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pesquisas genéticas pesquisa agropecuária
2009-04-24
Cientistas soletram os 22 mil genes do boi, com intenção de aprimorar pecuária de leite e de corte. "Aplicação é imediata", diz brasileiro que participou do estudo; DNA não vai ajudar com transgenia, e sim com cruzamentos planejados

A distância entre a picanha do churrasco dominical e os laboratórios de genética está menor. Cientistas publicam nesta sexta (24/04) o genoma do gado bovino. O estudo sai acompanhado de outro trabalho, que pode ser chamado de "mapa do churrasco" -que compara a diferença genômica de 19 raças comerciais- e poderá resultar, por exemplo, em bois com carne mais saborosa. Ou, então, em vacas com uma produção de leite ainda maior. Os dois estudos saem como destaque de capa na revista "Science". "Esses dados são para aplicação imediata", disse à Folha o veterinário José Fernando Garcia. O pesquisador da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Araçatuba é um dos coordenadores do consórcio internacional que soletrou os genes do gado bovino. Projeto que poderá produzir, provavelmente, animais que emitem menos gás metano, um dos vilões do aquecimento global.

Nos dois projetos -o do genoma começou há seis anos-, houve a participação de mais de 300 pesquisadores e dezenas de grupos de pesquisa, espalhados por 25 países. No Brasil, além da Unesp, assinam os estudos cientistas da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e da USP (Universidade de São Paulo).

O estudo trouxe resultados científicos importantes. Mostrou que genoma do gado tem 22 mil genes -80% deles também estão no homem- e que os ruminantes estão mais próximos dos humanos do que dos roedores. Mas o melhor, explica Garcia, é o uso que será feito dessa grande "lista telefônica" que acaba de ficar pronta. É a primeira vez que se faz um genoma de um animal que serve de alimento para o homem. O mapeamento das variações genéticas das 19 raças de gado bovino utilizou 50 mil pontos de variação no DNA. "É um verdadeiro pente fino que analisa todos esses pontos do DNA e compara com marcadores que já estão estudados e identificados", diz o pesquisador.

Na prática, a ligação entre laboratório e o campo segue um caminho próprio. Em um rebanho de vacas holandesas, por exemplo, o produtor sabe quais animais ficam menos doentes. Nesse caso, com a ferramenta genômica disponível agora, afirma Garcia, será possível saber o nome e o endereço do gene responsável por essa maior imunidade. Com esses dados, o trabalho de melhoramento genético por cruzamento -que é feito há décadas e já alterou inclusive a evolução da espécie- ficará mais fácil, diz Garcia.

A mesma rotina poderá ser feita para a produção de leite, para a maciez e o sabor da carne ou contra carrapatos. Apesar de ter demorado para ficar pronto, o gado bovino já tem agora, em paralelo à soletração de seus genes, um mapa de variabilidade genética razoavelmente acabado, o que ainda não existe para os humanos.

Valor agregado
Como o Brasil tem o maior rebanho do mundo, mas não o maior faturamento do setor, resta saber agora como será possível aproveitar o conhecimento sobre o genoma bovino. Alguns cientistas comentam, por exemplo, a dificuldade de acesso aos animais. "Você não faz avaliação, não faz melhoramento, não faz genética, não faz genoma se você não tem material para trabalhar", diz Alexandre Caetano, da Embrapa.

O cientista afirma ainda que a aplicação do conhecimento genético, no caso do boi, deve ocorrer mais no planejamento de cruzamentos do que na criação de animais transgênicos. "O que temos agora é uma nova ferramenta para implementar e adicionar ao que já vinha sendo feito", diz. "É uma ferramenta que nunca existiu antes, que nos permite fazer esse processo de avaliação e aprimoramento de uma maneira mais rápida e mais eficiente."

(Por Eduardo Geraque e Eduardo Scolese, Folha de S. Paulo, 24/04/2009)

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