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éter dimetílico gas de cozinha diesel
2009-05-08

Surge no horizonte dos combustíveis renováveis uma alternativa para substituir parte do óleo diesel e do gás liquefeito de petróleo (GLP) usado em botijões. Conhecido dos químicos pelo nome de éter dimetílico e pela sigla DME, do inglês dimethyl ether, esse gás é usado pela indústria desde a década de 1960 como propelente em aerossóis de cosméticos, medicamentos, inseticidas e tintas. Ele é produzido a partir do metanol, que, por sua vez, é fabricado com gás natural ou carvão mineral. É considerado um bom substituto de combustíveis derivados do petróleo porque polui menos e tem como atrativo o fato de também poder ser produzido de biomassa, o BioDME, especialmente com resíduos agrícolas da produção de milho, cana-de-açúcar (palha e bagaço) e casca de arroz, além de restos da fabricação de papel.

Para transformar biomassa em DME é preciso converter os resíduos vegetais em gás num processo chamado de gaseificação realizado num reator aquecido. O resultado é o gás de síntese, uma mistura de monóxido de carbono (CO) e hidrogênio, que serve de matéria-prima para a produção do metanol, passo intermediário para se atingir a produção do éter dimetílico. Mais difundido na China, onde é utilizado puro e misturado ao GLP, o DME começa também a merecer atenção no Brasil, como demonstra um estudo realizado no Rio de Janeiro sob a coordenação do Instituto Nacional de Tecnologia (INT), do Ministério de Ciência e Tecnologia, e do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento (Cenpes) da Petrobras.

A pesquisa resultou num processo de produção de DME que elimina a etapa do metanol, passando direto do gás de síntese para o éter dimetílico. Para realizar essa modificação, os pesquisadores escolheram e adicionaram ao processo dois catalisadores, que são substâncias promotoras da reação. “Com a mistura física desses dois catalisadores ao gás de síntese num reator conseguimos eliminar a etapa do metanol”, diz a engenheira química Lucia Gorenstin Appel, pesquisadora do INT e coordenadora do projeto. A nova rota tecnológica já foi transformada em pedido de patente depositado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial. Falta agora uma avaliação econômica da viabilidade de produção de BioDME no país, estudo que provavelmente será realizado neste ano pelo mesmo grupo de pesquisadores.

“O BioDME feito de rejeitos da agricultura é uma alternativa para o Brasil também porque ele não gera particulados [fuligem] e tem índice de emissão de enxofre zero, o que é uma vantagem ambiental em relação ao diesel”, diz o engenheiro químico Eduardo Falabella Souza-Aguiar, coordenador da célula GTL, sigla de gas to liquids, ou combustíveis de gás para líquido, da Petrobras. Falabella também é professor da Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o principal idealizador da produção de DME no Brasil. Ele gerencia na empresa a área que desenvolve tecnologia para transformar, por exemplo, gás natural em diesel, um projeto para 2012 ou 2013. “Nesse momento estudamos a melhor forma de fazer a gaseificação da biomassa para gerar o DME”, diz Falabella.

Com a vantagem de ser produzido a partir de várias matérias-primas e por diferentes processos, o DME também apresenta, além da inexistência do óxido de enxofre e fuligem, baixos índices de emissões de dióxido de carbono (CO2) e óxidos de nitrogênio (NOx) em até 90% menor que o encontrado no diesel. Esses gases contribuem de forma significativa para a poluição das grandes cidades e para o aquecimento global. Análises toxicológicas e ambientais realizadas pelas empresas Akzo Nobel, da Holanda, e a norte-americana Du Pont, maiores fabricantes de DME para aerossóis, junto com a Mitsubishi, do Japão, mostraram que ele não afeta a atmosfera do planeta, podendo ser usado como substituto dos clorofluorcarbonos ( CFCs), substâncias que destroem a camada de ozônio.

Outra facilidade do éter dimetílico é a possibilidade de ser transformado em líquido. “Com uma pressão em torno de 6 atmosferas, que é baixa, é possível liquefazer o DME”, diz Lucia. “Isso pode trazer mais uma opção para o transporte de gás natural de regiões remotas como, por exemplo, a Amazônia, transformando esse gás em DME e podendo transportá-lo por caminhão ou navio.” O uso mais imediato e utilizado do DME é na substituição do GLP. Embora tenha menor poder calorífico e produza energia em quantidade inferior ao GLP, em torno de 18%, na China as expe­riências são positivas.

Na forma isolada para cozimento de alimentos não foram relatados problemas com segurança ou corrosão nos fogões que passaram por pequenas adaptações técnicas. Em outra situação também utilizada pelos chineses, a mistura de 20% de DME ao GLP, o uso não requer modificações técnicas nos fogões. Na substituição ao diesel, o motor também passa por adaptações, como foi demonstrado em outra experiência chinesa. Em fevereiro, dez ônibus movidos exclusivamente com DME passaram a circular na cidade de Xangai. Eles não expelem fumaça e fazem parte de um teste conjunto com outros combustíveis alternativos. Japão, Irã, Coreia, Rússia e Suécia têm projetos de estudo e utilização do éter dimetílico, além de empresas como a Volvo e a Nissan que já construíram caminhões com motores para esse gás.

Novo uso
O éter dimetílico começou a ser divulgado como combustível a partir de 1995, em um congresso promovido pela Sociedade de Engenheiros da Mobilidade, a SAE, da Society of Automotive Engineers, em Detroit, Estados Unidos, quando foram apresentadas as primeiras iniciativas que indicavam um futuro energético promissor para esse gás. Atualmente a pesquisa mundial em relação ao DME ainda considera o uso do éter dimetílico em turbinas a gás para gerar eletricidade e para ser um futuro provedor de células a combustível, equipamento que transforma hidrogênio em energia elétrica. A geração do hidrogênio a partir do DME poderá ser feita a baixas temperaturas por meio de uma técnica chamada reforma a vapor, com vantagens sobre o gás natural que exige processos industriais com altas temperaturas.

No estudo brasileiro coordenado por Lucia também participaram mais dez pesquisadores do Instituto Militar de Engenharia (IME), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e UFRJ, além do Cenpes e do INT. O trabalho teve financiamento da Petrobras e do Fundo Setorial do Petróleo, por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) num valor de R$ 895 mil, e foi objeto de premiação no Prêmio Nacional de Tecnologia 2008 da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim). O vencedor na categoria Pesquisador foi Eduardo Falabella, da Petrobras.

(Por Marcos de Oliveira, Pesquisa Fapesp Online, 06/05/2009)


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