Os cortes nos investimentos do Governo Federal neste ano de crise estão afetando um dos programas mais importantes para a proteção ambiental no país: a construção de satélites para o monitoramento do desmatamento. Mesmo depois de anunciar, no ano passado, metas para a redução da destruição florestal, a gestão Lula não teve pudores em diminuir em 20% a verba para os novos satélites, essenciais para o acompanhamento das tendências de devastação.
Graças aos Satélites Sino-Brasileiros de Recursos Naturais (CBERS), construídos em parceria com a China, o Brasil é o país com maior competência para o monitoramento do desmatamento de florestas tropicais. Desde 1997, três equipamentos já foram colocados em órbita (CBERS 1, 2 e 2B), provendo tanto imagens de alta como de baixa definição. Graças ao CBERS 2B, por exemplo, foi possível ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) criar o Programa de Detecção de Desmatamento em Tempo Real, conhecido como Deter. A ferramenta contribui para o planejamento de ações do Ibama e Polícia Federal no combate ao desmatamento ilegal.
A continuidade do monitoramento do desmatamento na Amazônia e também em outros biomas depende do lançamento, até 2014, de outros dois satélites da mesma família, os CBERS 3 e 4. A construção está acertada com a China desde 2002, mas isso não parece ter comovido o Governo Federal. Dos R$ 203 milhões previstos na Proposta de Lei Orçamentária para o programa espacial do Inpe, R$ 15 milhões foram ceifados. Além disso, R$ 25 milhões foram retirados do satélite Amazônia 1, um novo equipamento previsto para ser lançado em 2011 que diminuiria o tempo de monitoramento na floresta. Os cortes afetarão principalmente o ritmo da construção do CBERS 3, que tem previsão de entrar em órbita em 2011.
Segundo o coordenador-geral do Programa de Satélites do Inpe, Marco Chamon, ainda não é possível afirmar que haverá atraso, mas o risco passou a existir. O problema em retirar verbas do CBERS não é apenas causar uma possível quebra no monitoramento da Amazônia, mas colocar em perigo um grande número de empresas que hoje dependem do bom funcionamento do programa. “Aqui em São José dos Campos existe uma dúzia de pequenas empresas que fabricam coisas bem especifícas para nós e, com corte de verbas, os pagamentos serão atrasados este ano. Isso pode desestabilizar essas empresas”, avalia Chamon.
Segundo planoO Inpe já distribuiu mais de 500 mil imagens do território nacional desde 2004, 50% delas para empresas e 25% para universidades e centros de pesquisas. Enquanto no Brasil, o programa CBERS se tornou essencial para o monitoramento de desmatamentos, na China as imagens estão tendo papel essencial no planejamento urbano e no cálculo de safras.
Segundo o pesquisador da Academia Chinesa de Tecnologia Espacial, Ding Xiaobo, o governo de seu país está extremamente satisfeito com a parceria para a construção de satélites. “No ano passado, no dia 12 de maio, as imagens do CBERS foram essenciais durante o terremoto que atingiu a região central do país”, conta.
Graças a este sucesso, nos últimos dias de março, o comitê gestor do programa CBERS, formado por autoridades do Brasil e China, reuniu-se em Pequim para discutir uma nova extensão da parceria, o que representaria a construção de mais dois satélites da mesma família. Além disso, está sendo considerado um novo acordo para o desenvolvimento de um satélite ainda mais avançado, com tecnologia Radar, o que permitiria avaliações precisas de relevo e de recursos geológicos, algo que não se pode conseguir com o CBERS.
Além do dano que a queda dos investimentos federais deve causar no programa CBERS, o início do monitoramento de outros biomas deve ficar em segundo plano. Atualmente, só a Amazônia é vigiada com freqüência. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, prometeu em diversas ocasiões que, até 2011, o Cerrado e a Mata Atlântica teriam planos de monitoramento como o Deter. “Tecnicamente, monitorar outros biomas já é viável, mas isso exige recursos e investimento em pessoal, algo que talvez não esteja disponíveis neste momento”, avalia Chamon, do Inpe.
O instituto tem aprovado, junto ao Ministério do Planejamento, a realização de concursos para a contratação de mais 300 técnicos. O temor dos gestores do Inpe é de que, com a crise, o governo volte atrás e feche estas vagas.
No último dia 20 de março, o diretor do Inpe, Gilberto Câmara, esteve na Comissão de Assuntos Especiais do Congresso Nacional para fazer uma apresentação do programa CBERS e pediu aos parlamentares que tentassem recuperar os recursos perdidos pelos cortes no orçamento. Mas o próprio ministro de Ciência e Tecnologia, Sérgio Resende, tem afirmado em eventos e palestras que nada será afetado. Segundo a assessoria do Ministério da Ciência e Tecnologia, o ministro não concederá mais entrevistas sobre o corte de gastos, pois considera que nenhum programa essencial foi afetado.
(Por Gustavo Faleiros,
O Eco, 15/04/2009)