"Nós produzimos um boi feliz", afirma José Carlos Thimoteo Lobreiro, proprietário da Fazenda Millenium, no Mato Grosso do Sul. A frase soa inusitada por partir de um pecuarista que cria gado de corte, mas parece ainda mais estranha quando se descobre que Thimoteo é um vegetariano. Ex-professor de patologia da reprodução na universidade federal do estado, o fazendeiro abandonou as técnicas tradicionais de criação de gado para adotar as ervas medicinais e a homeopatia como principal ferramenta de prevenção de doenças em seus rebanhos.
Sua opção por não comer carne, diz, não consiste em uma contradição. "É uma coisa absolutamente pessoal", afirma. "Fico feliz porque crio um produto de qualidade para pessoas que têm essa necessidade." Thimoteo, que é secretário da ABPO, ajudou a definir o sistema de saúde implantado nas fazendas da associação para que os bois ganhassem o selo do Instituto Biodinâmico, entidade que certifica a carne orgânica no país. Além de proibir uso preventivo de alopatia, a técnica veta o uso de hormônios de crescimento e de ureia para facilitar a digestão dos animais.
Marcelo Rondon, veterinário que está implantando um programa de auditoria interna nas fazendas da associação, porém, reconhece que a medicina alternativa ainda não dá conta de alguns problemas, sobretudo no caso de miíases, as bicheiras. "Se o animal está sofrendo muito ou correndo risco de morrer, eu faço uso de algum produto que pode ser um produto alopático", diz Rondon. O uso, porém, segue controle rígido. "Identifico o animal por número, o produto usado, a dosagem, e o motivo da aplicação."
A intenção, segundo o veterinário, não é apenas garantir a o bem estar do animal, mas evitar o abuso de antibióticos e substâncias que podem deixar resíduos na carne consumida. A "felicidade" do gado, porém, tem seu preço. Segundo o Friboi, uma peça nobre como uma picanha orgânica custa cerca de 30% mais em grandes redes de supermercado, principal ponto de venda do produto. Hambúrgueres orgânicos, contudo, já têm um preço que pode competir com a carne comum.
(Por Rafael Garcia*, Folha de S. Paulo, 03/05/2009)
* O repórter teve as despesas de viagem pagas pela ABPO e pelo WWF