Agora é oficial. O gás carbônico (CO2) e outros cinco gases de efeito estufa foram decretados poluentes nos EUA, o que obriga pela primeira vez o maior responsável pelo aquecimento global a regular suas emissões. As conclusões são de um relatório de 133 páginas produzido por cientistas da EPA (Agência de Proteção Ambiental) americana e assinado nesta sexta (17/04) pela administradora do órgão, Lisa Jackson. O documento, disponível na internet (epa.gov/climatechange/endangerment.html), afirma que as atuais e futuras emissões do conjunto de seis gases do efeito estufa na atmosfera "ameaçam a saúde pública e o bem-estar da geração atual e das futuras".
Além do CO2, fazem parte do pacote o metano (CH4), o óxido nitroso (N2O), os hidrofluorocarbonos (HFCs), os perfluorocarbonos (PFCs) e o hexafluoreto de enxofre (SF6) -o mesmo grupo de gases que o Protocolo de Kyoto, rejeitado pelos Estados Unidos, visa regular. No decreto, Jackson afirma que as conclusões científicas que apoiam a chamada declaração de ameaça representada pelos gases são "convincentes e completas". A conclusão agora ficará em consulta pública durante 60 dias antes que qualquer proposta de regular as emissões seja publicada.
"Essa conclusão confirma que a poluição causada pelos gases-estufa é um problema sério para as gerações atuais e as futuras. Felizmente, ela segue o pedido do presidente Obama por uma economia de baixo carbono e uma forte liderança no Congresso em relação à legislação de energia e clima", declarou a chefe da EPA. Jackson acrescentou que combater os gases que causam a mudança climática ajudaria a criar milhões de empregos e a reduzir a dependência americana de petróleo estrangeiro, ao estimular o desenvolvimento de uma indústria energética e de transportes limpa.
Cercando o problema
O decreto desta sexta é a resposta da EPA a uma determinação da Suprema Corte dos Estados Unidos de 2007 para que a agência determinasse se o CO2 é um poluente atmosférico ou não. Os cientistas da agência concluíram que sim, mas a administração de George W. Bush suprimiu as conclusões e não fez nada a respeito. A conclusão da EPA permitirá que os seis gases-estufa sejam regulados pelo Clean Air Act, a mesma lei que limita a emissão de outros poluentes do ar, como o enxofre, independentemente de o Congresso americano aprovar ou não uma lei de corte de emissões.
Foi o Congresso que se recusou a ratificar o Protocolo de Kyoto, ainda no governo Clinton. E projetos de lei que estabelecem um sistema de "cap-and-trade" (ou seja, que limite as emissões e permita o comércio de cotas de poluição) têm falhado em conseguir a maioria de dois terços necessária para sua aprovação pelo Senado. Um deles foi derrubado pelos Republicanos em 2008. Há outro em apreciação na Câmara, cuja aprovação poderia esvaziar uma eventual ação da EPA.
Obama e Jackson têm dito que preferem que o Congresso legisle sobre o tema. Ambientalistas e parlamentares favoráveis ao corte de emissões comemoraram a medida da EPA. "A decisão vira o jogo", disse o deputado democrata Ed Markey, que está ajudando a definir a nova legislação. "Não é mais uma escolha entre fazer uma lei ou não fazer nada."
"A poluição de efeito estufa de nossos carros e usinas de energia leva a ondas de calor assassinas, furacões mais fortes (...) e várias outras ameaças diretas e indiretas à saúde", disse David Doniger, advogado do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais. Referindo-se ao governo Bush, ele emendou: "A era de desafiar a ciência e a Suprema Corte acabou." Já o presidente da Associação Nacional das Indústrias, John Engler, ataca a EPA. Para ele, regular gases-estufa pelo Clean Air Act "custa empregos" e "impõe mais um fardo a uma economia combalida, fazendo pouco ou nada pelo ambiente".
(Folha de S. Paulo, 18/04/2009)