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soja política agrícola brasileira política do agronegócio
2009-05-20

Produto em franca expansão no mercado internacional, a soja é hoje uma das principais commodities brasileiras (o país é o segundo produtor mundial), cultivada do Rio Grande do Sul ao Norte-Nordeste do Brasil. Além do uso na alimentação do ser humano, é utilizada também no fabrico de ração para animais, tintas e biodiesel, entre outras aplicações. A função estratégica desse grão vital em vários áreas é tema de "The World of Soy" (O Mundo da Soja, University of Illinois Press, 337 págs., US$ 40, R$ 83), lançado nos EUA e no Reino Unido.

Uma das organizadoras do livro (com Chee-Beng Tan e Sidney Mintz), a antropóloga norte-americana Christine Du Bois ressalta o papel da soja na modernização da agricultura, no mercado de commodities, na indústria e na transformação de produtos alimentares. Mas não esquece da ameaça ambiental que representa a expansão do cultivo da soja. "É preocupante", diz Du Bois, que também é pesquisadora vinculada à Universidade Johns Hopkins, nos EUA. Já Ivan Sergio Freire de Sousa, pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e coautor de dois artigos publicados no livro, considera que, no caso brasileiro, o produto "não pede mais expansão de áreas", mas "demanda tecnologias cada vez mais eficientes". Na entrevista abaixo, discutem também os impactos econômicos e a relevância do grão como commodity: sozinhos, Brasil, EUA e Argentina respondem por 81% da produção.

Folha de S. Paulo - Como a soja se tornou um dos sustentáculos do processo de modernização da agricultura?
Ivan Sergio Freire de Sousa -
Há cerca de 40 anos a produção de soja no Brasil era inexpressiva. As variedades que utilizávamos vinham do sul dos EUA, algumas outras eram desenvolvidas pelos nossos institutos de pesquisa, como o Instituto Agronômico de Campinas (SP). Quando se falava em soja no Brasil, a lembrança que vinha à mente era a região Sul, Rio Grande do Sul principalmente, onde existia a famosa dobradinha trigo/soja, sendo o trigo, na época, o principal produto. Isso mudou, e por vários fatores. A partir dos anos 1980, os pesquisadores conseguiram desenvolver variedades de soja cada vez menos dependentes da latitude, tornando possível a produção em todo o país. Juntando tudo isso com o dinamismo do agricultor brasileiro e o forte apoio governamental nas áreas de financiamento e infraestrutura, houve a modernização do setor.

Christine Du Bois - Nos EUA, pesquisas com apoio do governo realizadas na metade do século 20 mostraram muitos caminhos em que a soja poderia ser usada de modo rentável. Eles vão desde aplicações industriais (por exemplo, no fabrico de tintas), na produção animal (especialmente para a alimentação de porcos e galinhas) e na alimentação humana (sobretudo o óleo utilizado em muitos alimentos processados em todo o mundo). Esses variados usos da soja, juntamente com várias políticas privadas e governamentais de sustentação de preços, incentivaram fazendeiros do Meio-Oeste dos EUA a cultivá-la em grande escala. Muita modernização na agricultura, mercado de commodity, indústria e a transformação de produtos alimentares alinharam-se a essa agricultura, embora a colheita da soja não seja a única a ter semelhante impacto.

A soja teve, então, papel decisivo na modernização da agricultura brasileira?
Sousa -
A agricultura moderna é, em grande medida, um empreendimento científico envolvendo sociedade, ciência, tecnologia e natureza. Não foi só a soja que se modernizou no Brasil, outros cultivos também passaram por esse processo. Mas, no caso da soja, os agricultores foram aos centros de pesquisa solicitar tecnologias e houve resposta rápida para essa demanda.

Du Bois - O que podemos chamar de "complexo industrial da soja" exige equipamento agrícola pesado, fertilizantes, inseticidas, sementes, unidades de armazenamento dos grãos, transporte por barco, trens, caminhões. Além disso, são necessárias facilidades para pesquisas agrícolas, operações bancárias, especialistas em comercialização, advogados, migração da força de trabalho e o desenvolvimento das cidades para abrigar, alimentar e cuidar dos trabalhadores e suas famílias. O cultivo de soja em grande escala traz, assim, múltiplos níveis de modernização e desenvolvimento em seu rastro, onde quer que aconteça, incluindo o Brasil.

A soja terá a importância que o trigo já representou para a humanidade?
Du Bois -
  A soja talvez já seja o "novo trigo". Pelo volume, é a colheita mais internacionalmente comercializada. Como populações em países em via de desenvolvimento começam a comer mais carne (especialmente os chineses), a demanda para a soja como ração animal continuará a crescer firmemente.

Como se configura o mapa da produção mundial de soja hoje?
Sousa -
Originária de regiões de altas latitudes, a soja pode hoje ser produzida em quase todas as partes do mundo. Sua produção, porém, está concentrada em alguns poucos países, como EUA, Brasil, Argentina e China, principalmente. A soja produzida na China é para consumo interno, mas devido a sua grande população, é um país importador. É a produção desses países que dita o preço da soja.

Du Bois - Os EUA são ainda o maior país produtor de soja, mas o Brasil e a Argentina não ficam para trás.

E quanto ao mapa brasileiro da produção de soja?
Sousa -
O Centro-Oeste é a grande região produtora, mas a soja é plantada do Rio Grande do Sul ao Norte do país. Há municípios baianos [na região de Barreiras, no oeste do Estado] especializados na produção de soja. Utilizando-se de critérios como período de plantio, área plantada e uso intenso de tecnologia, sua produção no Brasil pode ser dividida em três regiões distintas: a tradicional, a de expansão e a potencial. A região tradicional corresponde aos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo, onde a introdução da soja foi baseada na tecnologia importada do sul dos EUA, com suprimentos locais que cresceram durante o tempo. A situação atual é completamente diferente, com oferta de tecnologia competitiva originada localmente. A região de expansão é formada pelos Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins, Maranhão, oeste de Minas Gerais e Bahia. Em contraste com a região tradicional, o solo típico da região de expansão é o do cerrado. Essa expansão somente se tornou possível quando a pesquisa agropecuária nacional fez importantes conquistas, incluindo a criação de variedades menos suscetíveis aos problemas das baixas latitudes e o desenvolvimento de novas técnicas de fertilidade de solo. A região potencial inclui o restante do país. Germoplasmas [material genético contido na semente] adaptados a todas as latitudes encontradas no Brasil tornaram possível a produção de soja em qualquer parte do território nacional.

Qual o impacto da soja no desenvolvimento do agronegócio e na abertura e ocupação de novas fronteiras agrícolas no Brasil?
Sousa -
Esse impacto tem sido grande. A cadeia produtiva da soja cresceu bastante, principalmente quando comparamos com os anos 1970, época do início da expansão. Hoje se pensa mais em produtividade, e o papel da tecnologia é fundamental. Essa fronteira agrícola chegou ao seu limite.

Quais as principais consequências, do ponto de vista econômico e ambiental, do modelo agroindustrial de produção de soja no país? A expansão das regiões produtoras representa uma ameaça ambiental para a Amazônia?
Sousa -
Alguns desinformados costumam fazer a relação entre a expansão da soja e o desflorestamento. Mas o que ocorre é o aproveitamento parcial das áreas desmatadas, integrando-as ao processo produtivo. O economista e engenheiro agrônomo Alfredo Kingo Homma, um estudioso da área, costuma lembrar que, num período de 30 anos, a safra de grãos do Brasil quadruplicou, mas a área plantada nem sequer dobrou de tamanho. A pesquisa agropecuária tem oferecido resultados tecnológicos significativos, do ponto de vista ambiental, em várias áreas, como é o caso do controle biológico de pragas. Com isso se tem evitado ou diminuído o uso intensivo de pesticidas. Não conheço casos em que sojicultores estejam clamando por desmatamento. Isso não existe.

Du Bois - Economicamente, o agronegócio da soja no Brasil é sem dúvida rentável, embora a riqueza seja distribuída de maneira desigual. Além disso, em algumas regiões como o Nordeste, a conversão da terra para o consumo de alimento local em terra para a produção de soja para exportação tem feito com que os preços dos alimentos locais aumentem. E, com isso, os pobres são atingidos. Do ponto de vista ambiental, a conversão do cerrado - uma savana com biodiversidade extremamente rica - numa terra para a monocultura agrícola da soja é preocupante. A região da Amazônia está também ameaçada, porque mesmo que se diga aos fazendeiros que eles não devem desmatar, a menos que sigam regras estabelecidas, o desmatamento continuará. A Amazônia precisa, de fato, da aplicação de regras. O cerrado precisa de áreas extensas preservadas. Esses recursos naturais selvagens são o patrimônio do Brasil, com grande valor para as futuras gerações - e devem ser protegidos.

A soja é, hoje, uma das principais commodities brasileiras. Qual o futuro do país como um "commodity country"?
Sousa -
O Brasil precisa ser mais do que um "commodity country", embora suas commodities agrícolas venham trazendo garantia de empregos no campo e nas pequenas cidades, além de gerarem divisas.

Na América Latina, a soja é predominantemente usada como um componente básico da nutrição animal. No Brasil, qual o papel da soja e dos seus derivados (como o óleo) na economia alimentar?
Sousa -
Em todo o mundo, a soja é predominantemente utilizada como ração animal. No Brasil deu-se um caso interessante. O óleo foi um derivado de muita importância. Antes da soja, os óleos alimentícios disponíveis no mercado eram os de amendoim, algodão e milho, principalmente. O óleo vegetal era caro e difícil. Consumia-se muito a gordura animal, vendida em latas. O óleo de soja foi o óleo vegetal que modificou drasticamente esse quadro. Os demais apenas complementaram o que a soja realmente fez.

(Por Euclides Santos Mendes, Folha de S. Paulo / IHUnisinos, 17/05/2009)


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