Foram vários leilões sem sucesso. O terreno estava avaliado em R$ 12 milhões, mas por estar numa área com limitação para a construção de prédios, não atraia interessados. Em 2006, no quinto leilão, foi arrematado pela SVB–Participações e Empreendimentos Ltda, com sede na av. Nilo Peçanha, em Porto Alegre. A empresa pagou R$ 7,2 milhões pela área, dando 20% do valor de entrada e o restante em 15 parcelas mensais. Em seguida, transferiu-a para a BM Par Empreendimentos Ltda, cujo representante disse à imprensa que não tinha negócios no setor de construção. Cogitou-se até que seria uma subsidiária do grupo Maggi, do bilionário governador de Goiás, Blairo Maggi.
O terreno está registrado no Cartório de Imóveis como propriedade da BM Par, mas com hipoteca à Expand Investimentos Imobiliários, com sede no Rio de Janeiro. A Expand é uma subsidiária da Cyrela Brazil Realty S.A. que, por sua vez, tem uma joint venture com a empresa gaúcha Goldsztein, a Cyrela Goldsztein. Em nota à jornalista Glorinha Glock, a assessoria da Goldsztein Cyrela confirmou sua participação no negócio: “A Goldsztein Cyrela, joint venture da Cyrela Brazil Realty, investirá no projeto desde que ele esteja de acordo com a lei municipal, seja viável e aprovado em todas as esferas pertinentes”.
O projeto, na verdade um pré-estudo do arquiteto Jorge Debiagi, prevê implantar um conjunto arquitetônico com seis edifícios de 14 andares (quatro residenciais e dois comerciais), além de áreas de lazer, parque público, passeios, píer e uma marina pública. Prevê um investimento de R$ 165 milhões, que pode alavancar negócios da ordem de R$ 2 bilhões.
Negócio vai a R$ 1 bilhão, diz IAB
Em agosto de 2008, quando esquentava a discussão sobre o “Pontal do Estaleiro”, o Instituto de Arquitetos do Brasil/RS por decisão de seu Conselho Estadual, divulgou uma “Manifestação aos Vereadores” para “expor sua contrariedade com a forma pela qual o assunto está sendo tratado”. O Instituto, que representa arquitetos e urbanistas no Rio Grande do Sul alertou para “erros no encaminhamento da matéria” e para os possíveis “prejuízos ao desenvolvimento urbano da cidade, decorrentes de uma alteração de regulamentação urbana que não deriva de uma proposição integrada de valorização de seu potencial turístico e urbanístico”.
“Flagrantemente, a alteração do projeto foi apresentado a partir do interesse dos proprietários da área, sem que os benefícios para a comunidade e para a municipalidade seja devidamente explicitados”, diz a nota. Segundo o IAB a mudança pretendida iria “ permitir um uso muito mais intenso da área, não previsto no Plano Diretor de Porto Alegre, à revelia de um estudo mais criterioso do Executivo Municipal e de uma ampla discussão pública sobre a densificação da área”.
Além dos aspectos legais, o Instituto lembra o “aspecto moral da apreciação de uma matéria com o impacto imenso(…) de maneira apressada (…) confundindo o interesse público com um negócio privado”. Diz ainda a nota que a área “foi leiloada a baixo preço porque o seu valor era limitado ao dos usos compatíveis com o desenvolvimento projetado no PDDUA. A proposta de alteração somente surge após um projeto de ocupação patrocinado pelos proprietários, sem compatibilidade com as possibilidades da infra-estrutura de transito da região e em prejuízo da paisagem e do potencial turístico de Porto Alegre”.
“O espetacular aumento do potencial construtivo permite estimar o futuro valor total do negócio em quase um bilhão de reais, o que reduz o preço do terreno, que normalmente é um dos mais significativos itens em qualquer operação imobiliária, a uma insignificância”. “O IAB-RS questiona qual o ganho do Município de Porto Alegre quando o seu legislativo presenteia em plena época eleitoral a um grupo privado com a alteração de valor tão significativa de um imóvel adquirido recentemente num singular processo de venda”.
“A Orla do Lago Guaíba é o maior patrimônio paisagístico natural e cultural da Cidade de Porto Alegre, e sua ocupação deve ser criteriosa em respeito ao direito das futuras gerações a desfrutarem de um desenvolvimento ambientalmente coerente e com qualidade. O processo ora examinado não garante isto. Ao contrário, a alta densidade proposta é ameaçadora se considerarmos outros investimentos previstos nas adjacências que poderão gerar impactos consideráveis e prejudicar o desenvolvimento da Zona Sul de Porto Alegre”.
“Concluímos lembrando aos nobres Vereadores e à sociedade porto-alegrense que a requalificação da orla de Porto Alegre é uma das bandeiras históricas do IAB-RS que já empreendeu grandes esforços na promoção de ações concretas neste sentido. Em nome dessa história e do interesse público, e tendo em vista a argumentação apresentada, solicitamos aos Srs. Vereadores o voto contrário à alteração proposta à Lei Complementar 470/02”.
(Por Elmar Bones, Jornal JÁ,, 08/05/2009)