Coube à CPT promover a primeira ocupação de terra no Nordeste, em Pernambuco, em 1986. Ela culminou com a desapropriação das terras do Engenho Pitanga, no município metropolitano de Igarassu, depois de uma luta que incluiu um acampamento de quatro meses de duração na praça da República, no centro do Recife. Na época o MST ainda não existia no Nordeste. Mas os padres católicos envolvidos com questões sociais já acompanhavam os conflitos agrários desde os anos 60.
"Na nossa região, nos anos 70, a prioridade número 1 da Igreja, no nível pastoral, era o campo", relembra o padre italiano Herminio Canova, de 63 anos, dos quais 30 vividos no Nordeste. Coordenador da CPT na Paraíba, ele conta que se identificou com a questão logo que chegou à região. Participou da Pastoral Rural e do Movimento de Evangelização Rural (MER), antes da criação da CPT - que ocorreu em 1975, na parte final do governo do general Garratazu Médici, em plena ditadura militar.
Segundo seu relato, no início a pastoral apoiou sobretudo os posseiros, ameaçados de expulsão por grandes empresas e latifundiários. Também ajudou na formação de lideranças sindicais e apoiou greves de cortadores da cana. Nos anos 90, com a chegada do MST ao Nordeste, começaram as grandes ocupações. "Nossas equipes se envolveram nas ocupações", diz Canova.
"Com tanta gente desempregada e pedindo terra foi necessária uma missão nossa, foi necessário se meter", diz. Ele destaca, no entanto, que a CPT não é um movimento: "É uma pastoral. Movimento é direção política, tem dirigentes, nós não temos dirigentes, não somos quadros politizados de sem-terra. A CPT promove o protagonismo dos trabalhadores". A Igreja, segundo padre Herminio, analisa hoje um novo modelo de reforma agrária. "Este modelo está esgotado", observa. "Ele mexeu, arranhou a estrutura fundiária, mas não resolveu o problema fundiário do País. A estrutura agrária ainda é complicada, com muita concentração de terra, muita disputa pela terra, pela água."
Foi pensando nesta nova direção que a CPT lançou uma campanha para impor um limite máximo na propriedade rural, considerada um bem comum. Isso permitiria democratizar a propriedade. Em outra frente, exige que o governo aumente o atual índice de produtividade, que estaria defasado em relação às técnicas de produção. Isso facilitaria a obtenção de terras para a reforma agrária, uma vez que, legalmente, terras improdutivas podem ser desapropriadas.
Para o padre, o campo "está em disputa". De um lado estariam grandes empresas do agronegócio; do outro, comunidades tradicionais, camponeses e índios. Nessa luta já existem "territórios livres", segundo o padre. Ele cita como exemplo os 40 assentamentos acompanhados pela CPT no litoral paraibano, que contam com cooperativas, associações, escolas e até um pequeno banco de crédito, gerido pelos assentados.
(Por Angela Lacerda, O Estado de S. Paulo / IHU Online, 17/05/2009)