A fuligem que sai dos escapamentos, das usinas termelétricas e das queimadas florestais responde por aproximadamente um terço do aquecimento global líquido. Amenizar o calor que ameaça ecossistemas e a biodiversidade, portanto, pode ser mais fácil e mais barato do que se imagina, afirmam pesquisadores. Novas estimativas, feitas por vários grupos de pesquisa, estimam a importância de controlar o chamado carbono negro, fruto de qualquer processo de combustão.
A fuligem integra a classe dos aerossóis, partículas cujo papel no aquecimento e no resfriamento do planeta durante o século 20 é uma das principais incertezas do relatório do IPCC, o painel do clima da ONU. Agora os pesquisadores começam a diminuir essa incerteza. Em São Paulo, a maior fonte desse poluente é a frota de ônibus a diesel", diz Paulo Artaxo, físico da USP (Universidade de São Paulo), e membro do IPCC.
Nas contas feitas pela equipe do cientista, a capital paulista tem 20 vezes mais carbono negro em suspensão na sua atmosfera do que a Amazônia, com todas as suas queimadas. Retirar esse tipo de carbono é bom para o clima e para a saúde das pessoas." O que reforça a importância, diz Artaxo, de que exista vontade política para começar a melhorar o ar dos grandes centros urbanos.
Duas vezes mais rápido
Segundo o engenheiro ambiental Mark Jacobson, da Universidade Stanford (EUA), o controle do carbono negro, em uma década, pode frear o aquecimento global até duas vezes mais rápido do que a redução do gás carbônico. Mas essa redução, ressalta, será apenas temporária se não vier acompanhada de um corte efetivo nas emissões de CO2. Este, no longo prazo, continua sendo o maior responsável pelo aquecimento global. Mas o carbono negro é o segundo, um pouco à frente do metano. "A redução da fuligem sozinha pode eliminar um terço do aquecimento global líquido", afirmou Jacobson à Folha. O carbono negro também tem um efeito resfriador, pois ajuda a "semear" nuvens, que refletem a radiação para o espaço.
Em 2007, o pesquisador apresentou um plano ousado ao Congresso dos EUA. Pelas contas do cientista, é teoricamente factível construir e instalar 122 mil turbinas eólicas para movimentar toda a frota veicular do país por eletricidade. O esforço, no entanto, demandaria "apenas" trocar toda a frota americana por veículos elétricos a hidrogênio. Essa ação, diz Jacobson, reduziria em aproximadamente 7% ao ano o impacto antrópico (causado por atividades humanas) sobre o aquecimento global. O cientista, claro, não calculou custos nem deu prazo para a troca.
No caso brasileiro, diz Artaxo, nem mesmo o carro a álcool está livre de emitir fuligem sufocante. "Toda combustão lança carbono negro no ar. O motor a álcool emite menos. O carro a gasolina, dez vezes mais, e o a diesel, cem vezes mais do que o a gasolina", diz o físico. Valores mais precisos dependem do tipo exato de veículo e o combustível colocado para encher o tanque.
Enquanto os cientistas refinam o impacto global do carbono negro, no Ártico, os dados estão mais consolidados. Estudo da Nasa publicado em abril, na revista "Nature Geoscience", mostra que o poluente respondeu por 50% do aquecimento entre 1890 e 2007. Nesse período, os termômetros subiram, em média, 1,9ºC naquela região. Na neve está o outro efeito perverso do carbono negro. A fuligem negra sobre ela também absorve calor, acelerando o derretimento do gelo.
(Por Eduardo Geraque, Folha Online, 10/05/2009)