Líderes indígenas, que participam do 6º Acampamento Terra Livre, pediram a rejeição da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 38/99, do senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), que inclui entre as competências do Senado a aprovação de demarcações de terras indígenas (as TIs). A proposta, que tramita em conjunto com a PEC 3/99, do ex-senador Juvêncio da Fonseca, teve pedido de vista pelo senador Aloizio Mercadante (PT-SP) e aguarda votação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Na justificativa da proposta, Mozarildo salienta que as áreas destinadas a demarcação são desproporcionais às populações indígenas a que se destinam. "Algumas unidades da Federação veem comprometido o seu processo de desenvolvimento, em decorrência da redução de vasta área de sua superfície que poderia ser destinada à atividade econômica".
Os líderes indígenas, que participaram nesta quinta-feira (07/05) de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), requerida pela senadora Marina Silva (PT-AC), pediram ainda a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas e da proposta que institui o Conselho Nacional de Política Indigenista. As propostas resultam de discussões realizadas no Acampamento Terra Livre, com mais de mil indígenas, que representam 130 povos indígenas de todo o país. O evento - que é realizado anualmente na Esplanada dos Ministérios, em Brasília - teve início na segunda-feira (4) e se encerra nesta sexta-feira (8).
O líder tuxá, Sandro Hawaty - representante dos povos indígenas de Minas Gerais, Espírito Santo, Paraíba, Sergipe, Bahia, Ceará e Pernambuco - ressaltou que, se os indígenas não tiverem garantido o direito ao território em que vivem, poderão morrer como povo. Para ele, a PEC de Mozarildo "é indigna" e trata-se de "etnocídio e genocídio" contra esses brasileiros. O presidente da CDH, senador Cristovam Buarque (PDT-DF), sugeriu que líderes indígenas estejam em contato com a comissão de forma permanente para acompanhar o andamento de suas reivindicações. O senador também sugeriu alteração na Constituição para permitir que haja representantes dos povos indígenas no Congresso Nacional.
Já o senador João Pedro (PT-AM) recomendou que membros da CDH se reúnam com o presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, para pedir prioridade na tramitação do Estatuto dos Povos Indígenas, que tramita naquela Casa. O senador João Pedro intermediou a entrada pacífica de centenas de indígenas nas dependências do Senado, quando deveriam participar da audiência apenas cinco líderes. Para evitar equívocos como o ocorrido no ingresso dos indígenas na audiência, o senador Cristovam pediu que a Casa insira em sua agenda a recepção dos índios em todas as edições do Acampamento da Terra Livre. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) disse desejar que todas as etnias vivam juntos em fraternidade, desde o Alasca até a América do Sul.
Denúncias
Representantes de diversas etnias de todo o país denunciaram à CDH que enfrentam problemas de violência, invasões, humilhação e desrespeito a seus direitos como cidadão brasileiros. Também abordaram questões relacionadas à saúde, como vacinação das crianças indígenas; à proteção ambiental; à educação; e às dificuldades enfrentadas pelos índios portadores de deficiência. O líder terena, Lisio Lili, afirmou que André Puccinelli, governador de Mato Grosso do Sul, onde se localiza a comunidade, persegue os índios por ser contrário à ampliação dos seus territórios. O líder pediu a intervenção dos senadores para que o governador compreenda a situação e receba os indígenas que querem apresentar suas reivindicações.
Para Lisio, muitos parlamentares representam os interesses dos latifundiários matogrossenses do agronegócio. Ele disse que as demandas dos índios não são defendidas nos parlamentos municipais, estaduais e federal, por não haver representantes dessa parcela da população nesses colegiados, apesar de o Brasil adotar uma democracia representativa. Ele defendeu a criação de um parlamento indígena no qual possam expor suas necessidades e propostas.
A representante do povo Guarani Kaiowá, de Mato Grosso do Sul, Lea Aquino, pediu que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue com urgência a demarcação das terras indígenas. Ela disse que seus territórios estão sendo utilizados para a criação de gado e as comunidades indígenas são obrigadas a viver em áreas reduzidas. Sua comunidade, contou, composta por cerca de 1.500 pessoas, vive em oito hectares de terra, o que ela considera insuficiente para que a cultura indígena seja desenvolvida em sua plenitude.
Os indígenas devem ser consultados antes da realização das obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), como construção de estradas e de hidrelétricas, defendeu Marcos Apurinã, líder da Articulação dos Povos Indígenas do Pantanal (Arpipan). Em sua avaliação, as comunidades indígenas fazem a preservação ambiental, enquanto as obras estão destruindo as terras indígenas. Ele também disse que os líderes indígenas não concordam com a compra, pelo governo federal, de terras a serem destinadas a eles. Os indígenas, afirmou, querem viver na terra onde estão enterrados seus líderes.
Os indígenas não são respeitados, disse Romancil Kretã, líder da etnia kaigang, localizada no Sul do Brasil, por não serem conhecidos. Ele defendeu o ensino da cultura indígena, em sua diversidade e especificidades, às crianças e jovens brasileiros.
(Por Iara Farias Borges, Agência Senado, 07/05/2009)