A mobilização de camponeses e moradores da localidade colombiana de Cuayá ainda não conseguiu deter a extração sem controle de carvão na área, com consequências ambientais nefastas no pré-páramo e na lagoa de Suesca, a três mil metros acima do nível do mar. “Há pouco mais de três décadas a Grande Lagoa de Suesca tinha cerca de 14 quilômetros de diâmetro, mas agora tem apenas três”, disse à IPS Vicente Castillo, agricultor local e testemunha durante seus 53 anos de vida da deterioração ambiental pela atividade extrativista. “A mineração acaba com as nascentes, seca os riachos e ocorre a erosão que acaba com a montanha nativa”, explica Castillo, que descreve que muitos dos caminhos rurais de hoje já foram rios e quebradas, que podem ser reconhecidos pela cor e pelo tamanho das pedras. Por isso a comunidade quer deter a exploração da mina La Esperanza de onde se extrai carvão de forma intermitente desde 2002.
A mina fica em um cânion natural entre as localidades de Cuayá e Hatillo, no município de Suesca, 75 quilômetros ao norte de Bogotá e com 15 mil habitantes, em sua maioria nativos donos de minifúndios dedicados a hortas, pecuária leiteria e outras atividades agrícolas de pequeno porte que são afetadas pela extração de carvão. “Isto se comprova olhando o desnível do terreno em locais próximos a minas já fechadas”, disse à IPS Germán Gómez, de 42 anos, natural de Suesca. “Onde a terra era plana, cultivável ou animais podiam pastar, hoje há desníveis, está reassentada e, embora por um tempo as raízes das árvores ajudem a sustentá-la, acabam desmoronando. É grave porque a recuperação demora muito tempo, séculos”, diz Gómez, enquanto Castillo compara esta situação com “cortar as veias do corpo humano”. Veias de uma região com “características naturais como uma falha geológica do tipo inverso, o que significa que é muito rica em água subterrânea”, disse à IPS Gloria Umaña, que deixou Bogotá e se radicou na região há sete anos para trabalhar pela conservação do meio ambiente.
Umaña pos em marcha há dois anos o projeto Backtoeden, pelo qual se planta mais de mil árvores, dedicando-se nos últimos meses a conhecer os prejuízos causados pela mineração em uma região onde “pode demorar 15 dias ou um mês sem que o aqueduto forneça o serviço de água potável”. Por isso “é paradoxal a extração e o desperdício das águas extraídas do subsolo para a mineração. É um crime ambiental dar à água o tratamento de lixo que se joga fora, corre, estanca e acaba convertendo-se em lama”, acrescentou.
“Quando os túneis ficam vazios, se deixa de bombear e a água volta a inundar as escavações e reage quimicamente com os sulfuros de metal usados durante as extrações produzindo acido sulfúrico que contamina mananciais, lagos, rios. É o que se conhece como drenagem acida das minas”, disse Umaña. Segundo os cálculos feitos, das duas bombas em uma única boca de mina são extraídos 72 metros cúbicos de água por dia, além do fato de a mina ficar no leito do riacho Congota. “Vivemos um infame desmatamento por desidratação”, Lamentou Umaña. “Não se imagina o que vai acontecer dentro de 10 ou 15 anos”, acrescentou Castillo, que espera que seus netos possam desfruta algo da terra que ele conhece e ama.
Os problemas expostos têm origem em uma mina com título, mas sem licença ambiental. Segundo a Procuradoria Ambienta informou aos camponeses, as licenças de cumprimento por responsabilidade civil e trabalhista estavam vencidas no momento de recopilar a informação. “Temos muito de onde tirar para defender nossos direitos, sempre de forma pacífica”, acrescentou Castillo. Na mina não há meios de ventilação, nem sinalização externa interna, e foram feitos túneis e bocas de mina opor fora da área concedida por contrato. “Já não se pode caminhar à noite como antes, tranqüilo, porque há o risco de se cair em um desses buracos”, disse Gómez.
A mina está em nome de quatro pessoas, sendo a cabeça visível José Joaquín Medellín, que, aparentemente, pertenceu ao exército colombiano, o que a IPS não pôde confirmar. Como representante legal da mina aparece Miryam Briceño, a que a IPS tentou encontrar no número de telefone registrado nos documentos, mas ali responderam que não a conhecem. Tampouco é totalmente certo que sejam Medellín e as pessoas que aparecem registradas os reais proprietários da minam, porque poderiam estar cumprindo a função de testas-de-ferro.
Na reunião pedida pelos moradores de Suesca em agosto do ano passado para tratar da situação que ocasiona a mina, Medellín os acusou de serem guerrilheiros e “gamines”, com se chama na Colômbia, de maneira a depreciar, os indigentes e delinqüentes menores, palavras que soam mais ameaçadoras no contexto da política de Segurança Democrática do direitista presidente Álvaro Uribe. De fato, depois dessa reunião, vários participantes se retiraram garantindo, alguns, que tiveram medo, e outros que a situação não é grave.
Mas, os que mantêm seu empenho em favorecer o meio ambiente continuam enviado cartas e solicitações constantes a entidades governamentais locais, departamentais e nacionais, como a prefeitura de Suesca, a Procuradoria regional para o meio ambiente, o Governo de Cundinamarca, a Corporação Autônoma Regional (Car) e o Ministério do Meio Ambiente. Os líderes camponeses recorrem a figuras constitucionais como direitos de petição para conseguir respostas e conseguir reuniões com o prefeito de Suesca, Oscar Barrera, a que a IPS telefonou.
No entanto, Barrera, após ouvir o motivo do telefonema, perguntou “de que mina está falando” e desligou o telefone, ou, coincidentemente, caiu a ligação. Em outra tentativa da IPS, o prefeito garantiu que estava em um sótão que limitava o sinal telefônico e, a partir daí, o celular permaneceu apenas em situação de receber mensagens. Porém, as fontes ouvidas garantem que Barrera desconhece a importância do problema e que em suas respostas argumenta, por exemplo, que lutar contra os donos do título é inútil porque eles têm muitos e destacados advogados. Barrera também se ampara no fato de a exploração começar antes de assumir como prefeito em janeiro de 2008 e que a licença foi concedida no começo desta década pelo estatal Instituto Colombiano de Geologia e Mineração (Ingeominas). Mas, segundo Castillo, essa habilitação foi feita “sem pensar no dano ambiental nem consultar a comunidade que vive na área e que é a prejudicada, porque os outros causam os danos e vão embora”. O claro exemplo disse é “a lagoa de Suesca, onde fizeram perfurações de até 200 metros de profundidade, e por isso está quase acabada”, afirmou este morador.
E como se tudo isso não bastasse, há o barulho, que “sofremos durante 24 horas, de segunda a segunda, das maquinas na boca da mina e dos latidos dos cães”, contou Umaña. Barulho que também interrompe as aulas na escola local onde estudam 40 crianças, que “nem sempre ouvem a professora”, como disse à IPS Héctor Javier Gómez, de 11 anos, aluno da quinta série que, tímido, mas interessado, seguiu a dos adultos.
À poluição auditiva se segue a instalação de uma fileira de postes de energia que quebre o cotidiano dos camponeses e seu descanso noturno, fazendo-os se sentirem em meio a uma avenida da cidade. E o único possível benefício para a comunidade que a exploração mineira poderia deixar seria dar trabalho a pessoas da região. Mas, muitos mineiros chegam desde o departamento de Boyacá, com tradição na extração de carvão. A IPS conversou com um deles, não revelando seu nome diante da possibilidade de uma possível demissão.
Com 26 anos e país de dois filhos e escolaridade básica, garantiu, por um lado, não conhecer os danos ambientais causados pela mina e, por outro, não ter opções trabalhistas para escolher. Sua renda depende da quantidade de carvão extraída, variando entre o equivalente a US$ 300 e US$ 350 por quinzena, dos quais deve descontar 12% para o pagamento do serviço de saúde e 16% com contribuição previdenciária. Mas, o trabalho não tem vínculo direto com quem os contrata. O salário mínimo legal mensal fica perto dos US$ 300 atualmente, o que para o caso do mineiro de Boyacá daria uma boa opção comparativa, sempre e quando não sofrer acidentes nem ser vítima de explosões. Toda a situação foi exposta de maneira contínua aos órgãos de controle e verificação, onde se conseguiu respostas, mas não soluções, até agora. “Parece que o Estado perdeu suas capacidades de gerar condutas regulares e o cumprimento da lei, porque os danos estão à vista de todos, são evidentes”, disse Umaña desconsolada, lembrando que ultimamente o barulho aumentou porque começaram novas obras de infra-estrutura.
“Nos dizem que vão estudar a situação e, enquanto isso, continua toda esta devastação diante de nossos olhos”, afirmou Castillo, garantindo que não vacilarão em sua tentativa de fazer valer os direitos que alcançam ano apenas os moradores de Suesca, mas toda a região e o país, “em um momento em que o mundo não para de falar em aquecimento global”, disse o agricultor.
(Por Helda Martinez, IPS / Envolverde, 19/05/2009)