do destino, ao contrário do movimento contra a emancipação do índio que ocorreu em 1978-79, os procuradores estão todos a favor da mudança do estatuto do índio. Acham que o atual está caduco, que a diferença que ele faz entre índios integrados e não integrados não é válida, que a tutela do Estado não deve prevalecer e outras coisas mais. Inclusive que os índios podem ser punidos igual a qualquer outro brasileiro, como alardeou seriamente o atual presidente da Funai.
Por maior ironia, um procurador da Funai da região, Derli Fiúza, pronunciou-se contra o atual estatuto, o qual ele devia defender, dizendo que, entre outras coisas boas, a nova proposta retira o propósito de integração do índio à Nação brasileira, e diz isso como se fosse uma verdade e como se fosse uma coisa boa. Será que ele não leu o voto do Ministro Ayres Britto sobre esse assunto? Lembro aqui que o voto do referido ministro diz que integração é uma via de mão dupla e que tudo que se faz em prol dos índios significa de algum modo o processo de integração.
Sobre a proposta do novo estatuto do índio há grande controvérsia no meio indígena, não digo no movimento indígena porque este parece estar tomado pelas Ongs neoliberais e pelo discurso do CIMI. Os índios que fazem parte da CNPI e que seguem as orientações do CIMI e das Ongs neoliberais acreditam que a constituição de 1988 retira o objetivo de integrar os índios à Nação, simplesmente porque diz que os costumes dos índios serão respeitados. Ora, o próprio Estatuto do Índio, de 1973, que eles tanto atacam, também diz que a cultura indígena deve ser respeitada no próprio primeiro artigo. Portanto, essa coisa de que o novo estatuto surge para dizer que os índios não serão mais integrados à Nação parece uma pinimba intelectual mal conduzida dessa geração de ongueiros e procuradores contra o estatuto atual.
Por sua vez, os índios que seguem as suas lideranças de raiz estão muito cabreiros com essa história de mudança, de extinção da tutela do Estado e com as promessas que os promotores da nova proposta estão fazendo. O objetivo do Ministério Público Estadual do Paraná saiu pela culatra. Ao convidar lideranças de raiz viram que a maioria dos índios Kaingang, Guarani e os representantes do Xingu, se posicionaram contra essa celebração equivocada de mudar o atual Estatuto do ìndio.
Segundo Ianaculá Rodarte, do povo indígena Yawalapiti, os índios de raiz vão se unir para protestar e não deixar que o Congresso Nacional passe a proposta do novo estatuto sem a modificações que acham pertinentes.
A matéria abaixo, que não apresenta as falas dos patrocinadores desse evento, infelizmente, mostra os argumentos de Ianaculá e dos índios Guarani e Kaingang presentes. A matéria sugere que é uma Ong que diz que o novo estatuto desprotege o índio. Mas não foi Ong que disse o que Ianaculá disse. Foi índio mesmo.
Matéria "Mudança em lei desprotege índios, diz ONG"
A primeira década do século 21 se aproxima do fim, mas as divergências entre índios e não índios, surgidas há mais de 500 anos, desde que o “homem branco” aportou no Brasil, parecem ainda distantes de uma solução. A mais recente se refere à elaboração de um novo documento, cujo objetivo é garantir o cumprimento dos direitos das diversas etnias em todo o País.
Em abril, a redação final foi definida, durante reunião da Comissão Nacional de Política Indígena – formada por membros das comunidades indígenas, do Ministério da Justiça, da Fundação Nacional do Índio (Funai) e da Procuradoria-Geral Federal. O grupo revisou e elaborou uma proposta de Lei Ordinária, que será denominada Estatuto dos Povos Indígenas.
A nova proposta exclui a tutela, retirando dos índios a condição de inimputáveis. Com isso, os índios que cometerem crimes poderão ser punidos com o mesmo rigor com qual são julgados os demais brasileiros. “Essa é uma grande preocupação para nós, porque se for aprovado pelo Congresso do modo como está, o índio não terá mais qualquer tipo de proteção; ficará à mercê de qualquer um”, afirma Ianaculá Rodarte, da etnia Camaiurá, coordenador-geral do Ipeax, organização não governamental composta e dirigida por índios do Alto Xingu, local onde vivem 5 mil pessoas em 14 comunidades de diversas etnias.
Segundo o procurador federal Derli Fiúza, especialista em Direito indígena, o atual Estatuto do Índio (lei federal nº 6.001/73) está defasado e o novo projeto inclui avanços importantes, como o fim dos critérios integracionistas. Não será mais válido afirmar que um índio é integrado, não integrado, em vias de integração ou isolado, pois a Constituição Federal estabelece o direito à alteridade social, o direito e o respeito às diferenças sociais.
“Deixa-se de empurrar o índio para que se integre ao modelo de sociedade estabelecido pela civilização não índia para respeitar o modelo e as peculiaridades de ‘orfanização’ social de cada povo indígena”, explica Fiúza. Durante o 2º Seminário Estadual Indígena – História e Atualidade, realizado esta semana na sede do Ministério Público Estadual, em Curitiba, representantes das etnias Kaingang e Guarani também demonstraram insatisfação quanto à versão final do documento. “O modo como está escrito não tem nada a ver com o que foi aprovado nas bases, junto às comunidades”, ressaltou Ianaculá.
Entretanto, de acordo com o procurador Derli Fiúza, a proposta, que ainda será encaminhada ao Congresso, é resultado de uma ampla discussão nacional, e significará benefícios. “Não mais será possível referir-se a índios “aldeados” e “não aldeados” para que sejam respeitados seus direitos, basta que se declare indígena, que se identifique e seja reconhecido como indígena para usufruir das regras específicas da legislação a eles destinadas”, destaca.
Na avaliação de Ianaculá, o momento é de mobilização para evitar que a proposta para o novo Estatuto dos Povos Indígenas comece a tramitar no Legislativo sem alterações. “A partir de agora, essa é nossa luta. Vamos começar a reunir as organizações não governamentais e procurar convencer os parlamentares que são sensíveis à causa indígena.
Por Luiza Xavier, para Divulgação/MP-PR
(Blog do Mércio, 25/05/2009)