Agentes dizem que operação conjunta de PF, Força Nacional e Funai tem de ser cautelosa; permanência de não índios casados com indígenas causa divergência
Dois dias após o fim do prazo legal (0h de quinta) para a saída dos não índios da Raposa/Serra do Sol, no nordeste de Roraima, indígenas já começam a ficar impacientes com o que consideram lentidão das retiradas. Membros do CIR (Conselho Indígena de Roraima) se reuniram neste sábado (02/05) para pressionar a Polícia Federal, a Força Nacional de Segurança e a Funai (Fundação Nacional do Índio) a acelerar o que chamam de operação de "desintrusão". Reclamam que, mesmo na vila Surumu, porta de entrada da área, ainda restam mais de dez não índios, mas que são casados com indígenas. Alguns, dizem, participaram de um tiroteio, em maio do ano passado, que terminou com nove membros do conselho feridos.
A Folha viu ao menos um dos detidos à época andando na vila, a poucos metros de um dos baleados. Não havia nenhum tipo de provocação direta. "Disseram que iam prender todo mundo, mas não cumpriram com a palavra. E ainda tem cachaça entrando", disse Martinho Souza, liderança do CIR. A questão da bebida alcoólica é essencial para a entidade, que vê nela um dos motivos para o aumento da violência na comunidade e o distanciamento de suas tradições culturais.
Líderes de diferentes regiões da terra tentariam, na noite de ontem, fazer uma nova reunião na Surumu -que o CIR quer rebatizar de "Comunidade do Barro", seu antigo nome. Segundo a cúpula da operação que faz a retirada determinada pelo STF -que deve ir até o fim deste mês-, o que está acontecendo é uma ação cautelosa, para evitar conflitos. Os não índios que ainda restam na área são apoiados pela Sodiur (Sociedade em Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima) e muitos são casados com mulheres desta organização.
Ontem, lideranças das duas entidades chegaram a ter uma discussão ríspida na vila. Um deles é Ryan Farias, morador de um conjunto de 12 casas construído com recursos da Prefeitura da Pacaraima (RR), quando o rizicultor Paulo César Quartiero era prefeito. "Medo, a gente não tem, não [de ser expulso]. Mas vamos para onde?", questionou.
Segundo ele e sua mulher, Sandra José, as autoridades federais já garantiram a continuidade desse tipo de casal na reserva. "Se formos embora, não vamos ter indenização, porque a casa é do governo." Para Osorito Ulisses, um dos coordenadores da Funai na área, essa questão deve ser discutida após a operação, e entre os próprios índios. Ontem, a movimentação na reserva era tranquila e nenhum caminhão foi visto deixando o local.
(Por João Carlos Magalhães, Folha de S. Paulo, 03/05/2009)