Em resposta à reclamação apresentada pelo Sindicato de Engenheiros do Distrito Federal (SENGE/DF) em setembro de 2005, o Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho (OIT) aprovou, em 17 de março passado, relatório que confirma o descumprimento por parte do Brasil da Convenção 169, quanto à obrigação de consultar previamente povos indígenas e tribais sobre medidas legislativas capazes de afetá-los. O caso em questão refere-se à ausência de consulta prévia durante o processo de aprovação da Lei nº 11.284 de Gestão de Florestas Públicas. A lei foi sancionada em 2 de março de 2006, meses depois do envio da reclamação à OIT, quando ainda estava sendo debatida no Congresso Nacional. Saiba mais sobre a lei de concessão de florestas públicas.
Em sua defesa, o Estado brasileiro apresentou memorial afirmando, entre outros argumentos, que a consulta não era necessária pois a lei incorporva dispositivo expresso excluindo a possibilidade de criar concessões florestais sobrepostas a territórios indígenas ou de comunidades tradicionais.
Ao analisar este argumento a OIT, ponderou que muitos dos povos indígenas e tribais do Brasil moram em florestas consideradas públicas, como é o caso das Terras Indígenas cuja propriedade é da União. E é inegável que concessões para exploração florestal, mesmo que fora de seus territórios, mas em seu entorno, necessariamente afetarão os recursos naturais dos quais estes povos dependem. Nessa medida é que devem ser consultados sobre decisões que afetam tanto suas terras como os processos de desenvolvimento regional das áreas nas quais seus territórios estão localizados.
A OIT recomendou no parecer, que durante o processo de regulamentação da Lei nº 11.284 que ainda não aconteceu, o Estado brasileiro deverá garantir um processo adequado de consulta prévia, já que em sua defesa alegou que a lei em questão não é uma norma auto-aplicável, e que seus efeitos reais dependerão em grande medida do que seja colocado nas decisões administrativas que a regulem.
Adicionalmente, a OIT aproveitou para se manifestar sobre as regras que considera mínimas para a realização de consultas administrativas ou legislativas capazes de afetar os povos indígenas e tribais no Brasil, de modo que gerem “...as condições propícias para se chegar a um acordo ou conseguir o consentimento acerca das medidas propostas e quanto ao próprio processo de consulta este deve tomar em conta a opinião dos diferentes povos que participam da consulta sobre o procedimento a ser utilizado, de maneira que o procedimento seja considerado apropriado por todas as partes”. Ou seja, toda consulta a ser realizada deverá observar estes critérios mínimos para ser considerada como válida.
Vale destacar que uma oportunidade importante foi oferecida pela OIT ao confirmar sua disponibilidade, ao final do relatório, para enviar assistência técnica ao Brasil com o intuito de promover a adequada implementação da Convenção 169 no País, o que deverá ser avaliado pelo governo e pelas organizações indígenas e quilombolas em seu processo de fazer valer este instrumento internacional como fonte concreta de direitos fundamentais para estes povos.
Com a divulgação deste parecer e também dos relatórios alternativos elaborados pela sociedade civil em 2008 sobre a aplicação da Convenção 169, o Brasil inaugura o diálogo entre Estado, sociedade civil e OIT com relação à aplicação concreta de um instrumento do direito internacional fundamental para povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais.
(Por Bivany Rojas Garzon, advogada consultora e colaboradora do ISA, 09/04/2009)