Celebramos a Páscoa, nosso rito mor de transição, de transformação e de iniciação, transição da Antiga à Nova Aliança, transformação do homem velho em homem novo e iniciação na vida nova de discípulos-missionários de Jesus Cristo. Neste rito de Páscoa – passagem celebramos a ruptura com estruturas escravizantes de pecado e a conversão pessoal; celebramos a superação dos desejos de querermos voltar às “panelas do Egito” e acomodações deprimentes; celebramos a passagem pelo deserto, a presença de Deus – “coluna de nuvem” de dia, “coluna de fogo” à noite – “para mostrar o caminho” (Ex 13,21) nessa travessia; celebramos a aliança de Deus com o seu povo – “Sereis para mim uma porção escolhida (…) é minha toda a terra” (Ex 19,5) que chega a seu ápice na “nova e eterna aliança” ratificada pelo Sangue de Cristo; celebramos o dom da Lei – “Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração (…)” (Dt 6,4-5) “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lv 19,18) – em meio a grandes angústias, medos da transformação e crises, que culmina no testamento de Jesus, o novo mandamento “Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34); celebramos a chegada na terra prometida, terra de promessa (cf. Ex 3,8), de comprovação e de novos desafios que alcançará sua forma definitiva no “céu novo” e na “nova terra”, onde “a morte não existirá mais, e não haverá mais luto, nem grito, nem dor” (Ap 21,4); celebramos assim a vitória da vida sobre a morte, o triunfo da graça sobre o pecado, da paz sobre a guerra, do amor sobre o ódio, da justiça sobre a violência e arbitrariedade, da fraternidade solidária entre os filhos e filhas de Deus sobre todos os mecanismos de exclusão e discriminação.
Professamos tudo isso, quando do fundo de nossa alma cantamos o Aleluia pascal e exclamamos: “Realmente, o Senhor ressuscitou” (Lc 24,34). Com os povos indígenas de Roraima, nós – como Igreja local de Roraima, como CNBB, como CIMI, como Igreja “kaq olon” – passamos por tudo isso. A marcha pelo deserto foi longa, os sofrimentos foram grandes e muitos.
Participamos dessa luta pelo território Raposa Serra do Sol por mais de 30 anos com a nossa pastoral de presença evangélica e anúncio profético, através de articulações com outros setores da sociedade brasileira e internacional, com o apoio jurídico e logístico que a Igreja prestou ao Conselho Indígena de Roraima (CIR), organização local dos povos indígenas, que com perseverança e grande maturidade soube resistir às provocações permanentes daqueles que se apropriaram de seu território. Declaro-lhes hoje, caros irmãos bispos, com grande alegria e não sem profunda emoção que, com a decisão do Supremo Tribunal Federal do dia 20 de março de 2009, a terra escravizada dos povos indígenas Macuxi, Wapixana, Patamona, Ingarikó e Taurepang se tornou terra livre, terra judicialmente libertada.
É claro, que a alegria de um filho sobre a conquista de seu território não nos faz esquecer o sofrimento e a injustiça aos quais os outros estão sendo submetidos. Às vezes há um descompasso entre a vitória em um e em outro caso e no andamento da causa em seu conjunto.
Situação dos Indígenas no Brasil
Em outubro do ano passado a Constituição Federal completou 20 anos. Rompendo com cinco séculos de visão etnocêntrica, a atual Constituição Brasileira passou a reconhecer os povos indígenas como portadores de organização social própria, usos, costumes, tradições, línguas maternas e processos próprios de aprendizagem que deveriam dali em diante receber a atenção respeitosa da sociedade e a proteção do Estado Brasileiro.
Já que a terra é a base fundamental para a manutenção da identidade e reprodução sócio-cultural indígenas. A Constituição fez destinar aos povos indígenas, entre outras garantias, duas formas básicas de direitos territoriais:
1 – São reconhecidos como “originários” e “imprescritíveis” os direitos de “posse permanente” e “usufruto exclusivo” das riquezas naturais existentes no solo, rios e lagos das suas “terras de ocupação tradicional.” (Constituição Federal/88 art. 231, caput e §§ 2.° e 4.°).
2 – A União Federal se incumbe do dever de demarcar tais terras conforme os limites tradicionais, ou seja, de acordo com seus usos, costumes e tradições (Constituição Federal/88 art. 231, caput).
Este reconhecimento constitucional dos direitos originários dos povos indígenas às suas terras, e a determinação de sua demarcação segundo seus usos, costumes e tradições, garante a continuidade de sua existência enquanto povos étnica e culturalmente diversos entre si e da sociedade nacional brasileira.
Lamentamos contudo que até hoje o novo Estatuto para os Povos Indígenas não foi aprovado pelo Congresso Nacional. A Lei n.º 6.001/73 (Estatuto do Índio) foi superada pelo advento da Constituição Federal de 1988 e aguarda há quase duas décadas a reformulação de seu texto. O processo teve início em 1991 e 1992, através de três Projetos de Lei enviados à Câmara. Após ampla discussão de setores representativos foi aprovado o Substitutivo do Relator da Comissão Especial criada para analisar a matéria, mas em 1994, já prestes de seguir para o Senado, uma manobra regimental orientada pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso paralisou os trabalhos.
Todos os esforços dos Povos e Organizações indígenas junto à Câmara Federal, visando a retomada do andamento do projeto (Substitutivo ao Projeto Lei 2057/91) foram inúteis, até que, às vésperas das comemorações dos 500 Anos do “Descobrimento” e da Conferência Indígena 2000, em Santa Cruz de Cabrália – BA, o próprio Governo anunciou a intenção de agilizar a tramitação. Apresentou, no entanto, uma proposta alternativa, de conteúdo então desconhecido, instigando destarte o movimento indígena a reivindicar um tempo maior para inteirar-se da proposta e tomar posição.
Mais nove anos passaram até ser retomada a discussão do novo Estatuto dos Povos Indígenas, agora em decorrência do Projeto de Lei 1610/96 que trata de Mineração em Terras Indígenas. O Governo apresentou emendas e o movimento indígena reagiu impondo como condição para discutir a mineração que esse tema seja considerado um capítulo dentro do texto do Projeto de Lei do Estatuto. O Governo concordou e várias oficinas regionais foram realizadas. O texto agora se encontra em fase de conclusão e deverá ser submetido à aprovação da plenária indígena no próximo mês de maio. Contudo, há divergências explicitas entre o movimento indígena, seus apoiadores e o Governo em relação a alguns temas, especialmente em relação às condições específicas para a exploração mineral em terras indígenas e a utilização de recursos hídricos.
A questão das Terras
Esperávamos que com a promulgação da Constituição Federal em 5 de outubro de 1988, o Governo Federal se tornasse mais ágil e diligente na sua tarefa de proteger os direitos originários de posse e usufruto indígenas e de cumprir com o dever de demarcação daquelas terras. Verificamos, no entanto, ao longo destes 20 anos, uma enorme distância entre o espírito da Lei Maior e a prática do Poder público.
O longo e tortuoso processo pela demarcação da terra Raposa Serra do Sol é paradigmático. Desde 9 de abril de 2008, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a operação Upatakon 3 do Governo Federal destinada à retirada dos invasores da terra indígena, inaugurou-se no Congresso e no Poder Executivo um novo capítulo da já tensa disputa de interesses econômicos e políticos sobre as terras indígenas. Com a decisão do Supremo Tribunal Federal, as atenções deslocaram-se para o Poder Judiciário.
Um grande embate travou-se no âmbito da Suprema Corte. De um lado encontraram-se os aliados dos povos indígenas, entre eles a Diocese de Roraima, a CNBB e o CIMI, do outro, os aliados dos rizicultores invasores, entre os quais o Governo do Estado de Roraima, parlamentares do mesmo Estado e a Confederação Nacional da Agricultura.
Duas vezes o julgamento foi paralisado. Mas, finalmente, em 20 de março deste ano, ao julgar improcedente a Petição nº. 3388, o Supremo Tribunal Federal – STF, confirmou a homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, nos limites e na forma contínua determinada pelo Ministro da Justiça e do Presidente da República. O STF refutou a tese alardeada por segmentos anti-indigenas que a demarcação de terras indígenas na faixa de fronteira atentaria contra soberania nacional e rejeitou ainda o clichê anacrônico e discriminatório defendido por alguns setores que a demarcação de terras indígenas constituiria um obstáculo e empecilho para o desenvolvimento, prejudicando as unidades federais que abrangem áreas indígenas em seu território.
Mesmo assim, o Supremo Tribunal Federal extrapolou o juizo solicitado pelos autores da Ação Popular e estabeleceu através de 19 condicionantes uma normatização para todos os procedimentos de demarcação de terras indígenas no País. Na prática, tais condicionantes podem ser entendidas como restrições de direitos e podem repercutir negativamente sobre as demarcações em curso e mais ainda sobre as futuras.
Segundo os registros do CIMI, do total de 846 terras, apenas 348 encontram-se com os procedimentos de demarcação totalmente concluídos. Em 213 casos a tramitação legal nem sequer foi iniciada. Muitos cenários são alarmantes.
Tragégia Guarani
A situação dos Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul é trágica e extremamente preocupante. Vivem confinados em pequenas parcelas de terra e sofrem todas as formas de violência e perseguição. Se não forem tomadas medidas imediatas, mais um genocídio chegará a se consumar em pleno século XXI apesar de todas as Leis em favor dos Povos Indígenas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos já completar sessenta anos. Mas a problemática em torno da terra indígena não se restringe ao Mato Grosso do Sul. Também nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste os conflitos com o latifúndio são de longa data.
Ao mesmo tempo precisamos dar-nos conta de que o fato de se atingir a etapa final do procedimento demarcatório não significa já a solução peremptória e definitiva para as terras indígenas no Brasil. Na realidade, apesar de todas as garantias constitucionais, a maioria das terras formalmente registradas na Sercretaria do Patrimônio da União – SPU permanece com sérios problemas de invasão.
Na região amazônica, as invasões das terras indígenas são geralmente motivadas pela cobiça de suas riquezas naturais – especialmente madeira e minérios. Além de restringir a plena ocupação indígena compromete-se sempre mais a integridade do meio-ambiente com sérias e irreversíveis consequências para as condições de vida e a sobrevivência daquelas comunidades.
Os grandes projetos de desenvolvimento que incidem sobre terras indígenas e são financiados pelo Governo causam sérios impactos ao meio-ambiente e transtornos para a vida dos povos atingidos. São projetos de transformação de leitos de rios em hidrovias, de construção de Usinas Hidrelétricas, de utilização de terras indígenas para a passagem de gasodutos, minerodutos e linhões de alta tensão.
Atualmente existem mais de 450 empreendimentos que afetam terras indígenas. Dentre estes destacam-se a Hidrelétrica do Estreito, nos Estados Tocantins e Maranhão, a Hidrelétrica de Belo Monte, no Xingu, no Estado do Pará, e a Transposição das águas do Rio São Francisco que na região Nordeste atinge 26 povos indígenas.
Dentro do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC – amplamente difundido pelo Governo e incensado como principal responsável pelo futuro avanço econômico do país, há 48 obras que afetam diretamente terras indígenas com o agravante que tanto nessas como nas outras obras não há a realização da Consulta Prévia em tempo hábil para os interessados, determinada pela Convenção 169 da OIT, que foi incorporada à legislação brasileira no ano de 2005.
Modelos de Desenvolvimento
Na realidade existem dois modelos de desenvolvimento, um a favor das grandes empresas e do agronegócio, exigindo capital e a concentração de terras para o cultivo de monoculturas. Este modelo considera a terra como mercadoria, destinada a compra ou venda, e explorável até a exaustão. Em seu conjunto, é orientado para a produção e exportação, concentrador de renda, visando lucros privados e resultados imediatos e muito agressivo ao meio-ambiente.
O outro modelo vê na terra o lar que Deus criou em que vivem os povos e convivem respeitosamente com a natureza, a flora e a fauna. A terra exerce uma função materna. Este modelo de desenvolvimento é orientado para a Vida, a paz, a preservação ambiental e o bem-estar da população local, dos pequenos agricultores, das comunidades tradicionais, dos povos indígenas. São dois projetos que estão em confronto: um a favor da terra para a Vida, o outro a favor da terra para o negócio.
Violações de direitos
Os direitos indígenas continuam sofrendo violações de toda ordem que vão desde atos de agressão à integridade física e liberdade dos indígenas até invasões de suas terras e atentados contra o seu patrimônio. No último Relatório de Violência contra povos indígenas, publicado em abril de 2008, e apresentado aqui em Itaici, durante a 46ª Assembléia Geral, o CIMI apresentou os números referentes aos anos de 2006 e 2007.
Do conjunto de registros, destaca-se o aumento assustador de assassinatos de indígenas, chegando a 92 vítimas em 2007. Desses casos, 53 ocorreram no Mato Grosso do Sul. Se somarmos as 48 vítimas de tentativa de assassinato e as 9 ameaças de morte, teremos o quadro dramático de 149 ocorrências em 2007. São em primeiro lugar os conflitos de terra que continuam a vítimar jovens, homens, mulheres e lideranças indígenas, especialmente no Mato Grosso do Sul, mas também no Maranhão, em Pernambuco, no sul da Bahia e em Roraima. Como assassinos e agressores são identificados tanto particulares como agentes do poder público.
O ataque praticado por policiais federais contra o povo indígena Tupinambá, no Estado da Bahia, no dia 23 de outubro de 2008 é emblemático. Numa verdadeira operação de guerra foram mobilizados 150 homens, 23 viaturas e dois helicópteros para efetuar a prisão do cacique Rosival, conhecido como Babau. Mais de 100 pessoas, entre elas crianças e mulheres, foram vitimas de violência física e terrorismo psicológico, além de terem suas casas, roças e seus veículos e instrumentos de trabalho destruídos.
Lamentavelmente esses indicadores devem se manter altos, pois dados preliminares que deverão integrar o próximo relatório revelam que durante o ano de 2008 pelo menos 53 indígenas foram assassinados em nove Estados do Brasil
Outra forma de violência contra os povos indígenas é a generalizada desassistência na área de saúde. A consequência é o agravamento do quadro de doenças. Segundo dados da própria Funai, publicados em março 2009, no Vale do Javari, 80% dos adultos e 15% das crianças estão contaminados com hepatite. Muitas regiões são infestadas por epidemias de malária. A população enfraquecida por estas doenças ainda se torna alvo de meningite, filária e tuberculose que infestam a área já causando vários óbitos, como denunciam os Marubo. Contudo, a Funasa não dispõe de um plano de vacinação ou tratamento e tem se recusado a entregar os exames feitos no início de 2007.
A forma mais esdrúxula de violência é a premeditada e programada estratégia de criminalizar, para não dizer demonizar as lutas indígenas. Em 2008, a Justiça Federal de Pernambuco condenou criminalmente 26 lideranças Xukuru, em decorrência da revolta que a tentativa de assassinato do cacique Marcos, provocou em fevereiro de 2003. Outras dezenas de lideranças Xukuru deverão ser julgadas pelas mesmas acusações e, ao que tudo indica, sofrerão a mesma sina de serem condenadas.
Esta realidade também não é restrita à jurisdição de Pernambuco, mas se repete em outros Estados como a Bahia, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. Em Mato Grosso do Sul se encontram mais de 100 indígenas presos em flagrante discordância com os dispositivos da Constituição Federal. Em todo o País há atualmente mais de 500 indígenas presos. Muitos são acusados de crimes que não cometeram, mas apesar de provas evidentes que atestam sua inocência, acabam de ser condenados para atender a interesses de grupos políticos e econômicos regionais.
Irmã Dorothy: a justiça que tarda
Sei que esperam também uma brevíssima comunicação sobre o caso dos assassinos da Ir. Dorothy e seus mandantes. A Irmã Dorothy Mae Stang, estadudinense, naturalizada brasileira, pertencia à Congregação das Irmãs de Notre Dame de Namur. Chegou na Prelazia do Xingu em 1982 e morreu assassinada em 12 de fevereiro de 2005 aos 73 anos de idade, no múnicípio de Anapu, a 140 km de Altamira. Defendeu as famílias de agricultores contra grileiros e madeireiros e lutou por projetos de colonização que respeitem a dinâmica de uso sustentável da floresta.
Em 7 de abril de 2009 a Justiça anulou a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Moura, o Bida, decretou a sua prisão e determinou novos julgamentos para ele e para Rayfran Sales, o Fogoió. Em 23 de abril de 2009, o ministro Arnaldo Esteves Lima, do Superior Tribunal de justiça (STJ) decide soltar o fazendeiro Vitalmiro Moura e lhe concede o privilégio de aguardar outro julgamento em liberdade.
A cronologia dos trâmites na Justiça após o assassinato da Irmã Dorothy revela o seguinte quadro:
12.02.2005: Por volta das 7:30 da manhã a Irmã religiosa Dorothy Stang, é assassinada a queima-roupa no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) ”Esperança“ no município de Anapu, Pará;
11.12.2005: Rayfran Sales, o Fogoió, autor dos disparos, é condenado a 27 anos de prisão;
16.05.2007: O fazendeiro Vitalmiro Moura apontado como mandante do crime, é condenado a 30 anos;
22.10.2007: Rayfran Sales é submetido a novo julgamento e o tribunal do júri confirma a pena de 30 anos;
18.12.2007: O Tribunal de Justiça do Pará anula o segundo julgamento de Rayfran Sales;
06.05.2008: Vitalmiro Moura vai a novo julgamento e é absolvido pelo júri.
Assistimos pasmos a um espetáculo inusitado que macula profundamente a Justiça. Prende-se com alarido e depois, sem mais nem menos, um réu já condenado consegue de novo a liberdade. Vale ressaltar que o outro acusado de ser mandante do assassinato da Irmã, Regivaldo Pereira Galvão, o Taradão, após breve passagem pelo presídio Americano em Belém, encontra-se em liberdade desde junho de 2006 por decisão do Supremo Tribunal Federal. O consórcio do crime continua incôlume e os políticos, fazendeiros e madeireiros que prepararam todo o ambiente hostil contra a Irmã, chegando inclusive a declará-la ”persona não grata“, nem sequer foram inquiridos.
O assassinato da Irmã e o processo que tramita sem nenhuma previsão de conclusão, por um lado chama a atenção para a gravidade dos conflitos, a insegurança em que se encontram os pequenos agricultores, a total ausência de perspectivas para uma legião de famílias banidas do acesso a um pedaço de chão, onde pudessem plantar e colher para sobreviver e, ainda, as ameaças que os defensores dos direitos humanos continuam sofrendo. Igualmente revela a escandalosa morosidade, para não dizer a ausência ou então a conivência da Justiça que favorece a impunidade que continua a incrementar a espiral de violência que assola o País.
Ergue-se do solo da Amazônia o surdo clamor: a Justiça tem que funcionar e a impunidade precisa ser extirpada de uma vez por todas.
Conclusão
Em todos esses conflitos os povos indígenas e o CIMI, como organismo vinculado à CNBB, pedem o apoio corajoso e o amor compreensivo dos irmãos bispos. Peço perdão pelas falhas institucionais e pessoais do CIMI. Precisamos de mais missionárias e missionários que se dedicam à causa dos povos indígenas.
Aproveito a oportunidade para recomendar aos irmãos bispos o nosso Plano Pastoral, que saiu em sua segunda edição, enriquecido com oportunas referências ao Documento de Aparecida. Com muita gratidão quero parabenizar o Regional NE V da CNBB pela mesa redonda interdiocesana realizada entre os dias 23 e 25 de março de 2009, no Centro Diocesano de Pastoral de Barra do Corda. O objetivo do encontro foi avaliar a presença da Igreja junto aos povos indígenas do Maranhão e contribuir para a criação, em nível diocesano, de um trabalho de base nas aldeias indígenas. Recomendo a todas os regionais da CNBB semelhante iniciativa.
Por serem membros natos do CIMI, convido também os irmãos bispos, em cuja circunscrição eclesiástica existe a presença de povos indígenas, a participarem da XVIII Assembléia Geral do Conselho Indigenista Missionário, programada para 26 a 30 de outubro de 2009 no Centro de Formação Vicente Cañas, Luziânia, GO.
Agradeço de coração a todos que com generosidade e abnegação se dedicam à causa indígena como a uma causa do Reino, às missionárias e aos missionários do CIMI, às dioceses e suas e seus agentes de pastoral, às congregações religiosas, enfim, a todos que vivem “em estado de missão” (DA 213) e se empenham para que nossa Igreja se torne realmente morada de povos irmãos e assim também casa dos povos indígenas (cf. DA 8).
(Por Erwin Kräutler*, Cimi, 26/04/2009)
* Bispo do Xingu, Presidente do CIMI