A precária situação dos índios xavantes em Campinápolis já era conhecida pelo Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) da região. No município localizado a 658 quilômetros de Cuiabá, 21 índios morreram até o início deste mês. Um memorando da Casa de Apoio à Saúde Indígena (Casai) de fevereiro de 2009 mostra que a situação crítica do local já se arrasta há quase dois anos e até então não havia sido resolvida.
O documento ao qual o Diário teve acesso apresenta várias irregularidades. Um dos problemas gravíssimos apontando é a ausência de medicamentos básicos como dipirona, paracetamol e antibióticos. “Sinto muito pela minha comunidade. Quando o índio morria, eu chorava. Os médicos que vão na aldeia não completam 15 dias (no local)”, lamenta, indignado, o xavante Estevão Tsiewaabi, da aldeia Aldeona.
O memorando da Casai também atenta para a falta de transporte. Conforme denúncias entregues ao Ministério Público Federal (MPF), parte das mortes registradas na região teriam sido provocadas pela falta de transporte. “Estamos há três meses sempre com uma viatura que fica na maioria do tempo estragada e quando rodando é 24 horas”, estampa trecho do relatório. Pela péssima condição das estradas na região, as viaturas necessitam ser do tipo pick-up e com tração nas quatro rodas.
“Muitas vezes o socorro demora a chegar até a aldeia e, com isso, o paciente chega já em estado grave, onde não se tem mais nada o que fazer”, completa o relatório. O documento de duas páginas também destaca a morte de duas crianças indígenas ocorridas em fevereiro “no caminho da aldeia para a cidade” pela demora no atendimento. Este atraso somado ao período chuvoso – que transforma as estradas sem asfalto em um lamaçal – impede que sejam detectados precocemente os problemas de saúde indígena. “É isso que está acontecendo com as crianças [que] já chegam em estado crítico ou já mortas.”
No relatório também são citados três casos de desnutrição grave que foram diagnosticados na aldeia Santa Helena. Das 21 mortes indígenas, pelo menos 14 óbitos registrados eram de crianças. Sendo quatro por desnutrição. Falhas estruturais também chamam a atenção. O documento aponta a falta de condições de trabalho e de acomodação para os pacientes.
Na Casai, os trabalhadores que deveriam atuar na limpeza e fazer as refeições eram aquém da demanda. Havia apenas duas pessoas para deixar o local limpo e cuidar da alimentação para uma média de 80 indígenas atendidos diariamente. Um dos pontos que reforçaram essa situação foi o atraso no pagamento da diária dos profissionais desde 1° de dezembro do ano passado.
Falta de manutenção, de reformas e de substituição da mobília também foram confirmadas no documento. A última pintura e compra de camas e colchões ocorreram em junho de 2007. “Hoje a Casai encontra-se em situação deplorável. Pacientes dormindo no chão, outros em cima do que resta das capas dos colchões. Não tem cobertor, os quartos estão com as paredes mofadas, o que atrapalha, e muito, a recuperação das crianças em tratamento de problemas respiratórios”, atesta o memorando.
Campinápolis é o maior pólo de etnia Xavante em Mato Grosso com aproximadamente 5.650 índios em 89 aldeias. O município fica a 65 quilômetros de Nova Xavantina e o acesso até ele é por uma estrada não asfaltada.
(Por Fernando Duarte, Diario de Cuiabá/
Amazonia.org, 13/04/2009)