Primeiro, veio o credit crunch, a crise mundial de crédito; depois, a recessão que trouxe a reboque o eco crunch. Em meio ao pessimismo nos mercados, novos investimentos na indústria "verde" secaram e os preços do carbono despencaram. Na Europa, os certificados de carbono - permissões para poluir que são negociadas entre empresas de países ricos - caíram do pico de quase 24 euros em julho do ano passado para pouco mais de 7 euros em fevereiro.
Diversos projetos de usinas de vento e solares foram suspensos, como ilustra a decisão da gigante Shell, anunciada em março, de suspender novos investimentos no setor de energias renováveis. "Normalmente, esses gastos costumam mesmo vir atrás das despesas econômicas normais dos governos, mas embora tenham sido registradas quedas acentuadas, não percebemos nenhuma grande mudança na postura positiva dos Estados Unidos e da Europa", afirmou à BBC Brasil James Thompson, diretor-financeiro da EcoSecurities, empresa de compra e venda de certificados de emissão de carbono e investimentos em projetos de energia limpa.
Recuperação
Até o primeiro trimestre de 2009, todos os sinais eram negativos, mas, pelo menos no mercado de carbono, o panorama já pode estar mudando. Segundo analistas da New Carbon Finance, uma consultoria especializada em análises do mercado de carbono e energias limpas. A redução na atividade industrial com a recessão - que por sua vez levou à redução na procura por créditos de carbono - aliada à necessidade de liquidez das empresas por causa da crise de crédito provocou baixas recorde.
Mas no primeiro trimestre de 2009, segundo a a New Carbon Finance, o volume de operações subiu 37% comparado com o trimestre anterior. Ainda assim, a empresa identificou uma retração de 16% em comparação com o primeiro trimestre de 2008. Se esse é o começo do fim do eco crunch, ninguém se arrisca a dizer. Mas, pelo menos em dois dos maiores supermercados britânicos, Tesco e Sainsbury's, o consumidor não abandonou os produtos ecologicamente corretos por causa da crise.
Muito pelo contrário, de acordo com o Sainsbury's, os produtos da linha Fairtrade, licenciados por uma fundação criada para proteger os direitos de pequenos produtores em países do Terceiro Mundo, registraram alta de 50% entre 2008 e 2009. Reforçando avaliações mais otimistas para o setor, um relatório do banco HSBC mostra que realmente essa crise pode ter um final diferente.
Pacotes
O levantamento do banco estima que cerca de 15% do total de US$ 2,8 trilhões prometido em incentivos fiscais e investimentos previstos nos pacotes de recuperação econômica em vários países vai ser destinado a projetos relacionados ao combate às mudanças climáticas. Em alguns países, o relatório identifica uma porcentagem significativa do total investida no setor: a China, por exemplo, deve dedicar 38% à área verde. Na Coreia do Sul, a fatia "verde"dos incentivos fiscais chega a 80% do total.
No pacote de US$ 787 bilhões anunciado pelo presidente americano, Barack Obama, o relatório do HSBC calcula que US$ 112 bi, 12% do total, devem ser destinados a projetos de energia limpa, eficiência energética, malha elétrica e outros setores vitais para o combate ao aquecimento global. Há cerca de um mês, o Japão anunciou um pacote verde de US$ 102 bilhões, anunciando entre outras medidas, investimentos para iniciar a produção em série de automóveis elétricos em três anos. Esses investimentos, para alguns, não representam apenas um acerto de contas com o meio ambiente, mas também podem incentivar a economia como um todo.
O político trabalhista britânico Michael Meacher escreveu recentemente que o mundo está diante de um triple crunch, uma crise tripla: de energia, climática e econômica. Para ele, a "descarbonização" da economia global deve ser um peça-chave na solução dessa "crise tripla" e pode ganhar um impulso definitivo nas decisões que serão tomadas em dezembro, em Copenhague, onde um novo tratado deve ser elaborado para substituir o Protocolo de Kyoto.
(Estadao.com.br / AmbienteBrasil, 12/05/2009)