Os americanos não têm uma boa lembrança do surto de gripe suína que atingiu o país em 1976. A doença causou apenas duas centenas de casos e uma morte, mas a tentativa de contê-la acabou deixando 500 doentes e 25 mortos. O pânico começou em fevereiro, quando o recruta David Lewis, 18, passou mal e morreu no meio de um treinamento na base militar de Fort Dix, em Nova Jersey. Exames revelaram que a causa da morte era um vírus de influenza suína H1N1. Dias depois, médicos acharam mais dois casos.
As autoridades de saúde americanas entraram em pânico. Essa cepa de vírus, acreditava-se então, era a mesma que havia causado a pandemia de gripe espanhola de 1918, que matou cerca de meio milhão de americanos. David Sencer, diretor do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças), agência de vigilância epidemiológica americana, consultou infectologistas e decidiu que era necessário tomar medidas urgentes para evitar o pior.
Como o surto havia começado no fim do inverno (estação na qual a gripe ataca), a direção do CDC achava que uma campanha de vacinação em massa poderia proteger a população até o inverno seguinte. Estimava-se que uma epidemia de gripe suína poderia atingir entre 50 milhões e 60 milhões de pessoas nos EUA. Em março de 1976, o CDC pediu ao presidente Gerald Ford que aprovasse uma campanha de vacinação. Ford aquiesceu e pediu ao Congresso que aprovasse antes de abril US$ 135 milhões para a imunização.
A vacina ficou pronta no tempo esperado, e a imunização começou no dia 1º de outubro. E foi aí que as coisas começaram a dar errado. Ainda no começo do mês, começaram a surgir casos graves de reação à vacina. A imunização, descobriu-se, provocava um problema neurológico raro, a síndrome de Guillain-Barré, que causa perda de mielina (a "bainha" que envolve os nervos) e provoca paralisia facial e, em alguns casos, morte.
E as mortes vieram. As primeiras foram registradas em 12 de outubro. No começo de dezembro, o governo decidiu interromper a vacinação. Quarenta milhões de americanos, incluindo o presidente, haviam recebido a vacina. Estudos posteriores constataram que o vírus, mesmo que se espalhasse, jamais seria tão violento quanto o de 1918. A cura matou mais que a doença, num caso que voltou a ser discutido nos EUA nos últimos dias como um exemplo de como não agir.
(Folha de S. Paulo, 02/05/2009)