Na Amazônia brasileira, nas árvores que estão nos 100 milhões de hectares de terras indígenas e reservas extrativistas, há 15 bilhões de toneladas de carbono estocadas. Este volume impressionante, que causaria um caos climático se liberado na atmosfera, é 30% das 47 bilhões de toneladas de carbono que estão espalhadas nos troncos, galhos e no solo das florestas da região. Mais do que isso: representa oito vezes o esforço mundial de reduzir a emissão de gases-estufa prevista no primeiro período do Protocolo de Kyoto.
Esses dados foram divulgados ontem, em Brasília, durante um seminário que reúne povos indígenas e populações tradicionais da Amazônia brasileira e de países vizinhos para discutir mudanças climáticas. Fazem parte de estudo do Instituto de Pesquisa da Amazônia (Ipam) com a Universidade de Minas Gerais e o Woods Hole Research Center. "Fica evidente o papel que eles têm na preservação das florestas e na proteção deste grande estoque de carbono", diz Paulo Moutinho, coordenador de pesquisas do Ipam.
O que se discute é REDD, a sigla para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação, que define um mecanismo para evitar a emissão de carbono que acontece nas queimadas e derrubadas de florestas. REDD tem sido discutido nas reuniões internacionais que antecedem à 15ª Conferência do Clima das Nações Unidas em dezembro, em Copenhague. "O grande risco do REDD é ficar no varejo, cada um com seu método e seu tipo de compensação, uma série de projetos com uma série de atores e política diversa sem respeito aos direitos das populações tradicionais", resume o pesquisador. A ideia do seminário é avançar no debate e chegar a Copenhague com um documento que enumere as propostas e os princípios de REDD de acordo com a visão dos povos da floresta. "REDD precisa ser de larga escala, com princípios de transparência e governabilidade", registra Moutinho.
"Estamos, nesse momento, com todas as calhas maiores de rios do Estado do Amazonas alagadas e com 20 mil famílias desabrigadas", diz Manoel Cunha, presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros. "Isto nunca aconteceu na história", continua, detectando o que considera o efeito das mudanças climáticas na Amazônia. O seminário, diz, pretende iniciar a construção de uma proposta de REDD para a floresta amazônica e discutir novas formas de usar os recursos naturais da região. "Hoje é mais fácil encontrar créditos para desmatar um hectare de floresta e criar gado que para conseguir financiamento para coletar castanha ou comprar um kit e extrair látex das seringueiras. Temos que mudar este cenário", diz Cunha.
Francisco Avelino Batista, conhecido como Chico Apurinã, líder da Coiab (entidade que representa 165 etnias) , registra que os povos indígenas estão sofrendo os efeitos do aquecimento global sem desmatar a floresta. "Nosso entendimento é discutir REDD de forma que se reconheça o trabalho que fazemos", diz.
REDD é uma palavra ampla, onde cabem muitas interpretações. A do governo brasileiro, por ora, é a de que as florestas devem participar dos mecanismos de negociação do regime climático, mas isso não significa negociar projetos de redução de emissão baseados em reduções futuras ou vinculados ao mercado de carbono. "Mas não há uma posição fechada", diz Thaís Juvenal, diretora do Serviço Florestal Brasileiro. O formato, hoje, é o do Fundo Amazônia, onde se captam recursos baseados na redução de emissões já evitadas. A sociedade civil faz parte do comitê orientador do Fundo e discute a aplicação de seus recursos.
(Por Daniela Chiaretti, Valor Econômico, 12/05/2009)