A maior parte desses sedimentos é despejada nas águas turvas da baía de Bengala. Mas uma descoberta acidental da população local pode indicar uma forma de Bangladesh dominar parte do rico lodo escuro do Himalaia para se proteger contra o aumento do nível do mar e melhorar a sua economia rural.Em vez de permitir que a lama assente onde quiser, Bangladesh começou a canalizá-la para onde é necessária -para preencher terrenos alagadiços ou para criar novas terras em seu longo e exposto litoral. Os esforços se limitam a pequenos trechos experimentais, não são uniformemente promissores, e ainda há ampla preocupação de que o mar, subindo, um dia poderia engolir parte do país. Mas vão aparecendo sinais de que uma nação que muitos consideram indefesa ante a destruição climática provocada pelo homem poderia literalmente se reerguer.
"Pode-se fazer muita coisa com a lama que esses rios trazem", afirmou Bea Ten Tusscher, embaixadora holandesa em Bangladesh. A Holanda, acostumada a dominar suas terras baixas pela engenharia, ajuda Bangladesh em projetos de gerenciamento hídrico. "Ela é como pequenos diamantes. É preciso usá-la." Céticos acham tolice esperar que o acúmulo de lama salve o país. Eles argumentam que tal acúmulo acontece lentamente, ao longo dos séculos. "Se você tiver tempo para esperar, ele acontece", disse Atiq Rahman, do Centro para os Estudos Avançados de Bangladesh. Seu país, acrescentou ele, não tem tempo para esperar.
O experimento de retenção de lodo produz melhorias tímidas, porém visíveis, em Beel Bhaina, área alagadiça de 240 hectares às margens do rio Hari, afluente do Ganges, a cerca de 90 quilômetros da baía de Bengala. Uma devastadora inundação há dez anos deixou esta bacia -"beel", em bengali- com um nível de água que superava a cabeça de Abdul Lateef. Nenhum arrozal podia ser cultivado, lembra Lateef, hoje com 56 anos. Casas ficaram submersas. O rio estava tão lamacento que quase não fluía.
Desesperados para drenar a água, Lateef e seus vizinhos furaram um buraco na borda de lama que circundava a bacia. A água saiu. E então a maré alta começou a empurrar sedimentos, e o terreno rapidamente se encheu de lama. Quando o engenheiro-chefe do departamento local de águas, Sheikh Nurul Ala, veio fazer medições, viu que em quatro anos Beel Bhaina havia subido até um metro. Hoje, é uma colcha de arrozais quadrados, verdes e cinzentos, entremeados por lagos também quadrados, onde há cultivo de peixes e camarões.
Esta engenharia simples de retenção da lama não foi pensada como uma adaptação contra a ascensão do mar, mas Ala está convencido de que ela pode oferecer alguma proteção. "Algum benefício ele irá trazer, eu acho, por elevar os 'beels'", afirmou. "O problema não será tão grave para a terra que possamos erguer."
(Por Somini Sengupta, The New York Times / Folha de S. Paulo, 27/04/2009)