Incra revela que áreas de reforma agrária foram responsáveis por 21% do desmate. Relatório do órgão aponta que 869 assentamentos na Amazônia Legal derrubaram 251,6 mil hectares, 51,3% deles no PA e 22,1% em MT
Um grupo de 60 assentamentos concentrou no ano passado metade do desmatamento registrado nas 2.546 áreas de reforma agrária da Amazônia Legal, região formada pelos Estados do Norte, Mato Grosso e parte do Maranhão. Essa densidade na derrubada da floresta aparece em relatório do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) recém-concluído com auxílio de dados do Ibama e do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Segundo o documento, 869 assentamentos (34% do total) contribuíram com o desmate no ano passado. Nessas áreas, foram derrubados 251,6 mil hectares, sendo 126,1 mil hectares (50,1%) no grupo de 60 assentamentos (2% do total).
Em tese áreas federais autônomas, os projetos de reforma agrária não conseguem barrar a cultura do desmatamento de certas regiões. Do total derrubado nos 60 assentamentos, 65% ocorreram no Pará ou em Mato Grosso -dois Estados que lideram o ranking geral de desmatamento do Inpe. "Isso é resultado da insistência do Incra de criar assentamentos em áreas de floresta, onde as famílias não têm outra alternativa, a não ser ficar reféns do madeireiros", afirma José Batista Afonso, da coordenação da CPT (Comissão Pastoral da Terra) e advogado da entidade em Marabá (PA).
O relatório do Incra revela que os assentamentos contribuíram no ano passado com 21% do total desmatado na Amazônia Legal. Foram 251,6 mil hectares, contra 221,6 mil hectares no ano anterior. Nessa região, os assentamentos representam cerca de 8% da área. "O desmatamento não respeita assentamento, unidades de conservação, parques nacionais, áreas indígenas. Ele avança em cima de tudo isso", declara Celso Lacerda, diretor de Implantação de Projetos de Assentamento do Incra.
Essa visão oficial, porém, é contestada por Adalberto Veríssimo, pesquisador da ONG Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia). Segundo ele, o desmatamento ocorre com mais intensidade nos assentamentos, e não em terras indígenas e unidades de conservação. "Tem um coquetel explosivo: pecuarização, agricultura, além do efeito da exploração predatória da madeira e do carvão. Tudo isso dentro dos assentamentos. Fazer assentamentos em regiões de florestas é pedir para desmatar", disse Veríssimo. "Eles [os assentados] acabam assediados pela dinâmica do desmatamento", completa.
Concentração de lotes
Do total desmatado nos 869 assentamentos, 51,3% estão no Pará, seguido de MT (22,1%). Os dados usados no levantamento são do Prodes (Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal), do Inpe, com imagens da floresta captadas por satélite de agosto de 2007 a julho de 2008. Segundo o Incra, o avanço do desmatamento em áreas de reforma agrária ocorre em meio a um processo de concentração dos lotes, ou seja, quando uma única pessoa compra irregularmente lotes dos assentados para ampliar sua propriedade.
No final do ano passado, o Ministério do Meio Ambiente divulgou uma lista que incluiu oito assentamentos entre os cem maiores desmatadores do país. Na ocasião, a ala agrária do governo criticou a metodologia do estudo, que não dividiu o total desmatado nos projetos pelo número de assentados. Para amenizar os efeitos da motosserra, o Incra fechou um acordo com o Inpe para que as imagens de satélite sejam monitoradas em intervalos mais curtos.
(Por Eduardo Scolese, Folha de S. Paulo, 11/05/2009)